segunda-feira, 30 de abril de 2012

SEMANA DE ARTE MODERNA: 90 ANOS

ARTIGO PUBLICADO PELA PROFª KARLA O. ARMANI NO JORNAL "O DIÁRIO DE BARRETOS" EM 29 DE ABRIL DE 2012


“Para muitos de vós a curiosa e suggestiva exposição que gloriosamente inauguramos hoje, é uma agglomeração de ‘horrores’. Aquelle Genio suppliciado, aquelle homem amarello, se não são jogos da fantasia de artistas zombeteiros são seguramente desvairadas interpretações da natureza e da vida. Não está terminado o vosso espanto. Outros ‘horrores’ vos esperam. Daqui a pouco, juntando-se a esta collecção de disparates, uma poesia liberta, uma musica estravagante, mas transcendente, virão revoltar aquelles que reagem movidos pelas forças do Passado. Para estes retardatários a Arte ainda é o Bello”. (O Estado de S. Paulo, 14/2/1922).
            As palavras acima foram proferidas há mais de noventa anos atrás por Graça Aranha durante a “famosa” Semana de Arte Moderna de 1922. O discurso demonstra o “choque” da arte brasileira vivenciada naquele momento, onde os próprios artistas sabiam o quanto aquilo impactaria na sociedade. E assim o foi. Os “loucos anos 20”, foi um período de transformações na Europa do pós guerra, e o Brasil também passava por mudanças, mas não tão profundas. Estados mais desenvolvidos, como São Paulo e Rio de Janeiro, vivenciavam um cenário urbano e tecnologias, mas a maioria da população brasileira ainda era rural e o tradicionalismo na política se perpetuava.
            Agora, a cultura pronunciava seu desejo de rompimento com o tradicional, com o acadêmico e com os cânones artísticos nesta época. A Semana de Arte Moderna de 1922 foi o estopim do movimento modernista no Brasil, que atingiu as artes plásticas, as esculturas, a literatura e demais setores artísticos. Os artistas modernos, influenciados pelas vanguardas europeias, almejavam elaborar uma forma de arte mais criativa, sem aquela concepção de “belo” que as academias pregavam para seus alunos. Para estes inovadores, era o momento de ser criada uma arte genuinamente brasileira, com as cores e formas do povo aqui vivente, afim de ser construída a identidade nacional e ressaltar os personagens brasileiros como o índio, o caipira e o negro.
            Na pintura, os traços imperfeitos e tortuosos, assim como as formas abstratas de artistas como Anita Malfatti e Tarsila do Amaral assustavam escritores tradicionais como Monteiro Lobato. Outro desta forma, o poeta Olavo Bilac, também não condizia com a falta de métrica e rimas das poesias modernas. As esculturas de Vitor Brecheret, que não se pautavam nos movimentos naturais renascentistas, foram recebidas com extrema resistência pela população. Todos estes artistas foram recebidos de maneira hostil naquele acontecimento que marcou a história do Brasil.
            Diz-se até hoje que, financeiramente, a Semana de Arte Moderna de 1922 foi um fracasso. No entanto, no que diz respeito a mudanças culturais e quebras de paradigmas tradicionalistas, bem como a liberdade artística no “criar” e no “imaginar”, foi sim um acontecimento surpreendente e proveitoso. Não é a toa que cá, 90 anos mais tarde, estamos falando deste fato com tamanha relevância.

Fonte: Apostila Objetivo, 9º ano, 1º bim, 2012.

DIÁRIO DE BARRETOS: FONTE HISTÓRICA


ARTIGO PUBLICADO PELA PROFª KARLA O. ARMANI NO JORNAL "O DIÁRIO DE BARRETOS" EM 22 DE ABRIL DE 2012


            Há três semanas atrás, escrevi um artigo dizendo que a primeira fase do jornal “Diário de Barretos” aconteceu em 1906. Um erro. Sua primeira fase surgiu no ano de 1917 e tinha como redator chefe Osório Rocha e gerente Jesuíno Ferraz. Como maneira de corrigir esta informação, gostaria de falar mais sobre este jornal que, apesar de ter durado pouco tempo (cem dias), fez parte da história da imprensa barretense. Uma imprensa pujante para a época.

            Ao analisar os dados colhidos por Osório Rocha, em seu livro “Barretos de Outrora” (1954), vê se que durante os anos 1900 e a década de 10 e 20 em Barretos foram lançados aproximadamente trinta e três jornais ou folhas periódicas. É um número bastante expressivo para uma época que a luz elétrica estava para chegar, a ferramenta dos escritores eram as pesadas máquinas de datilografar (mas, muito eficientes) e as oficinas de jornais ainda funcionavam na base tipográfica.
Esta “era de ouro” da imprensa, se assim podemos chamá-la, é caracterizada pelo regime republicano que vigorava até então. Um sistema político que há pouco tempo tinha se instalado no país, mas que possuía uma necessidade avassaladora de modernizar e “civilizar” cada canto desse Brasil. E dentre estes planos civilizatórios estava a disseminação da imprensa, que era uma instituição moderna, que levava a comunicação entre os homens e ligava-os politicamente. Não é a toa, portanto, que o jornal “Diário de Barretos”, de 1917, possuía abaixo de seu título a inscrição “Orgam do Partido Republicano”.
            Acontece que, além dos vieses políticos e dos escândalos da questão da água e esgoto esboçada no jornal “Diário de Barretos”, este jornal sutilmente nos informa aspectos da vida “moderna” que adquiria formas no cotidiano barretense. Faço menção as propagandas e anúncios que ali eram publicados, que hoje podem nos ser úteis como fontes históricas. Anúncios de médicos, dentistas, advogados e professores marcavam todas as edições do jornal, o que nos mostra como as profissões liberais se disseminavam cada vez mais por estas bandas. Propagandas de casas comerciais como a “Novo Mundo”, que vendia tecidos finos como seda, tafetá e crepes da China; e a “Casa Vassimon” que se dedicava aos produtos de “cosméticos”, como loções, sabonetes, pós de arroz, cremes. Estas propagandas sugerem como as classes abastadas e capitalistas de Barretos no início do século XX cada vez mais se aproximavam dos “modernos hábitos”, com as vestimentas da moda e o uso de produtos de higiene.
            São tantos os anúncios e propagandas do jornal que nos dão pistas de como seria viver em Barretos no passado. Ao menos chegamos perto dessa visão graças à preservação destes jornais, que são preciosos como fontes históricas. Que sempre os preservemos.

