quarta-feira, 30 de outubro de 2019

ANDRADINA, A ESCRITORA DAS MULHERES – PARTE I


ARTIGO PUBLICADO NO JORNAL "O DIÁRIO DE BARRETOS" EM 29 DE OUTUBRO DE 2019 (página 2) PELA PROFª KARLA ARMANI MEDEIROS 

Andradina América de Andrade e Oliveira.
(Fonte: FLORES, Hilda A. H. (org.). Divórcio?
(de autoria original de Andradina A.
Andrade e Oliveira – 1912), 2007, p.20)
            Em 17 de dezembro de 1921, veio a Barretos uma importante escritora brasileira desde o tempo oitocentista, a gaúcha Andradina América de Andrada e Oliveira (1864-1935). Visitou a Santa Casa de Misericórdia, único registro detectado até então, e ali deixou no livro de visitantes, na primeira página, suas impressões em forma de erudita e sentimental literatura: “E já que não é possível conservar-se vazia que se misture os infelizes a piedade imensa dos corações dulcidos dos meus patrícios, Dr Xavier de Almeida Júnior, Sr João Machado de Barros”.
            Francisco Xavier de Almeida Júnior era médico do hospital, goiano, residente em Barretos há mais de uma década e personagem da política citadina. Da mesma maneira, o limeirense João Machado de Barros, político e filantropo, pertencente à mesa diretora da Santa Casa. Ambos, personalidades atuantes como mediadores entre a escritora e a cidade de Barretos, também se dedicavam à produção literária em jornais locais. Ao citar os dois figurões na mensagem de seu próprio punho, torna-se fácil compreender como uma cidade isolada e conservadora naqueles anos 20, recebia uma mulher tão inovadora, feminista e autora de textos insignes sobre os direitos femininos.
            Quando veio a Barretos, Andradina era uma senhora de 57 anos, vindo a falecer em 1935. Já tinha publicado boa parte de suas 26 obras (livros e conferências). Era uma conferencista respeitada, escritora reconhecida e visitante de vários lugares no Brasil, junto a sua filha Lola de Oliveira. Andradina nasceu em Porto Alegre (RS) em 1864, sendo pertencente à família dos descendentes paulistas de José Bonifácio de Andrada. Segundo sua biógrafa, a historiadora Hilda Hübner Flores, da Academia Literária Feminina do RS, Andradina se tornou viúva muito jovem, e viveu de seu trabalho como professora, escritora e conferencista para sustentar seus dois filhos, Lola e Adalberon, falecido aos 20 anos. É após a morte prematura de seu filho, que Andradina se dedica ainda mais à escrita de seus livros e do jornal que havia fundado no sul. [continua].

ARQUIVOS, FONTES E REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS:
FLORES, Hilda A. H. (org.). Divórcio? (de autoria original de Andradina A. Andrade e Oliveira – 1912). Porto Alegre: Editora Mulheres, 2007.
ROCHA, Osório. Barretos de Outrora. São Paulo: Revista dos Tribuinais editora. 1954.
LIVRO DE VISITANTES DA SANTA CASA DE MISERICÓRDIA DE BARRETOS, Arquivo da Santa Casa de Misericórdia de Barretos; folha 1.

Link do artigo publicado no site do jornal "O Diário:

http://www.odiarioonline.com.br/noticia/88236/ANDRADINA-A-ESCRITORA-DAS-MULHERES--PARTE-I

