domingo, 9 de dezembro de 2012

A “ÚLTIMA” VONTADE: TESTAMENTOS COMO FONTES


ARTIGO PUBLICADO PELA PROFª ESP. KARLA O. ARMANI, EM 9 DE DEZEMBRO DE 2012, NO JORNAL "O DIÁRIO DE BARRETOS"


            A História é mesmo uma ciência incrível, que “bebe” nas variadas fontes escritas (ou não) da trajetória da vida humana. Mas, não só a vida do homem tem a informar sobre o passado, a “morte”, ou melhor dizendo, simbologia e os registros sobre a morte, também pode trazer informações relevantes sobre uma dada sociedade e época. Dentro do estudo sobre a “morte”, dissertações a respeito de rituais, cemitérios e arte tumular têm ganhado força nos últimos tempos, mas, são os documentos a respeito dela que iremos tratar neste texto: os testamentos e os inventários post-mortem; mais especificamente sobre os primeiros.
            O direito do indivíduo em impor sua vontade na partilha de seus bens é o significado sintetizado do conceito de “testamento”, que existe no Brasil desde o Período Colonial. Nesta época, as leis a esse respeito eram estabelecidas pelos ditames da metrópole portuguesa segundo as “Ordenações Filipinas”; e assim vigorou no Brasil até o Império. Somente em 1916, com a aprovação do “Código Civil Brasileiro” que tal ordenamento foi substituído.
            Dada a extensão dos períodos da Colônia, do Império e da República do Brasil, sabe-se que existe uma ampla documentação de testamentos e registros civis guardados nos cartórios, órgãos do judiciários e outros arquivos no território nacional. Os estudos sobre os testamentos, por exemplo, podem gerar importantes pesquisas a respeito da religiosidade, da cultura material (bens materiais e valores de certa época), da escravidão (escravizados forros ou doação aos mesmos), dos excluídos (filhos ilegítimos, escravos, hereges, religiosos professos, mudos-surdos, “loucos”, etc) das famílias (relação de filhos, pais, casamentos, incestos), dentre outros.
            Um dos temas mais interessantes a respeito dos estudos testamentários é a religiosidade, afinal muitos testadores destinavam suas heranças a santos de devoção, cerimônias funebres, missas e instituições de caridade – na intenção de “salvarem” a alma. Nos testamentos analisados em séries, vêem-se expressões que remetem a possíveis mudanças nos ritos religiosos, nas crenças e concepções em torno da morte.
            Em Barretos, um testamento me chamou a atenção pelo perfil do testador e o destino de parte de sua herança. O testador era João Machado de Barros, falecido em 1924, porém tendo registrado seu testamento em cartório em 1918. Sua herança foi destinada as suas duas filhas adotivas, mas um terço dela era para ser revertido à Santa Casa de Misericórdia de Barretos – que na época estava começando a ser construída. Essa quantia, equivalente a aproximadamente 50 contos de réis, era chamada de “terça”, e era muito comum naquela época de mentalidade religiosa. Outros detalhes do testamento chamam a atenção para o caráter religioso, como o fato do mesmo iniciar com os dizeres “...dizem no ano do nascimento no nosso senhor Jesus Christo de mil novecentos...”, e também citar os nomes dos padrinhos de batismo do testador.
            Muitos detalhes sobre a mentalidade e a vida material das pessoas que viveram na cidade nos séculos XIX e XX podem ser devendados a partir da análise histórica dos testamentos. Para isso, é necessário que tais documentos continuem sendo preservados pelos órgãos responsáveis. “Que assim seja”!

Fonte: Texto de Junia F. Furtado: “A morte como testemunho da vida” /
Arquivo do 2º Tabelionato de Barretos, Escrituras nº 92, f. 42-43.   

O EXÉRCITO, A HISTÓRIA E A MÍDIA


ARTIGO PUBLICADO PELA PROFª ESP. KARLA O. ARMANI, EM 2 DE DEZEMBRO DE 2012, NO JORNAL "O DIÁRIO DE BARRETOS"


            No último dia 26 de novembro um fato inédito aconteceu no Exército do Brasil: uma mulher conquistou um cargo de oficial general das Forças Armadas. Dalva Maria Carvalho Mendes recebeu a patente de “Contra-Almirante” da Marinha depois de muitos anos de serviços prestados ao exército. Formada em medicina, Dalva fez parte da primeira turma do corpo auxiliar feminino de oficiais da Marinha do Brasil de 1981.
            Este fato atraiu muito a atenção da mídia brasileira pelo “brilho” da patente da contra-almirante e também pelo fato de tal cargo ser destinado a uma mulher. Esta notícia causa tanto entusiasmo pelo fato do Exército ser historicamente associado a figuras masculinas. Deste modo, o recebimento de tal patente numa instituição que até então era predominantemente masculina, representa a evolução e as conquistas da mulher não só no lado profissional, bem como no aspecto social e cultural da comunidade brasileira.
            Tal novidade na Marinha desperta-nos a lembrança de outro episódio ocorrido há mais de cem anos atrás no Rio de Janeiro; a Revolta da Chibata. Ao contrário da relevância dada a primeira mulher “contra-almirante” da Marinha na atualidade, a Revolta da Chibata parece não ser reconhecida pela instituição. Especula-se que, esta posição do exército assim se deu por conta deste conflito ter sido iniciado pelos marinheiros; então componentes de cargos rasos da Marinha.
            Era 22 de novembro de 1910, no Rio de Janeiro, quando os marinheiros tomaram alguns “couraçados” da Marinha e ameaçaram bombadear a capital do Brasil; que na época contava com estimados 900 mil habitantes. Sob a liderança de João Cândido, o “Almirante Negro”, os marinheiros protestavam diante às punições da “chibata” que recebiam, a péssima alimentação e os maus-tratos. Mais de 2.300 marinheiros participaram desta revolta, que contava com a tomada de pelo menos quatro grandes navios da Marinha brasileira. Depois de alguns dias de tensão por parte dos revoltosos e dos civis cariocas, o governo brasileiro aprovou as reivindicações dos marinheiros e a lei de anistia. No entanto, pouco tempo depois, a lei foi revogada e novos confrontos começaram; o que resultou em massacre, prisões e exílio de marinheiros.
            Segundo algumas fontes, este episódio não é reconhecido pela Marinha do Brasil, porém, os livros didáticos de História já o tomaram como parte importantíssima do contexto histórico da Primeira República no Brasil. As vozes dos marinheiros, última instância na Marinha do Brasil, estão sendo estudadas e disseminadas na história do povo brasileiro. Inclusive, a mídia televisiva está apresentando este episódio como “pano de fundo” da atual novela das seis da Rede Globo; “Lado a Lado”.
            Que a relevância que foi dada a primeira mulher general oficial das Forças Armadas do Brasil também seja estendida ao levante dos marinheiros de 1910. Afinal, independente de gênero e “altura” das patentes, todos os configurados do exército, em especial àqueles que lutaram por melhorias e conquistas, são de fato importantes à instituição e à história do Brasil! 

CARTOLA: O POETA DO SAMBA


ARTIGO PUBLICADO PELA PROFª ESP. KARLA O. ARMANI, EM 25 DE NOVEMBRO DE 2012, NO JORNAL "O DIÁRIO DE BARRETOS"


“Queixo-me às rosas / Mas que bobagem, as rosas não falam / Simplesmente as rosas exalam... o perfume que roubam de ti” (Cartola).
           