Fonte: Acervo digital de jornais do Museu “Ruy Menezes”.

LIVROS DIDÁTICOS: FORMADOR DE OPINIÕES

ARTIGO PUBLICADO PELA PROFª KARLA O. ARMANI NO JORNAL "O DIÁRIO DE BARRETOS" EM 15 DE ABRIL DE 2012


            Já disse o mestre Érico Verissimo: “Os livros escolares, cujo objetivo é ensinar-nos a história da nossa terra e do nosso povo, são em geral escritos num espírito maniqueísta, seguindo as clássicas antíteses – os bons e os maus, os heróis e os covardes, os santos e os bandidos. Via de regra, não se empregam nesses compêndios as cores intermediárias, pois seus autores parecem desconhecer a virtude dos matizes e o truísmo de que a História não pode ser escrita apenas em preto e branco”.
            A frase de Verissimo leva-nos a uma reflexão sobre a composição do livro-didático e sua importância como formador de opinião dos indivíduos de uma sociedade. Em História, o livro-didático é de extrema relevância no sentido de que leva o aluno a entender os momentos da história de seu país e a formação da cultura do povo a que pertence. Além de promover a interação com a memória de seus antepassados.
            Verissimo aborda o problema de parte dos livros-didáticos de História que insistem em compor uma história maniqueísta, ou seja, de personagens que ou são bons ou são maus. Sem intermediações. Muitas vezes, essa visão unilateral da história coloca, por exemplo, o bandeirante como o herói e o índio como o “manso”; ou o senhor feudal como “mau” e o servo como “bom”; ou ainda o escravo como “covarde” e o senhor de engenho como “torturador”. Esse tipo de composição acontecia, predominantemente, há algumas décadas atrás, mas ainda hoje alguns livros continuam a ser compostos assim. Isso porque estamos inseridos numa sociedade que exige extrair a “verdade” das ciências, inclusive as “humanas”, e por isso orienta-nos a uma falsa moralidade.
            Ora se a História fosse composta desta forma maniqueísta, ela tenderia expressamente à parcialidade, e assim perderia seu caráter de ciência. Não que a história consiga ser por inteira imparcial, mas a intenção é sempre demonstrar os vários ângulos de um fato. É necessário entender que o fato histórico existe, o problema é o modo como ele é contado, revisto e analisado em cada época pelos historiadores. O exemplo mais comum é o dos bandeirantes, que no passado eram vistos como heróis (desbravadores do sertão, como bem mostra o Hino de Barretos), e nas visões atuais da historiografia, são apontadas, sobretudo, suas ações de matança e violência contra a população indígena. Esta versão o afasta de qualquer tipo de heroísmo, mas por outro lado pode cair no truque maniqueísta de colocá-lo como o “mau” da história.
            Desta feita, não existe uma verdade única e acabada que proporcionaria à história um passado pronto e fechado. Doce ilusão. Cabe ao professor de História, gerar a reflexão dos fatos, mostrar as “cores intermediárias” da História, que seriam, por exemplo, as várias versões de historiadores (claro, que traduzidas de maneira acessível aos alunos). Enfim, aquilo que o livro-didático aborda como tema é o resultado de uma visão, uma escolha de determinada época. É o que a historiografia ditava como mais próximo do passado e jamais o alcance imediato deste. O livro-didático forma opiniões e, por isso, devia ser mais aberto às novas discussões.