O TEATRO AURORA – PARTE III

ARTIGO PUBLICADO NO JORNAL "O DIÁRIO DE BARRETOS" EM 22 DE OUTUBRO DE 2019 (página 2) PELA PROFª KARLA ARMANI MEDEIROS 

            Foram diversas as companhias que se apresentaram no Teatro Aurora, na esquina da Rua 20 com a avenida 17, desde sua inauguração em 1912. Algumas delas foram noticiadas pela imprensa barretense, assim como pelos jornais paulistas, incluindo o “Correio Paulistano”. Neste jornal, é visível o quanto o teatro era usado para finalidades distintas, como espaço para circo (em seu terreno aos fundos), bailes de carnaval, quermesses, reuniões políticas e institucionais, sessões cívicas e conferências; sem contar os recitais, concertos e apresentações teatrais e cinematográficas.
            Quanto ao cinema, dizia uma nota jornalística de 1914, que os empresários do teatro estavam exibindo: “esplendidos programas cinematográficos naquela casa de diversões. Isso tem feito crescer, dia a dia, o número de frequentadores daquele bem montado estabelecimento, com ótimo serviço de buffet”. Em 1912 e 1916, ocorreram animados bailes de carnaval, promovidos por uma sociedade carnavalesca criada no próprio teatro. Mas, parecia ser tradição na cidade, desde os primeiros anos de 1900, a montagem de circos de cavalinhos. Entre tantas companhias de circo, se apresentaram no Aurora: Temperani, François, Guarany, Martinelli, Clementino e Chileno. Notáveis sobrenomes estrangeiros, o que só reforça a característica imigrante em nosso país, especialmente nas atividades de cultura como o circo, teatro, música e cinema.
            Por outro lado, o teatro também foi espaço de episódios trágicos, em seu saguão, no interior e em seus arredores. Tiroteios que terminaram em assassinatos ocorreram envolvendo vítimas em 1914 e em 1919 - como o conhecido tiroteio de motivo político eleitoral tão narrado no memorialismo de Barretos.
            A partir de 1917, a imprensa paulista já solta notas com a denominação “Teatro Santo Antônio” ao antigo Aurora, demonstrando nova fase ao teatro que tanto produziu e propagou cultura ao povo de Barretos, numa época sinalizada por violência, mas que insistia em modernidade, arte e instrução. [fim].

Fontes:
CORREIO PAULISTANO, jornal de SP. Arquivo da Biblioteca Nacional. Edições 17.856; 17865; 17874; 17877; 17886; 17950; 18067; 18128; 18151; 18192; 18253; 18311; 18317; 18414; 18887; 18913; 19018; 19272; 19719. Edições dos anos 1913, 1914, 1915, 1916 e 1917. Acervo da Biblioteca Nacional.
ROCHA, Osório. Barretos de Outrora. São Paulo: Revista dos Tribuinais editora. 1954.

Link da publicação no site do jornal "O Diário":
http://www.odiarioonline.com.br/noticia/88119/O-TEATRO-AURORA--PARTE-III

sexta-feira, 18 de outubro de 2019

O TEATRO AURORA – PARTE II

ARTIGO PUBLICADO NO JORNAL "O DIÁRIO DE BARRETOS" EM 15 DE OUTUBRO DE 2019 (página 2) PELA PROFª KARLA ARMANI MEDEIROS 

Césare Gravina, ator de cinema e empresário do
Teatro Aurora em Barretos no ano de 1913.

