terça-feira, 27 de outubro de 2020

“POR TRÁS DA ESTANTE”

 ARTIGO PUBLICADO NO JORNAL "O DIÁRIO DE BARRETOS" EM 27 DE OUTUBRO DE 2020 (página 2) PELA PROFª KARLA ARMANI MEDEIROS  

Livro "Por trás da estante: Histórias da Meia-Noite
de Machado de Assis", de Vizette Priscila Seidel.

(Autor da capa e imagem: Guilherme Silveira).
    Vizette Priscila Seidel, que por anos foi professora de língua portuguesa e francesa em Barretos, acaba de lançar seu livro: “Por trás da estante: Histórias da Meia-Noite de Machado de Assis”. Obra de origem acadêmica, fruto de intensas pesquisas na Literatura brasileira e na história cultural, revela uma fase inicial de Machado de Assis. 
    A autora analisou a coletânea “Histórias da Meia-Noite” de Machado de Assis, publicada em 1873, pela editora do francês Baptiste-Louis Garnier. Mesmo editor do “Jornal das Famílias”, periódico carioca em que Machado publicou 21 contos de 1870 a 1873, selecionando 6 deles para a coletânea. Mesmo, na “Advertência”, Machado dizendo que as páginas de seu livro eram “desambiciosas”, Vizette produziu um rico estudo provando que, na realidade, ao selecionar 6 contos e excluir outros 15, o autor tinha um projeto de edição do livro. O escritor fluminense ali traçou o início de um projeto estético-literário antirromântico, utilizando, no entanto, temas e diálogos com os escritores românticos do período. Tal projeto foi refinado nos anos seguintes. 
    Neste período do Romantismo no Brasil, desde a fase indianista, os escritores eram pressionados a escrever ressaltando o exotismo, a cor local, a fauna e flora – características que tinham a intenção de ferventar uma identidade nacional; apesar de oriundas das escolas literárias francesas. No entanto, Machado de Assis, (como sempre), enxergava que a literatura brasileira não se limitava a isso, necessitando expor as questões sociais e a diversidade cultural. Para tanto, nos contos de “Histórias da Meia-Noite”, retratou os temas prezados pelos românticos, todavia, em contraponto, usou de forma sútil o recurso da ironia, da galhofa e até da sátira. 
    O mérito da obra de Vizette Priscila está em analisar criteriosamente os contos selecionados, bem como os contos exclusos, nos mostrando que na obra machadiana nada é por acaso. Por trás da estante houve projeto de edição, ambição, critério, ironia, diálogo e, claro, a genialidade de Machado.

terça-feira, 20 de outubro de 2020

DR. PAMPLONA

 ARTIGO PUBLICADO NO JORNAL "O DIÁRIO DE BARRETOS" EM 20 DE OUTUBRO DE 2020 (página 2) PELA PROFª KARLA ARMANI MEDEIROS  

Médicos e enfermeiros da Santa Casa de Barretos
no ano de sua inauguração, 1921.
O dr. Henrique Pamplona de Menezes, 1º diretor clínico,
é o que está sentado ao centro dos demais médicos.

(Fonte da imagem: Arquivo da Santa Casa de Misericórdia de Barretos).

            Dia 18 de outubro foi comemorado o “dia do médico”. Uma categoria profissional que, em Barretos, sempre se destacou pela participação no desenvolvimento da cidade e na vida política e social. E assim foi desde o início.

Barretos no início do século XX, apesar de isolada e pequena, era uma localidade atraente a novos moradores, essencialmente a profissionais liberais que enxergavam na economia pecuária e seu comércio uma oportunidade de viabilizar carreira. Deste modo, desde 1900, médicos recém formados se estabeleceram na cidade; nem sempre atendendo em clínica, e sim em domicílio, hotel ou pensão. Isso porque foi somente em 1912 que a cidade ganhou seu primeiro hospital, a Casa de Caridade, através da Sociedade Espírita “25 de dezembro”. Esse primitivo hospital, comandado pelo dr. Raymundo Mariano Dias, contava com 7 médicos e funcionou até pouco tempo antes da inauguração da Santa Casa de Misericórdia, em 1921. Um dos médicos da Casa de Caridade tornou-se o primeiro diretor clínico da Santa Casa, e por lá atuou durante toda a década de 1920. Chamava-se Henrique Pamplona de Menezes.