SANTA PATROCÍNIA DE MONTE AZUL PAULISTA

ARTIGO PUBLICADO PELA PROFª KARLA O. ARMANI NO JORNAL "O DIÁRIO DE BARRETOS" EM 08 DE ABRIL DE 2012
  

            As cidades centenárias que fazem parte da nossa região certamente têm muito a contar sobre sua história, em principal no que diz respeito àquelas estórias mais famosas que estão presente até hoje na memória das pessoas. São contos passados de geração em geração que, muitas vezes, se transformam em verdadeiras tradições peculiares de cada local. Se pararmos para pensar, muitas destas cidades têm um crime bárbaro a ser revelado e “mulheres” assassinadas que se tornaram “santas” populares, conforme a repercussão de suas histórias e os milagres por elas proferidos. Foi assim que aconteceu com Maria Patrocínia Brabo, a famosa “Santa Patrocínia” de Monte Azul Paulista.
            “Está na cidade o distincto moço Miguel Salin Aidar, fazendeiro residente em Villa Olympia” (Jornal O Sertanejo, 19/9/1909, página 4). Quem lê essa pequena nota no jornal pode não reparar o teor que ela representava de fato na época. O jornal “O Sertanejo”, renascido em 1909, era dirigido pelo dr. Antonio Olympio Rodrigues Vieira, advogado e chefe político de Barretos. Este, era advogado da família de Miguel Salin Aidar, que antes morava em Monte Azul, mas que por motivos óbvios mudara-se de lá.
            Acontece que, Felippe Salim Aidar (irmão de Miguel) estava sendo acusado de crime de assassinato contra sua esposa, fato em que Miguel, também era considerado suspeito. Segundo o pesquisador Massoneto, de Monte Azul, Felipe (nascido na Turquia) casou-se com Maria Patrocínia, espanhola, em julho de 1908, quando a cidade ainda florescia nos seus anos iniciais de fundação. Porém, este casamento não foi benquisto pela família de Felipe, uma vez que Jorge (outro irmão de Felipe) já era casado com Purificação, irmã de Patrocínia. Segundo os indícios, a família turca, naquela época, tinha como princípios religiosos que os irmãos não poderiam se casar com mulheres que não fossem da mesma origem que eles (o que já tinha ocorrido com Jorge e Purificação), e que dois irmãos não poderiam se casar com duas irmãs.
            Como Felipe estava apaixonado por Patrocínia, que então contava com 15 anos, eles se casaram as escondidas. Mesmo com o clima de romance que ambos viviam (segundo os depoimentos daquele período), ela foi assassinada a facadas em 20/11/1908 depois de ter pegado um caminho nas matas rumo à casa de sua irmã, acompanhada pelo marido Felipe. Este, depois do crime bárbaro, fugiu rumo às divisas de SP e MT, mas foi encontrado e levado a júri. Foi julgado cinco vezes, onde teve dr. Antonio Olympio e outros advogados em sua defesa. No último julgamento, em 1911, foi prolatada sua sentença a 16 anos e seis meses de prisão, mesmo com as contestações de seus advogados. No entanto, sabe-se que Felipe ficou preso somente 9 anos e alguns meses na Cadeia Pública de Bebedouro; sendo “perdoado” em 1918.
            Assim parecia terminar a história do assassinato de Patrocínia, fato que é muito mais complexo do que estas poucas linhas. Porém, sua morte teve uma repercussão tão grande pelo povo de Monte Azul no início do século XX, que até hoje é rememorada entre parte dos moradores. Inclusive, duas capelas foram erigidas em sua homenagem, uma no cemitério e outra no local do crime. E quanto ao “nosso” dr. Antonio Olympio? Percebem como as histórias das cidades são interligadas?! Esta é a história regional.

Fonte: MASSONETO, João F. Patrocínia: a verdadeira história. In: Monte Azul Paulista – a história de sua existência. SP, 2009.

HÁ 43 ANOS: “O DIÁRIO”

ARTIGO PUBLICADO PELA PROFª KARLA O. ARMANI NO JORNAL "O DIÁRIO DE BARRETOS" EM 01 DE ABRIL DE 2012


“Ao povo, às autoridades, nossa inabalável fé nos destinos de Barretos e região”
(Jornal “O Diário”, 01de abril de 1969)
            Há exatos quarenta e três anos, o jornal “O Diário” publicava sua primeira edição para assinantes de Barretos e região. Hoje, com suas páginas amareladas, esta primeira edição é parte da longa história da imprensa que encontra abrigo no Museu Ruy Menezes. A frase acima ilustra a primeira página da edição 1 do jornal e ao interpreta-la já se percebe que a intenção do mesmo era levar informações não só a Barretos, bem como à região, e assim o fez pois já na primeira edição foram exibidas notícias de Barretos, Jaboticabal, Planura e Guaíra. Deste modo, desde esse dia o jornal “O Diário”, que então contava com 8 páginas e tempos depois chegando até a 16 páginas, chega a casa dos barretenses em todas as manhãs (com exceção das segundas-feiras).
            A primeira edição registrava um núcleo sortido de reportagens, mas as principais delas foram redigidas pelo próprio Monteiro Filho na intenção de explicar aos leitores a novidade que era um jornal diário para a cidade naquela época. Para se ter ideia, naquele final dos anos 60, Barretos contava com cinco jornais, eram eles:  “A Semana” (bi-semanário); “O Correio de Barretos” (bi-semanário); “Cidade de Barretos (bi-semanário); “Mini Jornal” (semanário) e, a partir de então, “O Diário” (diário). A maioria destes jornais já perfazia muitas décadas de funcionamento, mas nenhum deles era diário. O que não quer dizer que Barretos nunca tivesse passado pela experiência de jornais diários, afinal em 1906 e em 1946, mesmo com poucos anos de funcionamento, foram editados os jornais da 1ª e 2ª fase de “O Diário de Barretos”.
            O interessante não é só o fato de o jornal ter trazido a novidade de ser publicado diariamente, “O Diário” também demonstrava uma formatação diferenciada daqueles jornais mais antigos. Há muito tempo, os jornais de Barretos eram formatados num modelo padrão de várias colunas estreitas numa mesma página, sendo que muitas reportagens começavam numa página e, recortadas, terminavam em outra. Em “O Diário” a formatação era diferenciada, talvez um modelo novo na imprensa brasileira daquele período, onde as colunas eram mais largas e o espaçamento entre as linhas também, o que facilitava a leitura.
            Na primeira edição do jornal “O Diário” de 1969, os proprietários, redatores e colaboradores tiveram o cuidado de informar dados estatísticos sobre a cidade, deste modo, foi possível que nós aqui do presente entendêssemos o contexto de fundação do jornal. Segundo tais dados, Barretos possuía uma população de 75 mil habitantes e 850 casas comerciais. Outra informação de igual valor foi o texto produzido por Ruy Menezes, em que ele apontava um histórico da imprensa em Barretos, dados os quais foram utilizados para compor este texto.
            Enfim, 43 anos se passaram e o jornal “O Diário” continua presente no cotidiano dos barretenses e na memória da cidade. Seja como fonte histórica, referência de informação e/ou arquivo de registros ilustrativos ou de acontecimentos, o jornal “O Diário” é parte de um passado, presente e futuro em Barretos.
            A todos que compõem e compuseram a equipe do jornal “O Diário”, o nosso reconhecimento.
             

