quarta-feira, 12 de fevereiro de 2020

RETRATISTAS E RETRATADOS (PARTE I)

ARTIGO PUBLICADO NO JORNAL "O DIÁRIO DE BARRETOS" EM 11 DE FEVEREIRO DE 2020 (página 2) PELA PROFª KARLA ARMANI MEDEIROS 

José Monteiro França, pintor paulista.
(Fonte: Revista Illustração Paulista,
13/06/1912, ed. 72, p. 14;
Arquivo da Biblioteca Nacional)
           

           O Museu “Ruy Menezes”, sediado no antigo Paço Municipal, guarda em seu acervo retratos individuais pintados a óleo. Quando expostos no salão principal do Museu, sempre se tem a impressão de que aqueles retratos são inerentes ao espaço. E, de certa forma, são mesmo. Não somente por retratarem os primeiros “figurões” da política barretense, mas por estes utilizarem do espaço público (prefeitura) para expô-los.
Os retratos foram pintados no início do século XX, num momento em que a política barretense já se consolidava em núcleos partidários, líderes e até possuía conflitos. Os espaços públicos de administração mal tinham sido edificados, visto que o Paço Municipal só foi inaugurado em 1907. Este fator tornava o edifício da Câmara Municipal, alugado, o principal centro de sociabilidade da classe política. Isto é, antes de 1907 era a Câmara Municipal o destino certeiro dos retratos de determinados líderes políticos; posterior àquele ano, o Paço Municipal assumia essa função.
Em destaque, alguns dos retratos individuais
no prédio do Museu municipal, na ocasião de
sua inauguração, em 1979.

(Fonte: Arquivo do Museu "Ruy Menezes")
O Paço Municipal, inclusive, não era um local só de aparatos administrativos, reservava-se também como um recinto de recepções e bailes. Para tal, sua estrutura mantinha na fachada uma arquitetura atraente e convidativa, ao passo que, internamente era adornado por pinturas nas paredes, além dos retratos individuais. Osório Rocha, memorialista, declarava sobre isso na imprensa: “Havia, para alegrar a vista e sacudir a inspiração da Prefeitura, a arborização do Pátio, os retratos a óleo pendentes das paredes e, sobretudo, a pintura das ditas paredes, que era tida na conta de obra prima e só foi substituída em 1917” [sic]; (Correio de Barretos, 11/07/1920).
Com o ambiente envolto a obras de arte, intrínsecas ao prédio ou nele penduradas, mais do que saber quem são os retratados, a reflexão que fica é quanto aos seus autores e suas intenções. Quem são esses pintores retratistas? Conheceremos dois deles: Agnello Corrêa e José Monteiro França.



Fontes:
Jornal “Correio de Barretos” (Barretos/SP), de 11/07/1920, publicado em: ROCHA, Osório Faleiros (in memoriam). Esboços: 60 anos de jornalismo (Volume 1), p. 95-6.

1920: LITERATURA E EDUCAÇÃO (PARTE IV)

ARTIGO PUBLICADO NO JORNAL "O DIÁRIO DE BARRETOS" EM 04 DE FEVEREIRO DE 2020 (página 2) PELA PROFª KARLA ARMANI MEDEIROS 


            Voltando à literatura e a forma com a qual ela incentivava as crianças na construção da sociedade e do patriotismo, a Profª Brasília de Siqueira, acreditava que o Brasil ainda não possuía um livro central que estivesse a serviço do nacionalismo. Criticava as obras literárias produzidas para as crianças, as quais eram infantis demais ou com conteúdo de difícil entendimento às faixas etárias escolares.
Porém, como cabiam aos professores essa missão de ensinar e trazer à tona a cidadania, Brasília deixava uma mensagem atemporal, que merece ser reproduzida em parte: “em nosso país, o professor que fez da sua profissão um apostolado; o professor que não se contenta apenas de ensinar o alfabeto e as disciplinas essenciais para a vida, e tenta acender uma luz mais forte no cérebro da criança, o professor que, cuidando ter um filho em cada aluno, se esforça por despertar nele o amor da pátria, da família, do trabalho, da honra, do dever cumprido; o professor que, no desejo de elevar a mentalidade do pequeno ser que lhe cofiaram, procura insuflar-lhe o sentimento de amor próprio, de altivez, de independência, de piedade, de bondade, de proteção aos humildes, de repulsão contra os maus, de desprezo ao arrogante; o professor, enfim, que quer fazer dos seus discípulos homens moralmente perfeitos, não tem, em nosso país, um único livro... Mas não desesperemos. O Brasil é a terra dos poetas”.
            Brasília incitava o nacionalismo pela literatura na esperança do futuro regar a escola com uma obra que ensinasse as crianças a se reconhecerem como brasileiras. Há que se reconhecer, no entanto, que o texto tem 100 anos, e, que, quando Brasília conferenciava em Barretos, o produto do seu pensamento era o que a época dela entendia como fundamental ao país. Depois disso, o Brasil viveu o nacionalismo nos anos 1930, visível em novos formatos em outras décadas. Mas, fica a reflexão: se no passado o que se queria da Literatura era o exercício do nacionalismo, hoje, o que precisamos aprender e nos inspirar com os livros?