As palavras acima são parte de uma das mais belas canções brasileiras, “As rosas não falam”, de autoria do “Mestre” Cartola; um verdadeiro “trovador” brasileiro. Assim podemos dizer, por causa da intensidade das letras de suas canções, que quando tocadas, revelam mensagens de amor e de inspirações para a vida. Cartola, mesmo nascendo no início do século XX, continua a ser sempre citado no que diz respeito à música popular brasileira e, principalmente, ao samba; já que ele foi um dos primeiros sambistas do Rio de Janeiro.
Como o samba também suas raízes nos batuques africanos e seus primeiros representantes eram negros, Cartola não podia ser diferente. E, como tal, na última semana, quando se comemorou o dia da Consciência Negra, Cartola foi por diversas vezes citado na mídia, tanto por suas canções encantadoras, quanto por sua história de vida. Falemos, então, um pouco sobre a biografia do “mestre do samba”, que mesmo entre “pedras no caminho” fez de sua música uma inspiração à vida.
Chamava-se Angenor de Oliveira, nascido no Rio de Janeiro, então capital do Brasil, em 1908. Aos 11 anos mudou-se para o Morro da Mangueira, local que evidenciaria seu sucesso, pois desde muito cedo já tocava cavaquinho. Parou de estudar aos 15 anos, quando sua mãe faleceu, completando somente o ensino primário. Depois disso, trabalhou em tipografias e como pedreiro; quando adquiriu o apelido de “Cartola” em razão de usar um chapéu (a cartola) para não deixar que o cimento o sujasse.
Em 1925, ao lado de amigos, como Carlos Cachaça, fundou um bloco de samba, que, três anos depois, se fundiu com outros e formou a “Estação Primeira de Mangueira”; uma das mais tradicionais escolas de samba cariocas. Como suas canções de samba faziam sucesso na “Mangueira”, na década de 30, Cartola se destacou como compositor e teve suas canções gravadas por artistas de renome na época, como Carmem Miranda, Mário Reis, Francisco Alves, Noel Rosa, Silvio Caldas e Araci de Almeida. Na década de 40, por conta de problemas pessoais (há quem diga que foi de saúde), ele desapareceu do cenário musical; somente em fins dos anos 50, voltou a cantar. Na década de 60, abriu um restaurante com sua esposa, o “Zicartola”, que era ponto de encontro dos sambistas do morro. Em 1974, gravou seu primeiro LP aos 66 anos; sendo dois anos depois o lançamento de seu segundo LP e de seu primeiro show individual. A partir de então, gravou mais discos, fez apresentações e shows, até sua morte em 1980.
Desde então, o “mestre” Cartola nunca parou de ser citado na mída, no samba e até na poesia. Talvez, mais do que a brasilidade do ritmo de suas canções, seja a poesia das letras de Cartola que o tenham eternizado no tempo. As letras de suas canções são tão belas que chegam a dar mais brilho à língua portuguesa, afinal usar tão bem os verbos, as rimas e as expressões brasileiras só é possível para um original “poeta do samba”.

CONSCIÊNCIA NEGRA: REFLEXÕES


ARTIGO PUBLICADO PELA PROFª ESP. KARLA O. ARMANI, EM 18 DE NOVEMBRO DE 2012 NO JORNAL "O DIÁRIO DE BARRETOS"


            Na semana da “Consciência Negra” é comum refletirmos sobre o passado da comunidade negra e, principalmente, sobre suas conquistas na sociedade. Assim, falar a respeito da inserção dos negros no atual mercado de trabalho, bem como seu acesso à saúde, educação e moradia são assuntos discutidos neste período. Mas, e na escola? Como trabalhar a semana da Consciência Negra? O que a sala de aula pode trazer de reflexão aos alunos a respeito disso?
            As aulas de História, assim como as outras áreas das ciências humanas, têm muito a oferecer sobre este assunto; afinal não há nada melhor que estudar o passado, a cultura e a memória para se refletir sobre as problemáticas atuais. Deste modo, discutir a respeito não só da escravidão, das fugas e das punições são questões importantes sobre a consciência negra; mas, principalmente, pensar sobre as africanidades, as heranças culturais e as contribuições dos negros.
            Além do mais, tratar destas questões é algo definido por lei federal no Brasil (lei 10.693/03), onde o ensino de História insere em seu currículo a “história e cultura afro-brasileira e africana” como parte integrante da disciplina de História. Neste sentido, o professor de História deve trabalhar com os alunos a trajetória da cultura africana e sua relação com a afro-brasileira. Na prática, estes conceitos podem ser desenvolvidos com os alunos dos 6º, 7º, 8º e 9º anos, haja vista que são nestes períodos que são trabalhados respectivamente os conteúdos referentes à África na Antiguidade, Islamismo, Grandes Navegações, Colonialismo, Tráfico, Escravidão no Brasil, Resistência e Quilombos, Revoltas, Leis Abolicionistas, Abolição, heranças culturais, Imperialismo, Descolonização e Movimentos de Libertação Nacional.
Em todos os ciclos escolares, mesmo com o “tempo apertado”, é possível que o professor de História sempre trabalhe os conteúdos da história africana e afro-brasileira, para que o aluno construa em sua mentalidade a importância da contribuição africana na história do nosso país e a presença do elemento africano em nossa cultura. Sendo assim, fica visível, e até “natural”, pensar que não há Brasil sem África, visto que foi do continente africano que saiu grande parte daquilo que chamamos de cultura brasileira.
É por essas e outras, que o 1º artigo da lei 10.639/03 declara a importância do estudo da História da África e dos Africanos, a luta dos negros no Brasil, a cultura negra brasileira e o negro na formação da sociedade nacional, resgatando a contribuição do povo negro nas áreas social, econômica e política pertinentes à História do Brasil”. Logo, através do estudo da cultura africana e afro-brasileira, que a História pode contribuir como reflexão na semana da “Consciência Negra”.

“LIBERDADE, LIBERDADE, ABRE AS ASAS SOBRE NÓS!”


ARTIGO PUBLICADO PELA PROFª ESP. KARLA O. ARMANI, EM 11 DE NOVEMBRO DE 2012 NO JORNAL "O DIÁRIO DE BARRETOS"


Liberdade, liberdade!
Abra as asas sobre nós
E que a voz da igualdade
Seja sempre a nossa voz.
            Leitor amigo, você já ouviu este refrão de música? Ele está muito conhecido ultimamente pois é parte da abertura da novela “Lado a Lado”, da Rede Globo. A novela trata do Rio de Janeiro durante os primeiros anos da República do Brasil e tal música faz referência exatamente sobre esta época. Esta canção foi samba-enredo da escola de samba “Imperatriz Leopoldinense” no carnaval de 1989; ano em que a República brasileira completaria 100 anos de proclamação. A mesma República que, na próxima quinta-feira, dia 15 de novembro, completará 123 anos.
Na canção “Liberdade, Liberdade, Abre as asas sobre nós”, o tema da “República” é retratado como resultado de uma série de acontecimentos que o antecederam. Como, por exemplo, o fato do Império no Brasil ser uma instituição anacrônica (“O Império decadente, muito rico, incoerente”); a Guerra do Paraguai e o Duque de Caxias (“Da guerra nunca mais, esqueceremos o patrono, o duque imortal”); os imigrantes europeus que trabalharam nas lavouras de café e mais tarde nas indústrias (“A imigração floriu de cultura o Brasil”); a Princesa Isabel e a Lei Áurea (“Pra Isabel, a heroína, que assinou a lei divina”); a Abolição (“Negro, dançou, comemorou o fim da sina”); e o Marechal Deodoro ter proclamado a República em 15 de novembro de 1889 (“Na noite quinze reluzunte; com a bravura finalmente; o marechal que proclamou, foi presidente”).
O mais interessante deste “samba-enredo”, porém, é o próprio refrão que, na verdade, é uma “nova” versão do Hino da República do Brasil. Assim, que a República foi proclamada, já em janeiro de 1890, o governo republicano, interessado em criar novos símbolos que despertassem o povo para aquele recente regime político, quis criar um hino da República brasileira. Depois de vencer o concurso para a composição de tal hino, o político e escritor José Joaquim de Campos da Costa de Medeiros e Albuquerque compôs a letra e o músico Leopoldo Miguez fez a melodia.
O original “Hino da República do Brasil” então passou a ter o seguinte refrão: “Liberdade, Liberdade, Abre as asas sobre nós! / Das lutas na tempestade / Dá que ouçamos tua voz”. E foi exatamente esta parte que a escola Imperatriz, cem anos depois, parafresou em uma versão nova na Sapucaí. O hino original fazia menção também aos fatos passados como a escravidão (“Nós nem cremos que escravos outrora / Tenha havido em tão nobre país”), as novidades republicanas como o sufrágio universal masculino (“Somos todos iguais”) e aos novos símbolos como o “herói nacional” Tiradentes (“Sangue vivo do herói Tiradentes”).
Com a criação do Hino Nacional, em 1909, o Hino da República foi perdendo espaço e apreciação. Fato que foi retomado um século depois com a escola de samba “Imperatriz Leopoldinense” e agora está, novamente, sendo revivido na novela; mesmo sendo esta uma história fictícia. Mas, o Hino da República ainda pode ser resgatado nos dias de hoje pelas escolas, onde as aulas de História podem utilizá-lo como fonte para o aprendizado a respeito dos anos inciais da República brasileira. Uma República centenária e rica em símbolos e memórias! 