CURANDEIRISMO E CIÊNCIA


ARTIGO PUBLICADO PELA PROFª KARLA O. ARMANI NO JORNAL "O DIÁRIO DE BARRETOS" EM 25 DE MARÇO DE 2012

“De mais homem de meu tempo, acreditando sinceramente nos progressos da sciencia, eu me tinha habituado a olhar com desdém para tudo que não sahisse competentemente etiquetado dos laboratórios, com o <> dos sábios”.
(Jornal O Sertanejo, 19/5/1900, p. 2)
            A frase acima foi escrita pelo Cel. Silvestre de Lima numa carta endereçada ao dr. Luiz Pereira Barreto publicada no jornal “O Sertanejo” de Barretos. Pela frase de Silvestre percebe-se sua afeição pela ciência, pelos laboratórios, e o contrário por tudo aquilo que não fosse sancionado pelos cientistas. O contexto desta carta era referente a uma enfermidade na pele contraída por seu irmão mais velho, José Vicente de Lima, que nenhum médico conseguia curar.
            O irmão de Silvestre já tinha recorrido a vários tipos de terapêuticas (inclusive fez uso até das águas de Caldas) na tentativa de curar aquela doença que cada vez mais se alastrava na pele. Foi então que, chegou ao conhecimento da família a existência de um velho curandeiro morador de Barretos chamado Joaquim Tomé, este já havia curado casos da mesma doença através do uso de raízes. Sendo assim, Silvestre de Lima, como um “homem de seu tempo”, quer dizer, república, de uma era moderna, científica, mesmo intrigado resolveu conferir a validade da ação do curandeiro.
            O fato foi que o velho curandeiro, descrito por Silvestre como “caboclo e octogenário”, curou a doença do irmão dele em poucos dias. Ainda em dúvida sobre o que havia acontecido, Silvestre resolveu publicar a receita das ervas e raízes usadas no tratamento, afim de que os médicos pudessem avaliar como que aquela receita do curandeiro agiu diante à doença.
            Depois de explicita a polêmica por Silvestre, o que se pode analisar de tudo isso era como os intelectuais daquela época, apreciadores da República e da ciência, tentavam levar ao povo os hábitos modernos, no caso em questão, a cura das doenças através dos médicos, dos remédios, dos laboratórios. No entanto, era ainda permanente na mentalidade e até no cotidiano da população a apreciação dos antigos hábitos, isto é, o apelo aos curandeiros e suas “benzeções”.
            Por mais que a República no Brasil criasse mecanismos de comportamentos, hábitos e normas sociais, as antigas tradições estavam presentes entre estes novos hábitos. Afinal como disse o dr. Wilson Ferreira de Melo em artigo publicado no jornal “Correio de Barretos” em 1/10/1944: “Todos nós que somos descendentes de sertanejos, que vivemos do sertão, num anseio crescente de progresso, ao voltar nossas vistas ao passado, vamos ver nosso pai ou nossa mãe cozinhando raízes, fazendo infusões, enfim, procurando um remédio, um recurso para que sobrevivêssemos, para que a doença pertinaz não nos roubasse ao seu amor e aos seus desvelos. Este é o conceito que eu faço de curandeirismo, nas suas origens”.

MATERIAIS DIDÁTICOS: SALA DE AULA E NOVELA




ARTIGO PUBLICADO PELA PROFª KARLA O. ARMANI NO JORNAL "O DIÁRIO DE BARRETOS" EM 18 DE MARÇO DE 2012

            É impressionante como assuntos previamente conhecidos pelos alunos chamam tanto atenção numa aula de História. Guerras Mundiais, grandes descobrimentos, revoltas locais, escândalos de presidentes e outros são exemplos de atrativos da História que os alunos adoram por si só. Quando os eles têm em mente a imagem de tais acontecimentos ou personagens, fica muito mais fácil conduzir a aula para à realidade histórica.
            A mídia televisiva e cinematográfica pode influenciar muito a condução de uma aula, uma vez que utiliza do recurso da imagem para estimular a imaginação e tentar alcançar a realidade do tema estudado. Um meio muito acessado pelos brasileiros são as telenovelas, apesar de serem criticadas por uns que as julgam como algo que ilude o real e se conduz pelo senso comum. O que não deixa de ser verdade.
            Entretanto, as novelas podem ser reavaliadas pelo expectador como uma fonte de informação, sê crivada por críticas contundentes. Por exemplo, a novela “Cordel Encantado” exibida pela Rede Globo no ano de 2011. Ali, por mais fictícia que seja a história romantizada dos protagonistas, no pano de fundo da novela aparece o cenário da vida no nordeste no começo do século XX, principalmente no que diz respeito aos cangaceiros e ao misticismo do povo daquela época e região.
É esta visualização televisiva que permite ao aluno imaginar detalhes, cores e a cultura da época e se atrair pelo estudo daquilo. Por mais “bonzinhos” que os cangaceiros foram apresentados pela novela, o que distorce sim a realidade do passado, é possível ver a dinâmica da vida no cangaço. O acampamento, os rituais, os desejos, as vestimentas, as relações de hierarquia, o líder, as mulheres e outros fatores visivelmente demonstrados ali na telinha. A novela, desde que não tomada a priori como algo verdadeiramente “real”, pode fazer com que os alunos tomem gosto pelo estudo daquele determinado povo de uma época e de um lugar distante.
            O professor possui muitos recursos visuais que podem ser usados para atrair o aluno a estudar determinado assunto e, principalmente, levar aquele tema à crítica, a análise e à pesquisa. Afinal, sala de aula é lugar de discussão, reflexão e saber criticar uma fonte de imagem faz parte da competência do professor e das habilidades dos alunos. Pensemos sobre o que diz os PCN de História: “Todo material, que no acesso ao conhecimento tem a função de ser mediador na comunicação entre o professor e o aluno, pode ser considerado material didático [...], [ele é utilizado] para criar situações de ensino” (1998, p. 79).