Conhecido como “dr. Pamplona”, era formado pela Faculdade de Medicina do Rio de Janeiro, em 1884, e quando veio a Barretos, nos anos 1910, já era um médico experiente. Ainda na faculdade, defendeu a tese intitulada “Operação Cesariana” – um assunto novo à época - assim como os trabalhos: “Opio”, “Da febre” e “Parallelo entre a talha e a lithotricia”. Pelas pesquisas, vê-se que, na Santa Casa, ele atuou de forma enérgica na transformação do espaço, que tinha um forte cunho religioso, em um ambiente médico, regido pelos padrões da ciência, higienismo e asseio. Sua atuação foi de fato pela saúde pública. Recebia agentes da saúde pública e privada brasileira na Santa Casa, assim como os diversos visitantes ilustres, e preocupou-se em viabilizar à cidade o hospital que daqui há alguns meses comemorará 100 anos.

Ao dr. Pamplona, uma homenagem pelo Dia do Médico.

REFERÊNCIA BIBLIOGRÁFICA:

ARMANI, Karla O. Caridade e Ciência: sociabilidade e poder na Santa Casa de Misericórdia de Barretos. Trabalho de Conclusão de Curso de Pós Graduação em História, Cultura e Sociedade. Ribeirão Preto: Centro Universitário Barão de Mauá, 2012.

quarta-feira, 14 de outubro de 2020

A PERSISTÊNCIA DOS PROFESSORES

ARTIGO PUBLICADO NO JORNAL "O DIÁRIO DE BARRETOS" EM 14 DE OUTUBRO DE 2020 (página 2) PELA PROFª KARLA ARMANI MEDEIROS 

          

Escola Municipal em Barretos no ano de 1909,
antes de existir o ensino primário obrigatório e gratuito.

Fonte: Arquivo do Grêmio Literário e Recreativo de Barretos.


  Na semana do “dia do professor”, as mais belas homenagens são rendidas a esta classe primordial no desenvolvimento do país. E talvez a justificativa para tanto não esteja somente na memória afetiva dos alunos, mas na capacidade dos professores em acreditar na Educação e lutar pelas melhorias do ensino, independente da época e lugar.

            Quando um historiador entrevista pessoas mais velhas, geralmente, encontra-se um ponto em comum entre as falas (independente do gênero e da localidade): o estudo restrito à alfabetização inicial e ao ensino primário. São poucas as pessoas que até os anos 1940 e 1950 conseguiam avançar para o ginasial e concluir as etapas da escola.

No entanto, imaginem como era o trabalho dos professores quando nem ensino primário existia? No caso de Barretos, o ensino primário obrigatório e gratuito ocorreu a partir de 1912 com a inauguração do 1º Grupo Escolar. Antes disso, existiam as “escolas isoladas”, que, além de não atenderem a todas as crianças, enfrentavam uma série de dificuldades estruturais e a falta de apoio dos pais e de autoridades locais. Um exemplo disso é a carta da Profª Laurinda Escobar de 1890, em Barretos, analisada na tese de doutorado do Profº Humberto Perinelli Neto, que assim exclamava: “Esta escola até ao presente nenhum auxilio mereceu, não obstante o vivo interesse que por ella tenho tomado; [...]. Lutando com a falta de cômodos e condições pedagógicas apropriados ao emprego dos mettodos modernos, [...] , lamento que ate o presente não tenha baixado um luminoso decreto, tornando o ensino primário obrigatório. Este palpitante melhoramento ansiosamente almejado pelo Professorado todo, ávido por ver coroado seus árduos esforços do mais feliz êxito, alem de arrancar a nossa sociedade deste estado enervado em que se acha, vem rodear de prestigio aquella infeliz classe, que actualmente só tem deveres a cumprir sem o mínimo direito a alegar”.