OS CORONÉIS DA GUARDA NACIONAL


ARTIGO PUBLICADO PELA PROFª ESP. KARLA O. ARMANI, EM 4 DE NOVEMBRO DE 2012 NO JORNAL "O DIÁRIO DE BARRETOS"


            Leitor amigo, já reparou que boa parte das escolas, ruas e praças de Barretos tem nomes de coronéis? Sem querer, nomes como “Cel. Almeida Pinto”, “Cel. Raphael Brandão”, “Cel. Silvestre de Lima”, entre outros, passam por nosso cotidiano e acabam sendo retidos por nossas memórias. Mas, quem foram estas pessoas? O que de fato era ser um coronel? Especulemos então.
            A designação “coronel” nada mais era do que uma patente da Guarda Nacional. Esta instituição, inspirada nos modelos franceses, surgiu durante o período das Regências no Brasil, em 18 de agosto de 1831. Nesta época, a nação brasileira passava por crises políticas, em razão da abdicação de Pedro I, e sociais, por conta das revoltas provinciais. Em pelo menos quatro províncias do Brasil, cinco revoltas abalaram a estrutura governamental e ameaçaram a unidade territorial. Por isso, o governo regencial criou a Guarda Nacional – extinguindo os corpos de milícias e a Guarda Municipal, para garantir a “ordem” e agir quando necessário interna e externamente no território nacional.
            Como de praxe na época, para fazer parte da lista dos membros da Guarda Nacional, era necessário ter as mesmas condições para ser eleitor e votante, isto é, homem, maior de idade, com renda mínima anual, além do alistamento ser obrigatório dos 18 aos 60 anos. Somente os mais abastados ocupavam as patentes mais altas da Guarda Nacional, como “coronel”, “major”, “capitão” e “tenente”; títulos disputados entre os mais ricos de cada localidade. Sendo assim, por muito tempo, os membros das mais altas patentes da Guarda Nacional eram aqueles pertencentes à elite agrária brasileira, os fazendeiros, e por isso a designação “coronel” acabou por virar sinônimo de latifundiário. Além disso, sabe-se que tais coronéis utilizavam de meios violentos e da “troca de favores” para fazer seus trabalhadores votarem nos candidatos de seus interesses, depois da Proclamação da República.
Ao longo do século XIX, a Guarda Nacional contribuiu para a “segurança nacional”, já que o exército brasileiro só foi remodelado a partir da Guerra do Paraguai (1864). Mas, a principal atuação desta instituição foi na “ordem” pública dos munícipios, essencialmente àqueles que se emanciparam após o regime republicano de 1889. E assim foi com Barretos, que teve a Guarda Nacional criada no final do século XIX e reorganizada em 1902, quando o dr. Antonio Olympio era o chefe do diretório republicano na cidade. Em 1918, ocasião em que a Guarda Nacional começou a ser extinta e absorvida pelo Exército, Barretos já possuía seis brigadas – cinco infantarias e uma cavalaria.
            Os coronéis da Guarda Nacional, alguns mais atuantes na área rural e outros na cidade, continuam gravados de alguma forma na nossa cidade, mesmo passado tanto tempo desde sua extinção. Então, seria interessante que tivessemos conhecimento sobre a ação deles em Barretos e porque seus nomes continuam por aí... quem sabe até na sua própria rua, leitor amigo. Pensemos. 

“BRASIL NAÇÃO”: HISTÓRIA E IDENTIDADE


ARTIGO PUBLICADO PELA PROFª ESP. KARLA O. ARMANI, EM 28 DE OUTUBRO DE 2012 NO JORNAL "O DIÁRIO DE BARRETOS"

            A História é uma ciência discutida desde os tempos da Grécia Antiga, afinal o “pai” da história foi o grego Heródoto (século V a.C). Durante os períodos da Antiguidade, do Medievo, da Era Moderna e da Contemporaneidade, a História se manifestou nas sociedades como uma ciência que não estuda só o passado, mas utiliza-o como um elemento comum ao povo de um mesmo território, aliás de uma “nação”. A História era a base para a construção da ideia de “nação”.
            Com o Brasil, não foi diferente.
            Nos tempos coloniais, o Brasil era preso ao Sistema Colonial e se comportava como uma imitação estendida da metrópole portuguesa. A partir da Independência (1822), para assegurar a unidade nacional, o governo buscava construir a imagem do Brasil como uma “nação independente”. Para isso, passou a utilizar-se daquilo que criaria um carater “identitário” ao povo: a sua história; algo que ainda não tinha sido construído naquela recente “ex” colônia.
            Essa busca pela “História do Brasil” se tornou mais vigente durante a década de 1830, no Período Regencial. Nesta época, o Brasil era governado por regentes (trinos e unos), porque o imperador Pedro I havia abdicado seu trono em 1831 e o príncipe regente tinha somente cinco anos de idade. A situação estava “tensa” para o governo, uma vez que o Brasil era a única “nação” regida pelo sistema monárquico na América naqueles anos oitocentos. Ainda mais, nesta mesma década, pelo menos cinco revoltas sociais estouraram nas províncias do Grão Pará, Bahia, Maranhão e Rio Grande do Sul. A Cabanagem, Sabinada, Revolta dos Malês, Balaiada e Farroupilha demonstraram a insatisfação popular diante o governo regencial e ameaçavam a unidade da nação.
            A “História do Brasil”, mais do que nunca, começou a ser criada com a fundação do IHGB (Instituto Histórico e Geográfico Brasileiro) em 1838. O estudioso europeu Karl Von Martius foi o responsável pela primeira escrita da história do Brasil. Sua pesquisa ficou muito conhecida, afinal ele procurou demonstrar a miscigenação e a contribuição de cada uma das raças do povo brasileiro, tais como os portugueses e os africanos. Mas, foi no “indígena” que Von Martius destacou a particularidade dos brasileiros, como descendentes destes nativos. A partir de então, iniciou-se uma valorização e romantização perante a figura do “índio” que era vista em pinturas (como as de Vitor Meirelles), na literatura (José de Alencar) e até na música (“O Guarany” de Carlos Gomes).
            E foi assim que nasceu a “História do Brasil”, intencionalmente, para dar uma cara de “nação” a uma terra que havia sido colônia por mais de trezentos anos, mas que agora queria ter a sua própria história. Uma história geral do Brasil.