UMA VIDA DE CARIDADE

ARTIGO PUBLICADO PELA PROFª KARLA O. ARMANI NO JORNAL "O DIÁRIO DE BARRETOS" EM 13 DE MARÇO DE 2012


            Esta semana é internacionalmente conhecida como a semana da mulher e por isso é comum tomarmos nota de biografias de mulheres conhecidas no país ou no mundo a fim de demonstrar como a história dessas mulheres podem desafiar uma época e transformar o ambiente em que vivem. A biografia que será resumida neste texto não tem a intenção de mostrar um exemplo de uma “grande” mulher, mas sim de enobrecer pequenos gestos de uma mulher que, por um bem maior, foram capazes de mudar vidas.
            A história trata da vida da menina Agnes Gonxha Bojaxhiu, nascida em 26 de agosto de 1910, em Üsküb, hoje Skopje, capital da República da Macedônia. No período em que ela nasceu e viveu sua infância, o local em que vivia era uma zona em constantes conflitos civis que já atravessava longos anos. Embora isso fosse uma realidade, sua família fazia parte de um clã católico, que prezava, sobretudo, os valores familiares e a extinção do egoísmo.
            Seu pai se chamava Nikolai, a mãe Dranafile, seus irmãos Age e Lázaro, e Agnes era a caçula da família. Seu pai, militante nacionalista da Albânia falecera de um mal súbito, e a mãe passou a tomar conta da família dedicando-se ao comércio. A família de Agnes participava muito da Ação Católica, no coral, em teatros ou na ajuda aos pobres. Com 12 anos ela sentiu pela primeira vez a necessidade de tornar-se religiosa, fato que a mãe só foi aceitar anos mais tardes. Tornou-se então voluntária da ordem de Nossa Senhora de Loreto, que costumava mandar missionárias para os países colonizados pelos britânicos, como a Índia. Em 1928 partiu em missão religiosa e nunca mais voltou a ver a família, costumava dizer: “pelo sangue, sou albanesa. Pela nacionalidade, indiana. Pela fé, sou uma religiosa católica. Por vocação, pertenço ao mundo. Pelo meu coração, pertenço inteiramente ao coração de Jesus!”.
            Desembarcou em Calcutá, em 1929 passou a usar o hábito branco de noviça, em 1931 fez seus votos de pobreza, castidade e obediência e passou a tomar o nome de Teresa. Madre Teresa de Calcutá, como ficou conhecida mundialmente pela caridade e ajuda ao próximo. Depois de muito ajudar os necessitados no Oriente, no início da década de 50, Madre Teresa conseguiu do Vaticano a autorização para fundar sua própria ordem, a Congregação das Missionárias da Caridade. Desfez-se do hábito ocidental e passou a usar um sári branco, como os indianos, só que acrescido das três faixas marianas, de acordo com o costume católico. Desde então, a sede da congregação das Missionárias da Caridade foi enfermaria, escola, asilo e leprosário. Madre Teresa faleceu em 1997, aos 87 anos, foi beatificada em 2003 e sua ordem hoje conta com cerca de 4.500 religiosos e mais de 70 casas de acolhimento.
            Na semana da mulher, Madre Teresa de Calcutá, em poucas palavras, mostra que a vida de uma mulher pode ser muito mais que um exemplo, uma obra de caridade.

REFERÊNCIA: Revista História Viva – Ano VII, nº 77.

O DIREITO AO VOTO: UMA CONQUISTA!

ARTIGO PUBLICADO PELA PROFª KARLA O. ARMANI NO JORNAL "O DIÁRIO DE BARRETOS" EM 04 DE MARÇO DE 2012


            Este ano de 2012 é ano eleitoral e apesar das eleições parecerem algo normal e corriqueiro na vida dos brasileiros, a verdade é que nós temos mesmo é que comemorar e encarar este ato como um direito conquistado pelo povo. Ao olharmos a história de nosso país nos deparamos com uma trajetória conturbada nas esferas políticas. Quem é cidadão? Essa pergunta foi respondida de diferentes formas na colônia, no império e nas várias fases da República brasileira.
            A respeito do período colonial, poucas informações se têm sobre eleições. Sabe-se que existiam eleições para as Câmaras Municipais, o voto era definido por posição social, renda e idade, restrito a homens, mas incorporado aos analfabetos (pelo menos em determinados períodos). Este cenário, porém, sofreu mudanças já que, a partir de 1822, o Brasil não era mais uma colônia e precisava organizar sua máquina administrativa.
            O período do império brasileiro carrega para si o orgulho de ter criado a primeira constituição do Brasil, em 1824. É válido notar que, o primeiro projeto constitucional foi chamado Constituição da Mandioca, porque esta previa que o voto censitário e a renda dos candidatos fossem calculados segundo um valor que teria como referência a renda obtida com farinha de mandioca. A constituição outorgada de fato em 1824, autoritária e conservadora, estabelecia o voto indireto (os eleitores votavam em um corpo eleitoral e estes elegiam os deputados) e censitário (só podia votar cidadãos maiores de 25 anos e com renda anual de pelo menos 100 mil réis; e só podia se eleger homens com renda de pelo menos 200 mil réis anuais). O voto censitário continuou a existir inclusive no reinado de Pedro II, quando a Lei Saraiva (1881) aumentou a renda mínima dos eleitores de 100 mil réis para 200 mil réis anuais. Pelo menos, certos cargos como vereador, passaram a ser eleitos de forma direta.
            A República que tanto falava da democracia e da cidadania também não foi diferente com a exclusão de determinadas parcelas da população. Somente homens, maiores de 21 anos e alfabetizados poderiam votar; haja vista que o voto censitário chegava ao fim. Mulheres, militares não oficias, padres e analfabetos ficavam de fora da vida eleitoral. As mulheres conquistaram o direito ao voto somente em 1932 e, nesta mesma época, o voto tornou-se obrigatório com idade mínima de 18 anos. Os analfabetos só foram inclusos no sistema eleitoral no ano de 1985! O mais interessante é que o voto secreto só se tornou oficial no Brasil a partir dos anos 50, mesmo a Justiça Eleitoral existir desde a década de 30! As urnas eletrônicas só surgiram em 1996.
            Datas e acontecimentos como estes nos fazem pensar a respeito de como é historicamente importante o nosso direito de votar. Não é algo corriqueiro e normal, é a expressão máxima de exercer a cidadania, que foi negada a tantos e por tanto tempo. Que o eleitorado brasileiro cresça e se conscientize cada vez mais!

