quarta-feira, 26 de dezembro de 2018

MUSEUS E CULTURA: O QUE ESPERAR?


ARTIGO PUBLICADO NO JORNAL "O DIÁRIO DE BARRETOS" EM 25 DE DEZEMBRO DE 2018 (página 2) PELA PROFª KARLA ARMANI 
    

            2018, ano tenso, polêmico e desafiador para o Brasil, principalmente devido as eleições. A qualquer custo, polêmicas e debates foram levantados nas redes sociais, fosse entre especialistas ou simples opinantes. Tudo era motivo de discussão: partido político, poder judiciário, Congresso Nacional, corrupção, greve dos caminhoneiros, merenda escolar, emigração venezuelana, etc. Enfim, tudo. (Ou melhor, quase tudo).
Incêndio no Museu Nacional no dia 2 de setembro de 2018
(Fotografia do site do jornal "El País")
            Pouco se falou sobre “cultura”. E dentro deste pouco, a generalização foi dada à “Lei Rouanet”. Entre posts mais polêmicos, o que se via eram comentários sobre fraudes e corrupções nesta lei, além de ataques violentos à classe artística (como se fossem eles os culpados). Como se a Lei Rouanet fosse o único problema e assunto exclusivo na pasta da “Cultura”. Pouco (ou nada) se viu ou se falou sobre literatura, cinema, teatro, dança, artes plásticas e as outras tantas linguagens culturais. Menos ainda sobre museus, arquivos e história. (Somente no trágico incêndio do Museu Nacional no Rio de Janeiro).
            Pelo menos naquele momento, o tenebroso incêndio no Museu Nacional talvez tenha levantado questionamentos na imprensa sobre a real situação dos museus no Brasil. Mas isso não foi o suficiente, pois segurança e estrutura não são os únicos problemas que os “templos históricos” enfrentam. É só olhar para nossa região – o interior paulista – e observar quantos museus estão fechados ou funcionando inadequadamente: com quadro reduzido de funcionários (alguns sem qualificação), sem limpeza e higienização, sem reserva técnica, sem estrutura de arquivo e com horários limitados de atendimento (isso quando os telefones funcionam), sem projetos educacionais e digitalização de acervo.
            Se os governos municipais, muitos esgotados em dívidas, não conseguem melhorar tal situação, o governo estadual tão pouco. Agora, com a possível extinção do Ministério da Cultura, a dúvida é: o que esperar de melhora neste setor no Brasil? Somente a esperança de que as pessoas e os governantes entendam que cultura também alimenta. Nutre. Educa. Não só o cérebro; assim como a economia.
          
Link da publicação no jornal O Diário:
http://www.odiarioonline.com.br/noticia/80406/MUSEUS-E-CULTURA-O-QUE-ESPERAR

sábado, 22 de dezembro de 2018

RELÓGIO DA MATRIZ: O REGULADOR PÚBLICO

ARTIGO PUBLICADO NO JORNAL "O DIÁRIO DE BARRETOS" EM 19 DE DEZEMBRO DE 2018 (página 2) PELA PROFª KARLA ARMANI 


Praça da Matriz nos anos 1920, quando o relógio ainda 
não existia na torre da matriz.
(Fonte: Arquivo do Museu "Ruy Menezes")
 “Hoje as nossas ruas, posto que não sejam calçadas, estão regularmente decentes: vemos os largos principaes – da Republica e Matriz, symetricamente arborizados com abundancia d’agua [...]. Entretanto, força é confessar, ressentimos ainda dum melhoramento, que é inadiável [...]. Referimo-nos a um bom Regulador Público, que, como em toda a communhão  social, se encontra no fontisfício da egreja principal”.
(“O Sertanejo”, 4 de outubro de 1906, p. 2).