DOS CURANDEIROS AOS MÉDICOS


ARTIGO PUBLICADO PELA PROFª ESP. KARLA O. ARMANI, EM 21 DE OUTUBRO DE 2012 NO JORNAL "O DIÁRIO DE BARRETOS"


            No dia 18 de outubro, que já se passou, foi comemorado o “dia do médico”. Por isso, seria interessante falarmos a respeito dos primeiros médicos que se instalaram em Barretos e suas dificuldades diante uma população que só conhecia os curandeiros. Hoje, com todos os avanços na área da medicina e o acesso à saúde (mesmo com tantos problemas), talvez seja difícil imaginar a vida sem os médicos, os hospitais, os remédios. Mas, assim era Barretos há mais de um século atrás...
            No século XIX, quando Barretos ainda era uma vila e a vida da população se pautava num ambiente ruralizante, quase não se via médicos por essas bandas. Quando alguém ficava doente, logo se recorria a um curandeiro para que através de “benzeções”, simpatias e poções se estabelecesse a cura. O interessante é que muitos destes curandeiros também eram coronéis, que além de exercer o poder político, acumulavam várias funções como advogados, professores e até curandeiros! Para se ter ideia da raridade de um médico, conta-nos Osório Rocha que, por volta de 1890 existia na cidade o então “médico” “Dr.” João Batista Soares. Mas, depois descobriu-se que este título não lhe pertencia de fato, porque, na ocasião da Guerra do Paraguai, ele serviu como soldado ao lado de seu primo João Batista Soares, que era estudante de medicina. Como o mesmo faleceu durante a guerra, ele assumiu a identidade do primo e sua função de médico.
            Os médicos licenciados começaram a aparecer em Barretos após a instalação da República em fins do século XIX e início do XX. Podemos ver alguns nomes deles em propagandas do jornal “O Sertanejo”, onde se percebe que muitos deles moravam em hotéis, atendiam a domícilio e de graças aos pobres! Um deles, por exemplo, era o dr. Mathias Lex, que em 1901 foi o responsável pela campanha de vacinação contra a varíola na cidade.
            A partir da década de 1910, com a instalação da Casa de Caridade (1911, na Sociedade Espírita 25 de Dezembro) e da Santa Casa de Barretos (1921), começaram a se instalar mais médicos na cidade de Barretos. Sendo válido notar, que a maioria destes doutores formava-se nas grandes universidades das capitais e depois vinha atuar na cidade. Dentre eles, podemos destacar o dr. Raymundo Mariano Dias formado pela Faculdade de Medicina do Rio de Janeiro e também o dr. Henrique Pamplona de Menezes, formado pela mesma universidade no ano de 1884! Médicos como estes atuaram em vários setores da cidade, e por isso fazem parte da nossa história.
            Uma história longa, que adentrou o século XX e XXI, onde passaram médicos e “causos” interessantes como o dr. Francolino Galvão de Souza, que fez a primeira cesariana em Barretos no ano de 1934; a dra. Nilda Bernardi, primeira médica mulher da Santa Casa e o dr. Paulo Prata, que junto com uma equipe e sua esposa, fundou o Hospital de Câncer de Barretos. São essas e outras histórias que nos fazem perceber a importância dos médicos, dos hospitais e da saúde na nossa cidade de Barretos.


AO DIA DO PROFESSOR



ARTIGO PUBLICADO PELA PROFª ESP. KARLA O. ARMANI, EM 14 DE OUTUBRO DE 2012 NO JORNAL "O DIÁRIO DE BARRETOS"



            15 de outubro, o dia do professor. Uma profissão que no passado ocupava mais nobre titulação e respeito por parte da sociedade. Sabe-se que as condições da profissão do “professor” atualmente são mais delicadas, principalmente no que diz respeito à jornada de trabalho, salários, titulações e tarefas complementares. Mas, o objetivo deste artigo não é falar destes problemas (que são demasiados graves), e sim homenagear uma das mais antigas e importantes profissões do mundo: a do educador.
            Nos últimos tempos, as redes sociais cada vez mais circulam imagens e textos fazendo menção à profissão do professor como algo negativo e decadente, por conta dos problemas da educação no Brasil. Estas críticas, na visão do senso comum, em vez de levar à reflexão sobre a situação do professor, acabam por somente desvalorizá-lo. Porém, muitos se esquecem que sem o professor não há a formação de nenhum profissional, pois desde o ensino fundamental ao superior, é necessário a atuação deste. E essa necessidade não é algo que vale somente para o fim profissional, mas principalmente à formação do cidadão.
            Todo indivíduo formado em alguma “licenciatura” promete, no dia da formatura, “formar cidadãos”, independente da área de atuação. E este é o principal papel do professor, é com ele que o aluno aprende seus direitos e deveres, a transformar a sociedade de acordo com suas pequenas ações, a viver em comunidade, a conhecer seu espaço, a preservar os bens públicos, a se reconhecer como pertencente a uma certa identidade coletiva, dentre outras coisas. Além, é claro, de ser o professor também o responsável pela aprendizagem nas diversas áreas do conhecimento: ciências humanas, exatas e biológicas. Sendo importante lembrar que, a cidadania passada pelo professor não é sinônimo de educação moral, esta é responsabilidade da família.
            Desta forma, a presença do professor em sala de aula é de suma importância para a aprendizagem do aluno afim de que sempre haja uma “troca” entre os dois, de experiência por parte do professor e de curiosidade por parte do aluno. Assim, a curiosidade e a vontade de aprender do aluno é o que move a atividade do professor, que, através de sua experiência, consegue construir o conhecimento. Às vezes, algumas críticas sobre o futuro acreditam que um dia a profissão do professor irá acabar, em decorrência da desvalorização de sua figura perante à sociedade. Mas, se isso acontecesse, como seriam formados os cidadãos? Como aconteceria a transmissão e a troca de conhecimentos para com o aluno? Quem iria intermediar esta relação?
            O “humanismo” talvez seja a característica mais presente na profissão do professor, afinal não há maneira de ensinar e aprender sem o contato com o aluno, a amizade, o companheirismo, o respeito e a cordialidade. Ensinar, aprender, trocar, formar e construir, são as ações que o professor mais realiza dentro da sua profissão. Tudo isso, regado de muito humanismo, ousadia, coragem e determinação, que, incansavelmente, o professor desperta em si mesmo a cada dia, desde as 6 horas da manhã. Feliz dia dos professores a todos aqueles, que como eu, se orgulham de ter a profissão que forma as demais! Congratulações àqueles que acreditam na educação!

REPÚBLICA: O POVO E A POLÍTICA


ARTIGO PUBLICADO PELA PROFª ESP. KARLA O. ARMANI, EM 7 DE OUTUBRO DE 2012 NO JORNAL "O DIÁRIO DE BARRETOS"


“Cada povo tem o governo que merece, e o nosso, por enquanto, ainda não se mostrou digno de o ter melhor. Quem o afirma, é um republicano” (O Sertanejo, 15/9/1901)
A citação acima é parte de uma reportagem do jornal “O Sertanejo” de Barretos, escrita nos primeiros anos da República brasileira. A reportagem inteira remete ao pensamento de “desilusão” que os “republicanos históricos” (aqueles que lutaram pela República no Brasil desde a época do Império) estavam sentindo em relação ao que tinha se tornado aquele que era para ser o “governo do povo”. Sabemos que a República brasileira foi proclamada pela soberana vontade da elite agrária e dos militares, muito distante do povo. Por isso, a falta de participação popular, as fraudes e a corrupção vigentes naquele período desiludiam aqueles republicanos que, de fato, acreditavam na força da República. E, segundo a reportagem, se o povo não lutava para mudar esta situação, era então merecedor daquele governo corrompido e “degolador”.
Esta reflexão nos permite alcançar os dias atuais. Diferente dos outros países latinos, o povo brasileiro não participou e nem lutou em episódios importantes de sua história, como a Independência do Brasil e a sua Proclamação da República. E isso talvez tenha repercutido nos dias de hoje, principalmente no momento em que o eleitor se depara com as urnas. Afinal, alguns cidadãos brasileiros simplesmente ignoram o processo eleitoral, não refletem sobre as propostas e a trajetória dos candidatos e insistem em dizer que são “apolíticos”.
Apolíticos? Se o próprio cidadão, que é o maior beneficiário (ou, sob outro ponto de vista, o prejudicado) pela representação de sua vontade na política, não se interessar por isso, quem irá se interessar?
Quando a República foi instalada no Brasil, houve a ampliação do conceito de “cidadão” (ainda excluindo os analfabetos, mulheres, etc), mas o voto ainda continuou indireto. Pelo menos até o final da década de 1940, os cidadãos brasileiros votavam primeiro nos vereadores e depois os mesmos elegiam um deles como prefeito. Isso se tornou mais complexo na Era Vargas, onde os interventores do estado nomeavam os prefeitos, já que as Câmaras Municipais tinham sido dissolvidas. Simplesmente, não havia eleições. Barretos foi um exemplo disso, já que na década de 30 foram nomeados onze prefeitos!
Logo, mesmo o povo não tendo tanta participação nas lutas pelas mudanças políticas do Brasil (Independência e República), a história republicana demonstra que a cidadania no Brasil galgou longos passos até chegar nas urnas de hoje. Por isso, o brasileiro deve refletir muito bem antes de “descartar” seu voto, que tanto demorou a ser conquistado. Brasileiro não tem que ser “apolítico”, deve antes colocar a política como uma ferramenta de transformação e representação. Refletemos.