REFERÊNCIA: Revista Aventuras na História, out./2010.

O OUTRO LADO: O OUTRO MUNDO



ARTIGO PUBLICADO PELA PROFª KARLA O. ARMANI NO JORNAL "O DIÁRIO DE BARRETOS" EM 26 DE FEVEREIRO DE 2012 


“No passado, podiam-se acusar os historiadores de querer conhecer somente as ‘gestas dos reis’. Hoje, é claro, não é mais assim. Cada vez mais se interessam pelo que seus predecessores haviam ocultado, deixado de lado ou simplesmente ignorado”.
(Carlo Ginzburg)
            A frase acima é a parte inicial do prefácio do livro “O queijo e os vermes” publicado pelo historiador italiano Carlo Ginzburg. Ela nos leva a pensar na mudança que a escrita da história vem passando nos últimos tempos, principalmente no que diz respeito aos personagens aparentes na história. Até pouco tempo atrás, eram vistos nos livros de história somente os reis e políticos tidos como “importantes”, assim como os lugares aparentes eram sempre a Europa, os palacetes ou monumentos considerados “marcantes”. Diz Ginzburg que “hoje não é mais assim”, ou seja, aquilo que era ocultado, agora é ressaltado.
            Da mesma maneira, no passado, a história local (das cidades) não era muito discutida, era objeto de pesquisa somente de raros pesquisadores que se arriscavam em ousar. Hoje, na academia, estudar história local já é algo mais acessível, principalmente em razão das fontes históricas serem cada vez mais preservadas em museus ou arquivos públicos. Mesmo assim, dentro da própria história local, o interesse da maioria dos estudos é voltado aos aspectos da modernidade, dos grandes casarões, dos coronéis elitistas e dos novos códigos de comportamento.
            Pouco se diz sobre o outro lado, aquele em que vivia a classe social mais pobre, onde as condições de vida, moradia e trabalho não eram nada parecidas com as da elite. Em Barretos este outro lado era sentido literalmente. “Outro Mundo” era a denominação que se dava ao bairro periférico da cidade no início do século XX, onde habitavam os ex-escravos, os lavradores, peões, prostitutas, domésticas, lavadeiras e uma sorte de pessoas das mais variadas culturas. Este local era o destino em que indivíduos de diferentes linguagens, gêneros e profissões trabalhavam e/ou habitavam, pois, como o local era de circulação de muitas pessoas, uma rede de serviços de bares, selarias, ferrarias e etc fazia parte deste bairro.
            O “Outro Mundo” era realmente “outro”, pois se situava em lugar afastado do bairro central, local de circulação da elite. Possuía dois marcos arquitetônicos: a capela de Nossa Senhora do Rosário (situada onde hoje é a Estação Cultura) e os trilhos da Cia Paulista de Estrada de Ferro. Ao sul destes dois marcos encontrava-se este bairro, que, ao contrário do centro, não possuía iluminação e jardinagem pública, sistema de água e esgoto, coleta de lixo, pavimentação das ruas e demais novidades urbanas da época. O cenário do “Outro Mundo” era um tanto rural, com casas sem muros, rodeadas por cercas de arame ou madeira, animais nas ruas e buracos por todo lado.
            Quantas histórias poderiam ser estudadas sobre o “Outro Mundo”? Certamente, muitas. A falta de fontes históricas é uma realidade, mas, se o historiador souber retirar das fontes oficiais (produzidas pela elite ou pela Câmara Municipal, por exemplo) muito há o que se falar. Por fim, pensemos que o estudo da história local permite também o “outro lado”, aquele que permaneceu ocultado por tempos e tempos, mas que agora pode tornar-se vivo.

REFERÊNCIA: Tese de doutoramento do Dr. Humberto Perinelli Neto (Unesp, 2009). 