Interessante como no distante século XIX, a figura do professor já era presente e persistente nos desígnios da Educação. Viva essa persistência!


Fonte:

PERINELLI NETO, Humberto. Nos quintais do Brasil: homens, pecuária, complexo cafeeiro e modernidade - Barretos (1854-1931). -Franca: UNESP, 2009 (tese de Doutoramento em História).

terça-feira, 6 de outubro de 2020

CONCURSOS DE ROBUSTEZ INFANTIL

ARTIGO PUBLICADO NO JORNAL "O DIÁRIO DE BARRETOS" EM 6 DE OUTUBRO DE 2020 (página 2) PELA PROFª KARLA ARMANI MEDEIROS

          

Crianças se apresentando em concurso de
 robustez infantil em Barretos - ano de 1937.

Fonte: Arquivo iconográfico do Museu "Ruy Menezes".

  O Dia das Crianças, 12/10, se aproxima e é interessante voltar no tempo para conhecer um evento recorrente: os antigos concursos de “robustez infantil”.

            Era 1902, quando surgiu o primeiro concurso de “robustez infantil” no Brasil, organizado pelo médico Arthur Moncorvo Filho, com o objetivo de incentivar o aleitamento materno. De lá até metade do século XX, os concursos foram realizados por instituições de diversas naturezas, considerando a saúde e o vigor das crianças. Para tal, eram avaliados a idade, peso, altura, dentição, higiene e desenvolvimento, a fim de se estimular os cuidados e asseios com os pequenos e a relação com os pais. Inclusive, os concursos eram patrocinados por empresas das cidades e ofertavam prêmios às mães das crianças vencedoras. Embora fosse este o discurso principal, principalmente nas instituições médicas e de puericultura, é claro que tais concursos eram alinhados às políticas de governo em certas épocas, uma vez que a criação de indivíduos saudáveis repercutia num excelente cenário nacional.

            Em Barretos, especialmente durante o período do “Estado-Novo” do presidente Vargas, no início dos anos 1940, foram organizados anuais concursos de robustez infantil em datas como o “dia da criança” e “Natal”. As instituições que mais aparecem na imprensa da época organizando tais concursos foram o “Rotary Clube de Barretos”, a “Legião Brasileira de Assistência” e a “Associação de Assistência à Maternidade e à Infância”. Esta, criada em 1942, promovia concursos de robustez infantil voltados às crianças matriculadas em seu lactário; um público carente, cujas mães também recebiam orientações no Posto de Puericultura da mesma instituição. Os concursos tanto do Rotary quanto da AAMI dividiam-se entre categorias de idades e tinham a participação de médicos da cidade como selecionadores. A premiação acontecia nos salões do Grêmio Literário com entrega de brinquedos a todas as crianças.

            O olhar sobre as crianças é também objeto de estudo da História.

Fontes:

FREIRE, Maria Martha de Luna; LEONY, Vinícius da Silva. A caridade científica: Moncorvo Filho e o Instituto de Proteção e Assistência à Infância do Rio de Janeiro (1899-1930). Hist. cienc. saude-Manguinhos,  Rio de Janeiro ,  v. 18, supl. 1, p. 199-225,  Dec.  2011 .   Available from <http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S0104-59702011000500011&lng=en&nrm=iso>. access on  05  Oct.  2020.  http://dx.doi.org/10.1590/S0104-59702011000500011.

- Texto do Arquivo Nacional (2019).

- Jornal "Correio de Barretos", edições de 31/12/1942, 25/12/1943 e 17/9/1944. Acervo: hemeroteca do Museu Histórico, Artístico e Folclórico "Ruy Menezes".