100 ANOS DO GRUPO ESCOLAR



ARTIGO PUBLICADO PELA PROFª ESP. KARLA O. ARMANI, EM 30 DE SETEMBRO DE 2012 NO JORNAL "O DIÁRIO DE BARRETOS"   

           Neste 30 de setembro, mais um centenário a cidade de Barretos tem a comemorar. Os cem anos da Escola Estadual “Dr. Antonio Olympio”, antigo “1º Grupo Escolar de Barretos”, rememora a passagem da escola mais antiga da cidade que ainda está em atividade. De 1912 a 2012, certamente, muitos barretenses têm histórias a contar sobre a escola em sua longa trajetória que perpassou o século XX. Desde o tempo em que o Grupo Escolar possuia aquele belo prédio e até os dias de hoje, os barretenses guardam em sua memória experiências vividas ali, naquele histórico universo escolar.
            O “Grupo Escolar de Barretos” foi inaugurado em 30 de setembro de 1912, com o prédio exatamente no mesmo quarteirão onde ainda se situa. Aquele patrimônio foi doado pela Igreja para se construir o prédio do Grupo Escolar, um edifício de arquitetura neoclássica, que saltava os olhos de quem subia à rua 16. O prédio do Grupo Escolar foi construído pelo artista Pagani Fioravanti, que, ao longo de sua jornada por Barretos no início do século XX, foi o responsável pela edificação de nobres prédios da cidade. Sua arquitetura, de traços ornamentais e arcos nas belas janelas, era a prova da “modernidade republicana” que a instrução pública queria levar àquele recente lugararejo, que desde os anos 1900 fazia campanhas para o governo estadual inaugurar uma escola pública na cidade.
O belo prédio possuía uma arquitetura de forma achatada e baixa que, por isso, lhe rendeu o apelido de “Carrapatão”. Ali, a escola cresceu em número de alunos e classes, e até mesmo mudou de nome, em 1950, para Grupo Escolar “Dr. Antonio Olympio”. Mas, na década de 70, em nome de uma mentalidade “progressista” e “moderna” da época, o prédio do Grupo Escolar foi demolido. Sendo em 1974, inaugurado o novo prédio, com uma distinta proposta arquitetônica, que ainda hoje existe. Com a demolição, que recebeu críticas de uns e aprovações de outros, Barretos perdia um de seus primeiros patrimônios históricos.
Em 1912, quando foi inaugurado o 1º Grupo Escolar, este contava com sete a dez salas instaladas, sob a direção do sr. Sebastião Dias e depois do sr. Oscar de Mello Britto. Ao longo dos séculos XX e XXI, muitos professores e diretores passaram pela escola, além dos alunos que até hoje se orgulham em dizer: “Eu estudei no Grupo Escolar quando ele ainda possuia aquele belíssimo prédio”. Atualmente, a escola é dirigida pela sra. Amália Maria dos Santos Folgosi e possui 16 salas totais do Ensino Fundamental e Médio, além das salas do CEL (Centro de Estudos de Línguas) que também funciona na escola.
É uma felicidade para qualquer barretense dizer que sua cidade tem uma escola centenária e histórica! E que, mesmo não possuindo seu prédio antigo (o que é uma pena), ainda continua em atividade no mesmo local e formando alunos cidadãos através da rede pública. Á todos aqueles que passaram pela escola e ainda fazem parte da mesma, as nossas congratulações pelo centenário. Cem longos anos que Barretos tem a comemorar!

sábado, 29 de setembro de 2012

LENDAS GREGAS E AS ESTAÇÕES DO ANO

ARTIGO PUBLICADO NO JORNAL "O DIÁRIO DE BARRETOS" EM 25 DE SETEMBRO DE 2012 PELA PROFª KARLA O. ARMANI


            Nos últimos dias, um assunto em comum tomou conta do cotidiano das pessoas (principalmente as barretenses): o clima, o calor insuportável em pleno fim de inverno. E talvez nesta semana, este assunto ganhe ainda mais destaque. Isso porque, no último final de semana, se inicia a estação da Primavera no hemisfério sul, e o clima tende a sofrer ainda mais mudanças. A estação da primavera é considerada por muitos como o período mais bonito do ano por conta do florescimento das plantas, árvores e jardins. 
            Para nossa sociedade, onde poucas pessoas observam a beleza da natureza primaveril, isso pode passar despercebido. No entanto, na época da Grécia Antiga, quando tudo era explicado pelos mitos, os gregos sentiram necessidade de esclarecer a diferença de clima e de paisagem entre as estações de florescimento e fertilidade (primavera e verão) e aquelas de mais seca e frio (outono e inverno). Para os gregos, explicar a origem dos fenômenos da natureza era uma necessidade, aliás, era mais do que isso; fazia parte do próprio cotidiano grego, independente da casta social, falar a respeito de suas lendas. Mitos que sempre eram baseados nas histórias dos seus vários deuses e deusas. Naquela época, as lendas politeístas eram transmitidas pela tradição oral e isso só foi rompido a partir do nascimento da filosofia e da ciência, que substituíram as explicações míticas.
            Com a finalidade de entender a diferença entre as estações do ano, existia a lenda de “Deméter” (deusa do interior da terra, ligada à fertilidade do solo) e sua filha “Perséfone”. Contava-se que Hades (deus do mundo subterrâneo, “inferno”), buscando encontrar uma esposa, decidiu raptar Perséfone. Foi então que, Deméter, mãe de Perséfone, saiu a sua procura tanto no Olimpo (morada dos deuses) quanto na Terra. Por conta de não achar sua filha, Deméter ficou preocupada, irada e muito triste e tais sentimentos teriam causado uma seca prolongada, já que ela era a deusa da fertilidade do solo. Para tentar acalmá-la, Zeus (deus dos deuses) resolveu intervir e fez um trato com seu irmão Hades: Perséfone teria que passar seis meses do ano ao lado de Hades no mundo subterrâneo, e os outros seis ela estaria “liberada” para passar ao lado da mãe. Isso, para os gregos, explicaria a origem do inverno, ou seja, seria o período em que Perséfone estaria ao lado de Hades e sua mãe muito triste. Por outro lado, os seis meses de fertilidade e flores (primavera e verão) seria o tempo em que a moça passaria ao lado de sua mãe.
            Essa é uma das lendas gregas que serviam para explicar fenômenos da natureza, como, por exemplo, as quatro estações do ano. É muito interessante perceber o imaginário do povo grego da Antiguidade, onde a necessidade de explicar as coisas levou a construção de mitos que se perpetuaram ao longo do tempo. Mitos que não podem ser meramente considerados como “mentiras”, afinal eles eram construídos de acordo com a mentalidade, a cultura e a história daquela época. Logo, aprender mitologia grega é mais do que ler sobre lendas que podem parecer “estranhas”, é viajar no universo de uma das maiores civilizações da humanidade, a Grécia.