MARCHINHAS DE CARNAVAL

ARTIGO PUBLICADO PELA PROFª KARLA O. ARMANI NO JORNAL "O DIÁRIO DE BARRETOS" EM 19 DE FEVEREIRO DE 2012



“Ô abre alas que eu quero passar.
Eu sou da Lira, não posso negar.
Rosas de Ouro é quem vai ganhar!”
(Chiquinha Gonzaga)
            São raras as pessoas, mesmo nos dias de hoje, que não conhecem esta música, ou melhor, marchinha de carnaval. Já se passou mais de um século desde sua composição e ela ainda é relembrada em todos os carnavais. Fato como este nos leva a entender que o carnaval dos tempos antigos se tornou inesquecível na sociedade. Por mais raras que sejam as marchinhas de carnaval nos dias hoje, elas teimam em voltar e rememorar os tempos dos cordões e blocos de carnaval do passado.
            Acostumados com os sambas-enredo e com os impressionantes carros alegóricos que desfilam nos principais sambódromos do Rio de Janeiro e São Paulo, nós que aqui vivemos nos tempos de agora, sequer imaginamos a cultura popular que as marchinhas de carnaval propagaram em algumas cidades brasileiras entre os anos 20 e 60. Por isso, comemorar o carnaval não é só festejar ou dançar, este pode ser um momento de “memorarmos”, isto é, trazer de volta à memória os tempos em que o carnaval era uma festa popular, com composições musicais rítmicas (e algumas até críticas) que alegravam os desfiles preparados por alunos e professores de escola e composto por foliões que vestiam fantasias que muito tinham a revelar de sua época e de sua história.
            O verso que encima este texto foi considerado a primeira marchinha de carnaval da história. A pedido do Cordão da Rosa de Ouro, a marchinha “Ô Abre Alas” foi composta pela pianista carioca Chiquinha Gonzaga (1847-1935) ainda no século XIX. Os cordões eram grupos de foliões que, na época do carnaval, invadiam as ruas do Rio de Janeiro mascarados e fantasiados de reis, rainhas, princesas, pierrô, colombinas, índios, palhaços, baianas e etc. No final da década de 10, os cordões se transformaram nos blocos de carnavais e o mais antigo deles é o Cordão do Bola Preta, que ainda existe na capital carioca.
            Mas, não é só no Rio de Janeiro que os blocos e as marchinhas carnavalescas faziam sucesso no início do século XX. Barretos, já na década de 30, possuía como instituição a “Sociedade Beneficente e Recreativa Estrela do Oriente” (hoje o clube já conta com 76 anos de fundação!). A “Estrela do Oriente” era famosa na cidade por contribuir notavelmente como os festejos carnavalescos de Barretos e ornamentar as ruas com o seu principal bloco: “O Carvão Nacional”. Nas palavras do escritor barretense Ruy Menezes em 1954 vê-se a importância do bloco: “O Carvão Nacional, já coberto de glórias e tradições, dá as ruas de Barretos a indispensável movimentação durante as festas de Momo”.
            Por fim, seja onde for e em qualquer época, as marchinhas de carnaval sempre serão rememoradas pela cultura popular!

ANOS 20: A TRANSFORMAÇÃO DOS TEMPOS

ARTIGO PUBLICADO PELA PROFª KARLA O. ARMANI NO JORNAL "O DIÁRIO DE BARRETOS" EM 11 DE FEVEREIRO DE 2012



            O início do século XX no Brasil foi de fato uma época de transformações, na economia ou nos hábitos do cotidiano, a vida dos brasileiros ganhava rumos diferentes daqueles adotados até então. A República proclamada no final do século XIX alcançava cada canto do Brasil em diferentes momentos, seus efeitos eram sentidos pela população principalmente em relação à modernidade. Com todas as inovações tecnológicas, científicas e modernas, adotava-se no Brasil uma visão progressista do futuro que tinha origem nos ares europeus. Assim, o país passava pelo período da “Belle Époque”, isto é, o momento de modernidade urbana, política, econômica e cultural das cidades brasileiras. Cada uma no seu tempo.
            A década de 20 foi o apogeu desta “bela época” e é denominada por muitos estudiosos como os “loucos anos 20”, pois foi o período que mais desafiava os padrões “éticos” e “morais” daquela sociedade estamental e tradicional que se mantinha no Brasil desde o período colonial. A literatura sofreu um choque com o Modernismo, pois as poesias que antes eram compostas por uma métrica formalizada, se transformaram em versos criativos e libertos de qualquer padronização. A arte e a música também passavam por mudanças nas suas composições, onde telas pintadas com cores mais vivas e desenhos abstratos adentravam a sociedade em ebulição.
            E quanto à sociedade, o que mudou? As mulheres! Sim, as mulheres encurtavam as saias, cortavam seus cabelos, tiravam os espartilhos, deixavam as luvas de lado para exibir seus esmaltes e se embelezavam com a maquiagem. Outra inovação na vida das mulheres foi a prática de exercícios físicos que passava a ser constante no cotidiano feminino, como jogar tênis, nadar e pedalar. As mulheres que antes eram exclusivamente dedicadas ao lar, abriam-se ao esporte e à moda.
            Deste modo, tais mudanças podiam ser vistas também nas composições musicais de cantoras que anunciavam o novo comportamento do universo feminino. Como exemplo, existe a canção “Dona Balbina” que na voz da inesquecível Carmem Miranda dizia assim: “Oh! Dona Balbina, isso assim não pode ser / o trabalho me amofina, não nasci para sofrer! / Vou me atirar na gandaia, pois só assim vivo bem / A vida é fogo de palha, meu ‘negô’ / E eu preciso é ‘gostá’ de alguém não é?”. Mas, como toda ação tem uma reação, outras músicas como “Tua saia é curta” e “Futurista” de Francisco Alves criticavam as mudanças femininas.
            Como se vê, os anos 20 muito têm a revelar sobre as inovações da “Belle Époque” em todas as esferas sociais. Digamos que este foi o tempo que se iniciaram as principais mudanças que o país vem sofrendo até os dias de hoje. É claro que, tudo o que foi dito nestas poucas linhas aconteceu principalmente nos centros urbanos do país, afinal estas transformações chegavam as mais distantes cidades brasileiras cada qual a seu tempo, se adequando a sua história. Muito interessante os loucos anos 20!

REFERÊNCIA: Artigo de Mary Del Priore, Revista Aventuras na História – jan/2012.