            Era o ano de 1906 quando o jornal “O Sertanejo”, com edição de Mário de Oliveira e redação de Elias Pimenta, publicou esta reportagem vislumbrando a instalação de um relógio na torre da matriz de Barretos; hoje catedral. “Inadiável”, segundo seus dizeres. Mal sabiam eles, que tal “melhoramento” demoraria vinte anos para acontecer. Já que fotografias e a obra “Coração de Barretos” (J. P. Lombardi), deixam claro que o relógio só foi instalado numa das torres da igreja entre 1926 a 1928. 20 anos depois!

            Mais do que a demora da instalação do relógio em relação ao texto de 1906, o intrigante é como o mesmo era tido como necessário: “Um regulador publico no centro duma cidade, é o thermometro que encaminha os operários para a atividade do trabalho. Não é tudo: marca as horas das refeições, ensina o espaço de tempo prescripto pelo medico para um pobre que não tem relógio dar remédio a um doente; guia o roceiro da hora em que chegou a cidade e o orienta daquela em que deve regressar a seu lar”, p. 2.

Matriz de Barretos com o relógio Michellini já instalado.
(Fonte: Arquivo do Museu "Ruy Menezes").
            Naquela época, Barretos não tinha energia elétrica, nem estação ferroviária, o paço municipal ainda estava em construção e o serviço de água era deveras polêmico. Por outro lado, a pecuária fazia girar o comércio, médicos, professores e advogados já se viam por aqui, assim como casas comerciais e instituições de diversas naturezas. E, por isso, o belo relógio Michelini ali instalado na década de 20 não representava tão somente a passagem das horas e o badalar do sino; era ele o símbolo do tempo da “urbanidade”, o anúncio de “civilização” para aquela cidade que se “despia de suas vestes sertanejas”

Fonte:
O SERTANEJO, jornal hebdomadário de Barretos, ano 1906. Arquivo do Museu "Ruy Menezes".

Link da publicação no jornal "O Diário": 
http://www.odiarioonline.com.br/noticia/80250/RELOGIO-DA-MATRIZ-O-REGULADOR-PUBLICO

terça-feira, 11 de dezembro de 2018

VALDOMIRO SILVEIRA, O CONTISTA REGIONAL (PARTE II)

ARTIGO PUBLICADO PELA PROFª KARLA O. ARMANI NO JORNAL "O DIÁRIO DE BARRETOS" EM 11 DE DEZEMBRO DE 2018, PÁGINA 2.


            O primeiro conto do regionalista Valdomiro Silveira foi publicado num jornal de Casa Branca, aos 14 anos. Somente em 1920, publicou seu primeiro livro “Os Caboclos”; seguido por “Nas Serras e nas Furnas” (1931), “Mixuangos” (1937) e “Leréias: histórias contadas por eles mesmos” (1945, obra póstuma). Conforme seus contemporâneos, parte dos contos era publicada em jornais do interior. O nosso “O Sertanejo” foi um deles, já que não só de política tratava o jornal barretense, literatura era também constante por ali.
            Em 1903, quando fazia somente dois meses que a direção do jornal “O Sertanejo” tinha sido transferida do Cel. Silvestre de Lima para o dr. Antônio Olympio (ambos republicanos, mas com posições e lideranças diferentes), os contos de Valdomiro começaram a ser reproduzidos no jornal. Nos meses de maio e agosto, o jornal “O Sertanejo” publicou os contos “Ao correr das águas”, “Com deus e as almas” e “Truque”.
            Não há como não ler seus contos no jornal, visto a linguagem ser tão fidedigna às expressões da época. Chama a atenção. É envolvente a leitura. Nos três contos, os narradores são de alguma maneira relacionados ao passado, os personagens pertencentes ao mundo rural e caipira, e o cenário relacionado à natureza, rios, ribanceiras, matas, pousos e estradas. O conto “Com deus e as almas”, por exemplo, é tão real ao falar dos tropeiros, que chega a citar pousos em cidades, distritos e fazendas perto de nossa cidade, como “Franca”, “Olhos D’Agua” e “Estiva”. Esta habilidade em reproduzir a fala e o universo do caipira, segundo uma obra da filha de Valdomiro – Júnia Silveira Gonçalves – foi adquirida em anotações que seu pai fazia em festas populares e quermesses, as quais participava enquanto vivia no interior de São Paulo, quando fora promotor público.
O fato de reproduzir a oralidade caipira de forma literária, tornou-a passível de estudo e cientificidade. Criou uma memória caipira original, pertencente a identidade regionalista de São Paulo, e ao mesmo tempo, verteu o olhar para o caipira sem estigma. Eternizou a oralidade caipira para o futuro. E cá estamos, estudando-a. [fim].