REPÚBLICA: UM TEMA PRESENTE


ARTIGO PUBLICADO NO JORNAL "O DIÁRIO DE BARRETOS" EM 16 DE SETEMBRO DE 2012 PELA PROFª KARLA O. ARMANI



            É impressionante como a República no Brasil no final do século XIX e início do XX tem sido um tema muito recorrente em peças de teatro, cinemas e televisão. Inclusive, na última semana, se iniciou mais uma novela “de época”, denominada “Lado a Lado” pela emissora Rede Globo. Já é perceptível que essa, como outras novelas passadas, trata de um romance fictício tendo como pano de fundo o cenário da capital do Brasil, o Rio de Janeiro, nos seus primeiros anos como sede da República brasileira.
            Por mais que a novela retrate uma narração fictícia, o cenário e a fotografia revelam o visual da época e isso que pode se tornar um atrativo para o estudo da História. A recente novela retrata vários aspectos do ano de 1903 e 1904, sobretudo da política, sociedade, economia e cultura da cidade carioca. Cada um em suas diferentes faces.
A política é demonstrada tanto pelo lado dos republicanos que subiram ao poder, quanto pelos políticos que decliniram por ficar ao lado da monarquia, muitos perderam status e dinheiro. A economia também é salientada pelas exportações de café que estavam a todo vapor naquela época, bem como as ferrovias que era o meio de locomoção do “ouro verde” brasileiro. A sociedade é o aspecto mais bem retratado na novela, por demonstrar, sobretudo, a desigualdade social daquele período, desde as posições sociais até as diferenças de trabalho, moradia e vestimentas. A cultura também se enquadra nesse fator de diferenciação, uma vez que há um grande afastamento entre a cultura popular (rodeada de tradições religiosas, africanidades e crenças) e a cultura erudita (regida pelos moldes franceses). Essa vertente cultural é o que deixa o diálogo “presente-passado” mais interessante. Afinal, aspectos que faziam parte da cultura popular naquela época, hoje já veiculam na elite da sociedade, como é o caso do carnaval. Por outro lado, hábitos da classe mais rica, como jogar “foot-ball”, atualmente é parte da cultura popular brasileira.   
Outras características importantes presentes na história da República brasileira e que são retratadas na novela são as pressões que a população marginalizada que vivia no centro Rio de Janeiro sofreu em nome da “modernização”. A antiga capital do Brasil, aos olhos da recém República, passava por reformas urbanas para se tornar o “cartão postal” do Brasil. Era como se o Rio de Janeiro se transformasse numa verdadeira “Paris”, com avenidas largas, iluminadas, ajardinadas e enfeitadas com belos palacetes dos barões do café e dos recentes industriais brasileiros. Mas, para isso se concretizar, era necessário “passar por cima” da população pobre que vivia nos cortiços do centro carioca. Além disso, também se encontrava a “preocupação” de higienizar a cidade, desinfectando locais insalubres e vacinando a população pobre, à força diga-se de passagem.
Foi neste cenário que nasceu a República no Brasil, pelo menos na capital. E é com olhares críticos e curiosos que podemos enxergá-la numa novela. Pensemos. 

OLIMPÍADAS DE HISTÓRIA DO BRASIL

ARTIGO PUBLICADO NO JORNAL "O DIÁRIO DE BARRETOS" EM 9 DE SETEMBRO DE 2012 PELA PROFª KARLA O. ARMANI


A internet, como um meio de comunicação eficaz e rico em informações, pode ser utilizada de maneiras positivas em prol da educação, em especial ao ensino de História. E é isso que vem acontecendo desde o dia 20 de agosto com a abertura da “4ª Olimpíada Nacional em História do Brasil” promovida pela Unicamp no Museu Exploratório de Ciências. De uma forma atraente e bastante consistente, a Olimpíada de História conseguiu ganhar a adesão de mais de 120 mil alunos e professores, que, juntos estudam uma nova proposta de História do Brasil.
A “Olimpíada Nacional em História do Brasil” conta a participação de alunos das escolas públicas e particulares de todos os estados do Brasil. Cada equipe é composta por três alunos e um professor orientador, tendo ainda uma identidade pois precisam ter um nome e uma imagem própria. A olimpíada é composta por seis fases, das quais cinco são online e a última é presencial, e cada fase tem um número determinado de questões de múltipla escolha e uma tarefa. Nesta edição, a olimpíada possui como tema e inspiração “Conflitos e embates em história”, o qual será utilizado como  tema de pesquisa para a história local. Assim, os alunos terão de pesquisar movimentos de resistências, conflitos e protestos dentro da história da própria cidade!
Exercícios como este fazem com que os alunos aprendam a pensar a história de modo diferenciado, como uma construção e não como uma disciplina estática. Aquela “velha” imagem da História como uma matéria de “decoreba” é completamente quebrada com os exercícios da olimpíada. Nesta, os alunos são convidados a refletir sobre determinados períodos da história do Brasil a partir de análises de documentos. Desta maneira, não há como responder as questões e tarefas com informações simplistas e decorativas. O atrativo da olimpíada está exatamente na leitura e análises dos documentos, que podem gerar respostas mais completas baseadas na interpretação dos documentos. É como se aluno se transformasse num “historiador”, pois passa a trabalhar diante das fontes históricas.
A variedade de documentos lançados pela olimpíada em cada questão é muito importante não só para o universo do aluno, que passa a perceber a construção da história através das fontes, mas também para o professor, que tem a chance de acumular materiais que poderão ser usadas nas salas de aulas, trabalhos e avaliações. A partir do momento que a olimpíada divulga estes documentos nas questões e os lugares (sites e livros) onde estão disponíveis, o aluno compreende como pode usar a internet e livros acadêmicos como fontes de estudos. Sobretudo, a disponibilização destes documentos evidencia a importância de preservá-los, bem como seus lugares de guarda (museus, bibliotecas, universidades), já que eles são a chave para se pesquisar o passado e dialogar com o presente.
Por esse e outros motivos, o curso de História da Unicamp e o Museu Exploratório de Ciências estão de parabéns pela bela iniciativa de renovar o estudo da história do Brasil! Que venham as novas edições!

INDEPENDÊNCIA DO BRASIL: A TRANSPARÊNCIA DE UM HERÓI


ARTIGO PUBLICADO NO JORNAL "O DIÁRIO DE BARRETOS" EM 2 DE SETEMBRO DE 2012 PELA PROFª KARLA O. ARMANI


Já raiou a liberdade
No horizonte do Brasil
(trecho do hino da Independência do Brasil)

            A frase acima revela como o episódio da “Independência do Brasil”, proclamada pelo Imperador Dom Pedro I, era visto como um ato que repercutiu na tão sonhada “liberdade” para o país. Por muito tempo, esta visão de “liberdade” trazida pela Independência esteve presente não só em melodias, mas também em desfiles, homenagens, biografias e até mesmo na sala de aula. Uma liberdade que sabemos que nunca existiu, mesmo após a Independência. Neste 7 de setembro que se aproxima, serão completados 190 anos do dia da Independência do Brasil. Por isso, seria interessante analisarmos este fato com os novos olhares da historiografia brasileira.
            Tempos atrás, muito se falava do dia da Independência, onde “no dia 7 de setembro de 1822, às margens do Rio Ipiranga, Dom Pedro I, teria bradado retumbante: Independência ou Morte!”. Este episódio até hoje é muito comentado e revisto pelos historiadores, não só por conta de ser o dia em que oficialmente houve o desenlace do Brasil de Portugal, mas por todas as fontes históricas que eternizaram este dia, como o quadro de Pedro Américo (que hoje se encontra no Museu do Ipiranga em São Paulo). Assim, além da idéia de “liberdade” ter sido atribuída ao ato de Pedro I, este ficou eternizado como um verdadeiro “herói” da nação. Visto que, trajado de vestimentas militares, empunhando uma espada diante àqueles que eram contra a emancipação do Brasil, e montado num cavalo branco, Pedro I pôs-se à frente de um conflito pelo Brasil.
            Esta idealização, na verdade, vinha até mesmo antes do “7 de setembro”, ela também era vista no famoso “Dia do Fico”. Uma vez que, Dom Pedro estava sendo pressionado pelos portugueses a retornar a Portugal, mas, ao receber um abaixo-assinado dos brasileiros teria decidido “a favor” do povo brasileiro dizendo: “Como é para o bem de todos e felicidade geral da nação, estou pronto. Diga ao povo que fico!”.  Logo, a sua imagem como o “salvador” do Brasil já estava sendo preparada para ficar à “história” e esta passagem foi reafirmada, mais uma vez, pelo hino da independência na seguinte passagem: Brava gente brasileira! Longe vá... temor servil: Ou ficar a pátria livre, ou morrer pelo Brasil”.
            Atualmente, versões como estas, em vez de serem “aclamadas” e “glorificadas” são analisadas por historiadores e professores como verdadeiros “documentos históricos” que demonstram a intencionalidade do governo brasileiro em transparecer a imagem de Dom Pedro como um “herói da pátria”. Não que ele fosse o herói, mas sim que foi intencionalmente transparecido como herói por uma ação política. E assim, caminhamos para uma nova história do Brasil, onde antes de valorizar personagens e fatos, valorizamos as fontes históricas como os quadros, os documentos e o hino da Independência.