SÃO PAULO DE MUITAS FACES



ARTIGO PUBLICADO PELA PROFª KARLA O. ARMANI NO JORNAL "O DIÁRIO DE BARRETOS" EM 28 DE JANEIRO DE 2012


Não mudou, não se apagou a tua sedução / A garoa cai à toa, pra guardar a tradição
São Paulo, num só minuto, é o Brás, Tietê, Viadutos / Barraca de flores e a multidão
Os pardais em madrigais, o sol rasgando a cerração / E a noite, com seus pintores, apagando e acenando em cores / Teu nome no meu coração. (Bezerrinha).
            O verso acima é parte da música “Perfil de São Paulo” composta pelo conhecido músico de Barretos, o Bezerrinha. Em 1954, esta composição foi eleita a música Hino de São Paulo na ocasião do 4º Centenário da capital paulista e Bezerrinha foi considerado o melhor compositor e sua música a melhor do ano. É com estes versos premiados que comemoramos os atuais 458 anos de fundação de São Paulo, aniversariante no último dia 25.
            Ao observar o acelerado cotidiano que vive os paulistanos, pode se passar despercebida a história que há quatro séculos e meio vêm sendo construída naquele espaço. Muitos são os problemas que a megalópole enfrenta em seu dia-a-dia, dificuldades que se concentram no trânsito estressante, na violência urbana, nas habitações escassas e nas poluições ambientais, visuais e sonoras. Por outro lado, a maior cidade brasileira é também o mais dinâmico centro econômico do país, local de maior fluxo de capitais e de trabalhadores em atividade.
            O fato é que este cenário urbano de aspectos positivos e negativos é resultado de uma história, uma memória que resiste nas ruas, nos casarões, nos museus, nas universidades e demais localidades que ali resguardam os ares do passado. São Paulo foi uma cidade fundada por jesuítas, com destaque aos padres José de Anchieta e Manoel da Nóbrega, que viram no Planalto do Piratininga um local seguro para se fundar o Colégio dos Jesuítas, em 25 de janeiro de 1554. A partir de então e durante boa parte do período colonial, São Paulo tornou-se ponto de partida para aqueles que queriam se aventurar nas matas interioranas afim de buscar metais preciosos e aprisionar índios. Este período até pouco tempo atrás, era retratado na história como a “glória” dos paulistas “heróis”, isto é, os bandeirantes.
            Mas foi no século XIX que São Paulo se destacou na economia e fez de sua sociedade um exemplo de urbanidade e modernidade. Este período de vigor econômico traduzia-se nas sacas de café que eram produzidas pelos negros escravizados e, mais tarde, pelos imigrantes europeus, administradas pelos fazendeiros e exportadas para várias partes do mundo. O século XIX colocou a capital paulista em destaque no Brasil e preparou as bases financeiras que no século XX fincaram a industrialização na cidade. Fenômeno este que cresceu desenfreadamente a ponto de se transformar na megalópole que ali se manifesta em cultura, tecnologia, mas, também em desigualdade social.
            São Paulo possui muitas faces em sua história. Sua memória é carregada por diversas particularidades que a diferem das demais cidades. Entretanto, cada cidade do interior paulista carrega em si um pouco da capital, afinal uma cidade que completou 458 anos tem muito a ensinar. Parabéns São Paulo!      

ÀS FACHADAS MUDAS E RESISTENTES DO CENTRO DE BARRETOS



ARTIGO PUBLICADO PELA PROFª KARLA O. ARMANI NO JORNAL "O DIÁRIO DE BARRETOS" EM 21 DE JANEIRO DE 2012

            Leitor amigo, concorda que tudo que é exagerado pode enjoar? É neste pensamento que proponho uma reflexão sobre a poluição visual da cidade. Quando caminhamos no centro de Barretos, percebemos que se alguém quiser encontrar uma loja, terá que se distanciar um pouco da fachada para conseguir identificá-la. Isto porque os letreiros de publicidade das lojas são tão grandes e coloridos que confundem nossas vistas e, de certo modo, as “polui”. Isto acontece porque o comércio cresce demasiadamente (o que é bom para a economia), mas não tem uma conduta legal a ser seguida sobre como lidar com a visibilidade de sua propaganda. O mais interessante deste assunto é o que está por trás destes letreiros, aquilo que tenta ser apagado, mas que está ali, mudo e resistente. Refiro-me as belíssimas fachadas dos prédios antigos do centro da cidade que estão escondidas atrás dos grandes letreiros das lojas, sendo que poderiam estar sendo aproveitadas tanto para o comércio, quanto para sua propaganda.
            É claro que este assunto exige maiores conhecimentos e não sou especialista em publicidade, comércio e legislação, mas sugiro uma reflexão inicial para que comerciantes e comunidade possam desfrutar daquilo que está por trás destes letreiros: os patrimônios históricos. Ao andar pelas ruas do centro de Barretos, deparamo-nos com belos prédios que foram construídos ainda na primeira metade do século XX, ou seja, numa época em que, arquitetonicamente falando, Barretos era cenário de um moderno centro urbano. Nesse sentido, negar essa história escondendo as fachadas dos prédios daquela época é, no mínimo, um desleixo com o passado que tanto prosperou e fechar as portas para um turismo que poderia crescer.
            Em 2007, na capital paulista, foi instituída pelo prefeito Gilberto Kassab a “Lei Cidade Limpa” que tinha por missão regulamentar e padronizar os painéis de propaganda e, consequentemente, contribuir para o declínio da poluição visual que assolava São Paulo. Tal lei proibiu a colocação de anúncios publicitários nos imóveis públicos e privados, edificados ou não; e os letreiros das lojas deveriam ser proporcionais às fachadas. Nesses últimos tempos, tal lei foi oficializada em cidades do interior paulista e chegou a nossa vizinha Ribeirão Preto, que, com alguns ajustes, também adotou a lei para diminuir a poluição visual e preservar seu patrimônio arquitetônico. O interessante de Ribeirão Preto é que será cobrada uma multa de no mínimo R$ 10 mil reais pelo descumprimento da lei.
            Segundo manifestações das redes sociais da internet, a Lei Cidade Limpa já foi cogitada em Barretos, mas não chegou a ser adotada. Uma pena. Quantos prédios do centro de Barretos terão de ser demolidos para autoridades tomarem uma providência? Pois a cada dia que passa, mais demolições da nossa história estão vindo à tona. A reflexão sobre isso gira em torno de uma pergunta muito simples: o que Barretos teria para oferecer de diferente a sua comunidade e a seus turistas sem os seus prédios antigos? Com um centro contido por grandes letreiros e anúncios de publicidades seríamos somente mais uma cidade comercial. Precisamos resgatar aquilo que nos particulariza, aquilo que nos identifica, a nossa memória. Pensemos, a comunidade clama por isso.