(Fonte da imagem: google).
            Depois de inaugurado em 1912, o Teatro Aurora, prédio imponente edificado à rua 20, passou a ser palco de companhias teatrais, cinematográficas e artísticas ao longo da década de 1910. Neste ínterim, o teatro ficou sob a responsabilidade de diferentes empresários, os quais mantinham em funcionamento apresentações constantes ao público barretense, mesmo na época existindo o Teatro Éden à rua 18.
            Depois de Antônio Witzel, o criador do teatro, outros empresários assumiram sua administração, incluindo o artista italiano Césare Gravina (1858-1954). Conta o memorialista Osório Rocha, que ele teria vindo a Barretos junto a Companhia Carrara para se apresentar no Teatro Aurora. No entanto, os artistas foram embora e Césare permaneceu com sua esposa, Emma Gravina, em Barretos. Pelos registros da imprensa paulista, é visto que em 1913, Césare Gravina tornou-se o empresário responsável pelo teatro, até meados de junho. Depois disso, saiu de Barretos, foi proprietário de outros cinemas e anos mais tarde já estava nos EUA com carreira sólida como ator de cinema. Em pesquisas pela internet, são vistas várias fotografias dele e listagens das dezenas de filmes em que ele atuou entre 1915 a 1929 naquele país.
            Durante a administração de Gravina e sua esposa Emma, em maio de 1913, veio a Barretos uma companhia de artistas anões para se apresentar no Aurora. Chamava-se “Companhia Liliputiana”, evidente denominação inspirada na obra do inglês J. Swift, “Viagens de Guliver”. Sobre essa companhia, a imprensa paulista relatou que ela: “deixou agradabilíssima impressão. Nos poucos dias que trabalharam no Teatro Aurora, os anões deixaram sinceras simpatias, não só por se mostrarem verdadeiros artistas, como pelo trato afável e cavalheiresco que dispensavam a todos com quem privavam” (Correio Paulistano, 9/5/1913, p4). Anterior a esta companhia, já tinham se apresentado no Aurora outras tantas, como “Irmãos Freire”, “Companhia de Operetas Camerata” e “Companhia de comédias e operetas Rodrigues e Lima”, etc. [continua].

Fontes:
CORREIO PAULISTANO, jornal de SP. Arquivo da Biblioteca Nacional. Edições 17.856, 17.865, 17.874, 17.877, 17.886, 17.924 e 17.934 do ano de 1913.
ROCHA, Osório. Barretos de Outrora. São Paulo: Revista dos Tribuinais editora. 1954.

Link da publicação no site do jornal "O Diário":
http://www.odiarioonline.com.br/noticia/88019/O-TEATRO-AURORA--PARTE-II

Artigo original publicado no jornal "O Diário", 15/10/2019, página 2:

terça-feira, 8 de outubro de 2019

O TEATRO AURORA – PARTE I

ARTIGO PUBLICADO NO JORNAL "O DIÁRIO DE BARRETOS" EM 08 DE OUTUBRO DE 2019 (página 2) PELA PROFª KARLA ARMANI MEDEIROS 

Teatro Aurora, posteriormente denominado Santo Antônio,
à Rua 20, esquina da avenida 17.

(Fonte: acervo do Museu "Ruy Menezes").

            Ainda com o nome de “Rua Alfredo Ellis”, a atual Rua 20, adjacente à avenida 17, ostentava o imponente prédio do “Teatro Aurora”. Edifício que além de modernizar a paisagem urbana com sua pomposa arquitetura numa cidade que ainda ensaiava ares modernos, era também lócus de propagação de cultura e arte. O prédio do teatro ainda se mantém firme, mesmo com aparentes intervenções e divisões comerciais; ali ele resiste em silêncio, mas, para quem tem olhos sensíveis ao passado da cidade, enxerga em seus paredões possíveis passagens que marcaram a história local.
            O prédio foi construído em 1911, era de propriedade de Antônio Witzel – empreendedor na cidade anos antes com a central telefônica e a Empresa Orion. Depois de ter participado de sua inauguração em 1912 e suas primeiras contratações, em junho, Witzel fora assassinado a tiros em Barretos. Não viu seu teatro prosperar.
            E prosperou. Sua inauguração ocorreu em 27/1/1912, com suntuoso baile e oradores, cujas impressões foram transmitidas à imprensa paulista, tanto que “O Estado de S. Paulo” anunciava que no baile seguiram: “dançando sessenta pares no vasto salão, até as 4 horas da manhã. A iluminação e o serviço de buffets foram irrepreensíveis”. Mas, dois dias antes de sua inauguração, o Teatro Aurora já havia sido palco do recital da cantora italiana Clotilde Morosini. Após a inauguração, seguiu seu curso com contratações de companhias artísticas, que se apresentavam por dias, semanas ou meses na cidade. A primeira delas foi a Companhia Carrara, que, em 1912, já possuía 41 anos de atividades no Brasil. Seu proprietário era o ator Luiz Carrara, o qual fechou contrato para 8 apresentações naquele teatro, sendo elogiado pela imprensa. Inclusive, o jornal “O Sertanejo” enalteceu uma de suas atrizes, Justina Laverone, como “uma das de mais talento natural que temos visto pisar o palco da língua portuguesa”.
            Depois da Companhia Carrara, outras vieram abrilhantar o palco do Aurora; que não só de aplauso e pompa se sustentou. [continua].