25 DE AGOSTO: UMA DATA OFICIAL


ARTIGO PUBLICADO NO JORNAL "O DIÁRIO DE BARRETOS" EM 26 DE AGOSTO DE 2012 PELA PROFª KARLA O. ARMANI


            Não são todas as cidades que possuem uma data de fundação oficial, ainda mais com dia, mês e ano. Às vezes, algumas delas possuem o ano ou simplesmente a década que se originou o povoado. Barretos, possui sua data de fundação oficial baseada em um documento, que ficou caracterizado como a “certidão de nascimento” da cidade, mesmo sabendo que o pequeno arraial já estava se formando antes desta data. Mas, o “25 de agosto de 1854” não foi desde sempre considerado o “dia da cidade”...
            Foi na década de 1940 que o documento encontrado pelo ex-prefeito de Barretos, Jerônimo Serafim Barcellos, veio à tona e se transformou na “certidão de nascimento” da cidade. Tratava-se de um documento escrito por Antônio Leite de Moura, um dos poucos alfabetizados naquela época, em que as famílias de Francisco José Barreto (já falecido) e Simão Antonio Marques doavam o total 82 alqueires de terra ao “Divino Espírito Santo” para que se formasse um patrimônio e se edificasse uma capelinha. Foi assim que aquele pequeno povoado que ainda pertencia ao “Quarteirão de Jaboticabal” do “Termo da Vila de São Bento de Araraquara” aos poucos se transformou no “Arraial dos Barreto”. Este documento era datado de 25 de agosto de 1854 e, por registrar a doação de terras que deu origem à cidade, esta data ficou conhecida como o “Dia da Cidade”.
            Ruy Menezes, em seu livro “O Espiral: história do desenvolvimento de Barretos”, narrou que no começo dos anos 1940, após a descoberta de tal documento, a imprensa barretense já estava promovendo reportagens sobre a história da cidade a partir de biografias dos antepassados de Barretos. Foi então que ele teve a ideia da Acib promover a primeira festa de comemoração do “Dia da Cidade” no dia 25 de agosto daquele ano, 1943. Ou seja, o primeiro aniversário da cidade foi comemorado quando ela tinha 89 anos! Já em 1948, quando Ruy Menezes era vereador, ele apresentou à Câmara Municipal de Barretos um anteprojeto de lei que, depois de sancionado pelo prefeito João Ferreira Lopes, se transformou na lei municipal nº 268 de 18/8/1948, onde o dia “25 de agosto” tornava-se oficialmente o “Dia da Cidade” e feriado.
            A partir de então, todos “25 de agosto” dos anos que se sucederam foram comemorados em Barretos através de homenagens, desfiles cívicos, discursos, bandas, concursos e outros. Sendo válido lembrar a comemoração do “25 de agosto de 1954”, quando Barretos completou 100 anos, que, apesar dos preparativos e do lançamento do “Álbum Comemorativo do 1º Centenário de Barretos”, não resultou em grandes festividades devido ao suicídio do presidente Getúlio Vargas um dia antes.
            Assim sendo, Barretos possui sim uma data oficial de fundação, o que não quer dizer que a cidade surgiu exatamente naquele dia. Uma vez que, a região já vinha sendo povoada desde os idos de 1830 e a capela só foi eregida em 1856. Mas, é importante que essa data oficial seja comemorada e lembrada todos os anos para que as gerações futuras não se percam da origem da cidade, dos patriarcas e até mesmo da própria história do “25 de agosto”.
            Parabéns Barretos!

Referências: Ruy Menezes, 1985, p. 30-34 / TCC de Priscila V. Trucullo, 2011, Unesp.

UM MONUMENTO HISTÓRICO

ARTIGO PUBLICADO NO JORNAL "O DIÁRIO DE BARRETOS" EM 19 DE AGOSTO DE 2012 PELA PROFª KARLA O. ARMANI


            Há quem se lembre em Barretos de um antigo busto que ficava na Praça Francisco Barreto próximo à catedral. Este monumento, além dos símbolos inscritos em si próprio, possui interessantes passagens que fizeram parte da história da cidade. Como todo monumento, ele foi retratado com um propósito para ficar à posteridade, como um símbolo de algo que era valorizado na época em que foi criado e que representava uma dada ideologia. Os monumentos geralmente são criados para eternizar certas passagens da história e, por esse motivo e pelas reflexões que podem ocasionar, deveriam ser sempre preservados. Esta preservação não é somente uma questão de respeito com o passado, mas é também a construção da nossa própria história, daquilo que foi vivido pelos antepassados e que hoje ainda se mantém. Trata-se da aceitação da nossa própria memória.
            Muitas pessoas na cidade ainda pensam que o busto que ficava na praça central era a representação da Princesa Isabel de Órleans e Bragança, aquela que assinou a lei de libertação dos escravos. Talvez pela aparência e pela significação dessa princesa na história do Brasil, a informação de que o busto era de Isabel passou de geração em geração. Quando na verdade, o que aquele símbolo representava era justamente o contrário do que uma figura monárquica, era a encarnação da República!
            A República foi representada por uma figura feminina desde os tempos da Revolução Francesa no final do século XVIII. Para representar o governo contrário a monarquia (representada geralmente por homens/reis), a figura feminina chamada de “Marianne” foi usada como símbolo da República por vários países, inclusive o Brasil. Este, cem anos depois da Revolução Francesa, em 1889, proclamou a República como novo sistema político do país e a partir de então a representação da República sempre era a de uma mulher. Tal como o busto que ficava no praça Francisco Barreto.
            Era o ano de 1922 quando o busto foi colocado na praça em Barretos, no governo municipal do dr. Antonio Olympio. A ocasião era o “Centenário da Independência do Brasil” (1822-1922) e para tal homenagem foi colocado o busto da República. Um tanto contraditório não é mesmo?! Afinal, a independência do Brasil representou nada mais do que a instalação da monarquia no Brasil, e o busto simbolizava justamente o contrário. Pois, além de demonstrar a figura feminina da República (Marianne), possuía também em sua imagem um barrete frígio (touca utilizada pelos revolucionários franceses), o lema republicano brasileiro “Ordem e Progresso”, a figura de um homem se libertando das algemas e o rosto de Tiradentes (tido como o herói da nação nos tempos da República).    
              No mesmo ano em que o busto foi colocado na praça, uma réplica foi instalada no salão principal do Paço Municipal (hoje Museu “Ruy Menezes”). Até hoje esta réplica se encontra no museu, assim como o busto que foi retirado da praça, mas que infelizmente não está em perfeitas condições. Um símbolo que mais queria demonstrar que Barretos era uma cidade “moderna” por ser partidária dos ideias republicanos, do que comemorar a independência do Brasil. Tantas histórias num único monumento... Apreciemos.

Referências: Doutorado de H. Perinelli Neto (2009), e artigo de Ruy Menezes (1992).