Fontes:
O SERTANEJO, periódico hebdomadário de Barretos. Edições entre maio a agosto de 1903. Acervo do Museu "Ruy Menezes".

Link da publicação no jornal "O Diário":
http://www.odiarioonline.com.br/noticia/80041/VALDOMIRO-SILVEIRA-O-CONTISTA-REGIONAL-PARTE-II

quarta-feira, 5 de dezembro de 2018

VALDOMIRO SILVEIRA, O CONTISTA REGIONAL (PARTE I)

ARTIGO PUBLICADO PELA PROFª KARLA O. ARMANI NO JORNAL "O DIÁRIO DE BARRETOS" EM 05 DE DEZEMBRO DE 2018


Valdomiro Silveira
(foto do site "uol")
            Republicano e partidário, “O Sertanejo” - primeiro jornal de Barretos -, nascia no ano de 1900 como uma folha que noticiava, sobretudo, política; os sonhos e as desilusões da jovem República que se anunciava no Brasil desde 1889. Entre algumas notas sociais sobre eventos, viagens, nascimentos, casamentos, funerais, quermesses e visitantes ilustres, vez ou outra, o jornal publicava alguns folhetins literários.
            Dentre os literatos ali citados, um desperta a atenção por sua particularidade: a linguagem caipira. Sua escrita reproduzia a oralidade do caipira, junto com seus personagens e o universo rural. Chamava-se Valdomiro Silveira. Ao pesquisar o nome de tal contista na atualidade, é notada a grandeza de seu trabalho literário ao legado paulista.
            Nascido em Cachoeira Paulista, em 1873, Valdomiro passou sua infância no interior, mas formou-se em 1895 em Direito na Faculdade do Largo São Francisco na capital, conforme a maioria dos intelectuais letrados da época. Conta a historiadora Célia R. da Silveira, em seu mestrado (1997), que ao cursar a faculdade, o distanciamento do mundo rural permitiu que o contista passasse a enxerga-lo com nostalgia e sentimento. Características ímpares de sua literatura. Aliás, Silveira pertencia a uma geração de autores nacionalistas – literatos, historiadores e antropólogos – que escrevia a fim de elaborar uma identidade cultural ao paulista. Identidade esta, a qual em tempos remotos era associada aos “heróis bandeirantes”, mas que naquele alvorecer do século XX, tendia a outro personagem igualmente rural e desbravador da natureza: o caipira.
            Contudo, de todos os autores, Valdomiro Silveira se diferenciava por colocar o “caipira” como personagem autêntico, com feição de brasilidade. Isso não se evidenciava somente pela descrição da fala original caipira, mas também pela recriação poética do universo rural; que naquele período tornava-se “obscuro” pelos traços iniciais da economia de mercado e urbanização. Era assim que, em seus contos, Valdomiro evidenciava o passado como um tempo melhor que o presente. [continua].

Fontes e bibliografia:
O SERTANEJO, periódico de Barretos. Edições de 3/5/1903, 17/5/1903 e 23/8/1903. Acervo do Museu "Ruy Menezes".
JORNAL O LINCE (site). Artigo: SILVEIRA, Célia Regina. "A epopeia caipira em Valdomiro Silveira". 

Link no site do jornal "O Diário": 
http://www.odiarioonline.com.br/noticia/79868/VALDOMIRO-SILVEIRA-O-CONTISTA-REGIONAL-PARTE-I