Fontes:

"Revista Feminina" (São Paulo/SP), 1920, ed. 73, p. 30-1 - Arquivo da Biblioteca Nacional. 

1920: LITERATURA E EDUCAÇÃO (PARTE III)

ARTIGO PUBLICADO NO JORNAL "O DIÁRIO DE BARRETOS" EM 28 DE JANEIRO DE 2020 (página 2) PELA PROFª KARLA ARMANI MEDEIROS 

  
            Em 1920, na praça de Barretos, a conferência da Profª Brasília era quanto a influência da literatura como didática à construção da identidade dos povos. Ela exemplifica como os europeus se formaram, cada qual, como “povo” a partir da inspiração de um livro central. Assim, a índole nacionalista voltada às crianças seria formada pela indução dos livros no ambiente escolar.
            Como ilustração, Brasília comenta sobre a importância do livro “Robinson Crusoé” de Daniel de Foe na característica aventureira do povo inglês, condição básica ao imperialismo. Destacou também o livro “Nos jucaes” de Ruyard Kipling, contemporâneo àquela época, e que, segundo a conferencista, foi condição para que os ingleses passassem a se interessar pela vida natural, higiene, além do prazer da aventura e orgulho da força. Já na França, o livro predileto era a história de Carlos Magno e suas batalhas, o que teria motivado a formação bélica da sociedade. À Espanha a conferencista configura uma reflexão diante o clássico “Dom Quixote”, de Miguel de Cervantes, a partir da dicotomia entre o heroísmo do destemido Dom Quixote e a reflexão e prudência do escudeiro Sancho Pança. Para a Itália, Brasília declara ser o livro “Cuore”, de Edmundo de Amicis, a obra que tanto chama a atenção das crianças (e que nós do futuro sabemos de ter sido a principal obra de influência no nacionalismo italiano). Já a Alemanha, a professora dizia não ter um grande livro, mas reconhecia a ação do “mestre-escola” como unificador do espírito alemão, numa só mentalidade e pátria.
            Diante tais exemplos do nacionalismo europeu, revisitado naquele período entreguerras dos anos 20, a Profª Brasília reproduzia uma visão histórica e sociológica concernente à época em que vivia: a de que os países europeus eram agentes colonizadores na missão de civilizar os demais povos. Essa perspectiva de missão civilizadora, entretanto, foi descontruída ao longo do tempo por conta das consequências de violência e guerra causadas aos povos dominados por tal imperialismo.

Fontes:
"Revista Feminina" (São Paulo/SP), 1920, ed. 73, p. 30-1 - Arquivo da Biblioteca Nacional. 

1920: LITERATURA E EDUCAÇÃO (PARTE II)

ARTIGO PUBLICADO NO JORNAL "O DIÁRIO DE BARRETOS" EM 21 DE JANEIRO DE 2020 (página 2) PELA PROFª KARLA ARMANI MEDEIROS 

             Em termos gerais, o que significava ter a conferência integral de uma professora em Barretos publicada numa revista da capital? Historicamente, muita coisa. Não só pelo fato de ser uma mulher, mas da mesma representar a classe de professoras com uma envergadura intelectual expressiva, fazendo-se ouvida por outras mulheres e homens da elite letrada local. E o principal encontrava-se no mote da conferência, que, ao falar de Literatura e Educação, anunciava outro tema importante e nem sempre benquisto em uma cidade interiorana e conservadora: o papel social da mulher.
           Na introdução de sua conferência, durante a quermesse na Praça Francisco Barreto, a Profª Brasília já iniciava: “A mulher, que se fez dona do seu lar e que soube sobrepor a sua vontade à vontade do seu marido, é a única que pode garantir uma prole de homens fortes e independentes. Aquela, porém, que se submeteu aos caprichos do esposo e que os acolhe como se fossem ordens emanadas de uma autoridade superior, não pode dar ao mundo senão seres fracos, destituídos de volição”.
            Com esse pensamento, de que a mulher era a responsável pela criação dos filhos, independente na vontade e condução desta tarefa, Brasília exemplificava o sucesso das matronas romanas, que assim procediam quanto aos maridos; em contraponto da humilhação vivida no Oriente, onde as mulheres viviam enclausuradas e na total dependência. Para ela, a mulher censurada, desautorizada e freada, somente conseguiria criar homens escravos do ambiente, dos preconceitos e do trabalho.
            Essa visão de responsabilidade da mulher na criação dos filhos era característica do positivismo na 1ª República, onde a mãe, dotada de predicados, era tida como o condutor para a formação de homens fortes, futuros cidadãos e comandantes do país. Pela visão crítica da História, trata-se de uma perspectiva que, embora ofereça a mulher melhores condições de independência moral, por outro lado, a restringe ao universo do lar e dos filhos. Era uma visão inicial do que as mulheres aspiravam. Bem inicial.

Fontes:
"Revista Feminina" (São Paulo/SP), 1920, ed. 73, p. 30-1 - Arquivo da Biblioteca Nacional.