BARRETOS E MINAS

ARTIGO PUBLICADO NO JORNAL "O DIÁRIO DE BARRETOS" EM 12 DE AGOSTO DE 2012 PELA PROFª KARLA O. ARMANI


            O mês de agosto já chegou e então a procura por vestígios da história da cidade começa a aparecer. Neste momento, muitos educadores e pesquisadores de comunicação social começam a publicar textos sobre a história de Barretos, principalmente no que diz respeito à origem da cidade. É neste ponto que Chico Barreto e toda a herança mineira que nos foi legada vem à tona. Muito se ouve por aí, que Barretos parece pertencer mais ao estado de Minas Gerais do que de São Paulo, seja pela localização geográfica, ou pelo fato de nosso fundador ter saído de lá ou ainda pelo “jeitinho” de falar.
Toda a tradição vinda de Minas Gerais que se proliferou em Barretos foi originada ainda nos tempos da formação do arraial. Sabemos que a maioria das pessoas que vivia aqui, naquele meados do século oitocentista, era oriunda do canto sul de Minas Gerais. Falando das cidades do interior paulista no geral, a vida naquele tempo era pautada no ambiente rural, onde as pessoas viviam mais nas fazendas do que na “cidade”. Assim, as primeiras aglomerações que se formavam eram resultado da necessidade da produção de certos recursos de sobrevivência que não tinham como ser vendidos nas fazendas.
É neste ponto que o comércio entra como principal atividade econômica destas pequenas vilas, pois era ali que as pessoas faziam compras, se socializavam nos finais de semana, íam às missas e etc. Estes locais de comércio conhecidos como “empórios” ou “armazéns” eram construídos para abrigar o comércio e a moradia do proprietário. Geralmente, as paredes eram de taipa de pilão e o telhado de duas águas, sendo esse tipo de construção uma tradição das antigas construções de Minas Gerais. Na parte da frente, sempre com muitas portas, se abrigava o comércio de vários tipos, como por exemplo: tecidos, alimentos, ferramentas, bebidas, mantimentos ou ainda artigos de couro e luxo. Já na parte central e traseira destas construções, ficava a moradia da família do proprietário; hábito que passou a mudar tempos depois, quando as atividades comerciais começaram a ser desenvolver mais e exigir espaços próprios.
               Essas construções, que eram praticamente comum em todas as cidades interioranas, compunham o cenário dos primeiros arraiais. Através delas se desenvolveram as atividades comerciais e o estabelecimento de profissionais liberais como os sapateiros, serralheiros, boticários, médicos, advogados, professores e tantos outros. Mesmo com as ruas ainda de terra ou macadame, essas casas comerciais eram o que tinha de mais moderno naquele tempo do século XIX. E hoje, o mais interessante é que, mesmo um tanto escondidas e alteradas, construções desta época ainda podem ser vistas na cidade. Quem nunca andou pelas ruas do centro, e até em bairros próximos, e não avistou construções antigas com várias portas de madeira? A história está diante nossos olhos, basta querer enxergá-la! Aproveite o mês de agosto e reflita sobre isso.

Referência: “A história contada através da arquitetura de uma rua”, Eder D. da Silva.

A LONGA DURAÇÃO DA IDADE MÉDIA

ARTIGO PUBLICADO NO JORNAL "O DIÁRIO DE BARRETOS" EM 5 DE AGOSTO DE 2012 PELA PROFª KARLA O. ARMANI


            Na escola, quando se estuda História, desde o ensino fundamental ao médio, é muito comum as pessoas associarem a “História” com a “Idade Média”. É como se todo o período que a História estuda, da Pré-História à Idade Contemporânea, se resumisse no tempo medieval, afinal o que as pessoas mais se lembram são: “senhores feudais”, “castelos”, “servos” e “guerras”. É interessante notar como um período que acabou há quase seis séculos ainda fica marcado na mente dos indivíduos, talvez porque algumas manifestações culturais daquela época ainda fazem parte da mentalidade ocidental.
            “Falar em feudalismo implica falar de castelos, cavaleiros, senhores feudais, vassalos, cruzadas e rebeliões. Implica falar da guerra e do exercício de poder através da ‘lei do mais forte’ - além de falar de heróis, cavaleiros de armaduras reluzentes empenhados em salvar os fracos e oprimidos ou resgatar donzelas de castelos encantados e salvá-las de... dragões” (Rezende, 1998, p.3). Esse fragmento nos demonstra o quão “mágica” a Idade Média pode ser apresentada aos alunos, como um período que saiu dos contos de fadas infantis e de repente se transformou em matéria de estudo para a disciplina de História.
            O tempo medieval na verdade foi caracterizado por muitas guerras, disputa de poder e uma mentalidade extramamente religiosa e temente a Deus. Do século V ao XV, a Europa passou um período de ruralização, escassa atividade comercial, descentralização administrativa e predominância da religião na vida cotidiana e cultural. Essas caracterítiscas, quando estudadas na Idade Moderna (século XV ao XVIII), foram consideradas “atrasadas”, como um período de “trevas”. Por esse motivo, o longo período entre 476 e 1453 foi visto como aquele que estaria no “meio” entre as “prósperas” idades Antiga e Moderna, onde as cidades e o comércio foram as principais atividades econômicas, diferente do “regresso” que teria sido a Idade “Média”.
            Nos tempos atuais, o ensino da “Idade Média” não pensa dessa forma, afinal cada época tem que ser analisada com os “olhos” da época. Assim, o “Medievo” é estudado como um tempo que teve sua política, economia, sociedade, cultura, tecnologia e mentalidade própria. Além disso, também são dignas de nota as manifestações culturais desta época que se predominam no tempo presente, como tradições de longa duração. Como por exemplo, as festas juninas, o carnaval, o natal, o 1º de janeiro e até as superstições. Enfim, por motivos como estes que a Idade Média é tão relembrada pelas pessoas e, as vezes, confundida com a própria História. 
            

HISTÓRIA NA NET

ARTIGO PUBLICADO NO JORNAL "O DIÁRIO DE BARRETOS" EM 29 DE JULHO DE 2012 PELA PROFª KARLA O. ARMANI


            A História é uma ciência que estuda o homem em sociedade ao longo do tempo através de vestígios que restaram do passado. Exatamente por estudar o “homem”, ela pode estar presente no cotidiano das pessoas, uma vez que todos nós somos sujeitos históricos e estamos inseridos nos tempos passado, presente e futuro. Assim, falar de história não é só falar dos “fatos marcantes”, das nações ou de seus personagens políticos, é também refletir sobre a nossa vida e como ela pode se relacionar com os acontecimentos da cidade, do país e do mundo. Como vivemos em sociedade e compartilhamos de experiências em comum, é formada entre nós uma “memória coletiva”, uma identidade. Esta memória é sempre relembrada pelas pessoas e pode se tornar um assunto interessante, divertido e instigante, inclusive pela internet.
            Nos tempos atuais, a vida está cada dia mais ligada à internet, principalmente às redes sociais. O hábito de conversar na calçada de casa com os vizinhos, na roda de amigos em um bar ou até nas praças públicas, cada vez mais perde para os “chats” das redes sociais. A internet, bem ou mal, disponibiliza conversas on-line, adição de amigos virtuais e compartilhamento de textos, vídeos e fotografias. E é neste ponto que a História tem sido muito discutida na atualidade.
            É como se estivesse na “moda” falar de História (um fenômeno), em especial às histórias de vida que as pessoas (ou grupo de pessoas) de uma cidade, empresa ou bairro possuem em comum. Geralmente, as “conversas” em que as pessoas dividem suas experiências são registradas em blogs ou grupos montados em redes sociais. Nestes espaços, os indíviduos compartilham suas lembranças através de depoimentos escritos e fotografias digitalizadas.
            É interessante analisar este fenômeno notadamente por conta da fotografia. Desde o princípio da evolução humana, a sociedade sempre foi muito ligada à imagem, fosse por desenhos em cavernas, tabuletas de argila, papiros, esculturas, livros ou fotografias. Na época atual, a imagem está em grande evidência, uma vez que a mídia de televisão, jornal, publicidade e outras cada vez mais a utiliza como atrativo. Deste modo, dentro do fenômeno das redes sociais sobre História, as fotografias antigas também estão em destaque, uma vez que as pessoas as compartilham na intenção de recordarem sobre determinados acontecimentos do passado. Isso acontece porque a imagem pode informar sobre detalhes que, muitas vezes, as palavras não conseguem alcançar. Esta disponibilidade de imagens e depoimentos é muito importante à História, bem como aos historiadores, porque além de ajudar nas pesquisas históricas, auxilia também na valorização e preservação das fontes históricas.
            Este fenômeno da internet diante à História, que cada vez mais atinge várias cidades da região, inclusive Barretos, demonstra ao poder público e à sociedade em geral que as pessoas se preocupam SIM com sua história e memória. É perceptível a satisfação e a alegria de muitos cidadãos em declararem suas lembraças e informarem sobre lugares de memória e personagens do passado que não existem mais. Que isto sirva como exemplo ao poder público de como o povo gosta de sua história e a quer preservar. Afinal, um povo sem história não é mesmo nem um povo!