Fontes:
ROCHA, Osório. Barretos de Outrora. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 1954, p. 9, 276-7.
ROCHA, Osório. Reminiscências, volume I. Ribeirão Preto, Editora Cori, s/d, p. 186, 188.
O SERTANEJO, jornal hebdomadário de Barretos. Ed. 380, ano 1912. Acervo do Museu "Ruy Menezes".
O ESTADO DE S. PAULO, jornal de São Paulo. Ed. 12099, ano 1912. Acervo da Biblioteca Nacional.

Link da publicação no site do jornal "O Diário":

Artigo original publicado no jornal "O Diário", 8/10/2019, página 2:

terça-feira, 1 de outubro de 2019

OS TEMPOS DE RITA E INÁCIA

ARTIGO PUBLICADO NO JORNAL "O DIÁRIO DE BARRETOS" EM 01 DE OUTUBRO DE 2019 (página 2) PELA PROFª KARLA ARMANI MEDEIROS 


            Entre tantos integrantes das duas famílias fundadoras da cidade, Barreto e Marques, chama a atenção duas mulheres que ficaram registradas nas narrativas memorialistas como figuras de exceção, diferentes “de seu tempo”. Ficaram apelidadas popularmente como “Rita Parnaíba” (filha caçula de Chico Barreto e Ana Rosa) e “Inácia Homem” (filha de Simão Antônio Marques e Joaquina Cândida de Jesus).  
            Rita Maria de Jesus, a caçula do casal Barreto, ganhou a alcunha de “Rita Parnaíba” por certa vez ter atravessado o Rio Paranaíba (MG/GO) em uma jangada improvisada em direção à Goiás. Tal travessia teria sido uma fuga, já que foi perseguida pela polícia e condenada à prisão por Juri em Araraquara por conta de assassinato. Crime que também teria cometido em terras goianas, por questões de terra e honra de família. Existem episódios icônicos de Rita defendendo as mulheres da família. Nas palavras do jornalista José Eduardo de Oliveira Menezes, transcritas por Osório Rocha, Rita foi “a mulher mais valente e desabusada que já pisou nestas paragens”. Era conhecida por dançar o cateretê, cantar, festejar e ser fazendeira.
            Já Inácia, filha dos Librina, era notada com certo jeito “masculinizado” na aparência e nas atividades – comparando-se à maioria das mulheres da época. Era capacitada em dirigir os serviços da roça, correr os pastos, caçava, era dona de casa e administrava fazenda. Era reconhecida em toda a região por seu trabalho em tecer e tingir tecidos. Inclusive, tecia e tingia suas próprias roupas, tendo o costume de usar calças azuis e um “robe” por cima, causando estranhamento à gente da época. Consta-se também que foi casada, mas por sofrer violência do marido, separou-se dele.
            Em Rita e Inácia são sinalizadas duas características interessantes para mulheres sertanistas como elas: a independência e o reconhecimento dessa independência. Afinal, os relatos mostram-nas como mulheres que enfrentavam os rótulos da época, bem como os preconceitos velados e revelados, eram articuladas no trabalho e valentes.          

Fonte:
ROCHA, Osório. Barretos de Outrora. São Paulo: Editora dos Tribunais, 1954, p. 24 e 33.

Link da publicação no site do jornal "O Diário":


Artigo original publicado no jornal "O Diário", 1/10/2019, página 2: