quarta-feira, 29 de junho de 2011

NOSSO MUSEU: UMA BELA HISTÓRIA PELA NOSSA HISTÓRIA



ARTIGO PUBLICADO POR KARLA O. ARMANI NO  JORNAL "O DIÁRIO DE BARRETOS" EM 24 DE JUNHO DE 2011 

“Hoje sempre foi e será consequência do ontem e assim causas e conseqüências constroem o caminhar da humanidade”
            Guardadas pelo jornal “O Diário”, as palavras acima foram proferidas pela Profª Lydia Scannavino Scortecci no dia 6 de fevereiro de 1979. Uma ocasião especial a Barretos, quando a cidade foi abrilhantada pela instalação do Museu Municipal. Tratou-se de uma ocasião deveras importante, com a presença do prefeito Mélek Zaiden Geraige, o bispo Dom Antonio Maria Mucciolo, a Diretora de Divisão da Educação, Cultura, Esportes e Turismo, Profª Lydia Scannavino e o Profº Raul Alves Ferreira.
            A história do Museu Municipal, porém, não tem início nesta data. Seu nascimento data-se de 1961 quando, por esforço do Profº Raul Alves Ferreira e a equipe de professores e funcionários do “Colégio Estadual e Escola Normal Mario Vieira Marcondes”, foi criado o primeiro acervo do Museu Municipal, então denominado “Museu Ana Rosa”. Em ofício expedido pela Secretária de Estado dos Negócios da Educação de São Paulo, datado de dezembro de 1961, ficou evidente o quão importante foi a iniciativa tomada pelo Profº Raul quanto a criação do Museu Municipal que fez juz ao primeiro lugar na campanha pelos museus paulistas na época.
            No mesmo ofício o presidente da instituição estadual já ressaltava: “seria do maior interesse que o prezado colega orientasse o novel museu no sentido de ser ele o museu do município, instalado, futuramente em sede própria”. O presidente assim se pronunciou devido o fato de museu estar funcionando nas dependências da escola. Desde sua fundação, portanto, já era discutida a sede própria para o museu e é neste sentido que em 1974, quando era prefeito Ary Ribeiro de Mendonça e Diretor da Cultura dr. Matinas Suzuki, que o acervo do Museu Ana Rosa foi cedido ao município.
            Em 1979, logo, todo o acervo do museu municipal ganhou sua sede própria no antigo Paço Municipal. O exuberante “Palácio das Águias”, que em tempo áureos foi respeitável prédio da prefeitura municipal, receptor de autoridades políticas de âmbito nacional, local de inaugurações estimáveis à cidade como o Grêmio Literário e palco de bailes memoráveis do início do século XX, ganhava, pois, merecidamente o rótulo de MUSEU. Por representar toda esta memória social e a afetividade de uma comunidade, o Palácio das Águias tornou-se sede do Museu Municipal simplesmente por ele mesmo ser um acervo, fazer parte da história da cidade e ser um museu a céu aberto com sua encantadora arquitetura neoclássica.         
           O próprio prefeito da época, Melek Z. Geraige declarou no jornal que “sentia-se feliz de poder na sua administração, dar por instalado um museu. Afirmou, que, sentiu muito quando o prédio do 1º Grupo Escolar foi demolido, e não querendo que o mesmo ocorresse, talvez, com o antigo paço municipal decidiu transformá-lo em patrimônio histórico, preservando nele as tradições barretenses”. Mas, a história do antigo prédio da prefeitura ainda não acabava nessa época, entre muitos de seus caminhos, Ruy Menezes quando vereador conseguiu torná-lo utilidade pública e o Profº Milton Ferreira, quando prefeito em 1988, tombou novamente o prédio do Museu como momento histórico municipal.
            Sabendo de tudo isso, a reflexão que nos vale é a cerca da belíssima história que o centenário prédio do antigo paço municipal construiu tanto como prefeitura e, até hoje, como museu. Quantos esforços tiveram autoridades barretenses em criar um local apropriado e condigno à história local para abrigar seus preciosos acervos? Quanto nós, barretenses, devemos a eles e ao nosso Palácio das Águias? Que sempre o preservemos.

ACADEMIA E ESCOLA: A TRADUÇÃO DA HISTÓRIA



ARTIGO PUBLICADO POR KARLA O. ARMANI NO JORNAL "O DIÁRIO DE BARRETOS" EM 17 DE JUNHO DE 2011

“Mas, papai diga-me lá para que serve a História?”

            A frase acima compõe a primeira linha da introdução do livro “Apologia da História ou O Ofício do Historiador” escrito pelo historiador francês Marc Bloch. Os rascunhos do livro foram escritos em 1943 quando Bloch, por ser judeu, permanecia sob a guarda nazista. Foi morto em 1944 e sua obra foi anotada por seu filho primogênito Étienne Bloch e publicada pela primeira vez em 1949. Conta-se que Bloch escreveu esta obra de acordo com as leituras que estavam gravadas em sua memória.
            A pergunta pronunciada por seu filho, por mais ingênua que pudesse parecer, possui uma complexidade tamanha perante o objeto de estudo da história e o ofício do historiador. A intenção de Bloch era saber destrinchar estes conceitos, baseando-se na história da própria história, e, posteriormente, expô-los de maneira simples a ponto de uma criança conseguir compreender e absorver o conhecimento emanado pela história.
            Questões como estas podem parecer simples, mas, historiadores e discentes de História sabem como é trabalhoso estudar o conhecimento acadêmico e depois traduzi-lo no saber escolar. O distanciamento entre o que se aprende na academia e o modo como se ensina história na escola é um fator quase que “contraditório” no ofício do historiador e do professor de história. O que não quer dizer que não seja possível conciliar os dois papéis essenciais a ambos: o saber acadêmico e o saber escolar.
            Em 1929, os historiadores franceses Marc Bloch e Lucien Febvre publicaram a primeira edição da revista “Annales d'Histoire Économique et Sociale”. Por meio desta publicação, pode-se dizer que os rumos da historiografia e do ofício do historiador começaram a se modificar e novos horizontes foram vistos no campo histórico. A história não era mais restrita ao campo político, surgia a história social, econômica, demográfica, cultural e outras associadas às áreas da interdisciplinaridade. Com o desenrolar da primeira, segunda e terceira geração dos Annales, novas temáticas e fontes foram criadas pelos historiadores e determinados contextos foram revisados, pois até então a história tradicional e positivista cunhava todas as produções históricas.
            Enfim, revisões bibliográficas estão sendo feitas a todo momento para atualizar a historiografia e o ensino de História. Livros-didáticos contam com novas acepções a fim de mostrar ao aluno, além da valorização do aprendizado histórico, noções de temporalidades distintas e concomitantes, visões sob culturas diferentes e, sobretudo, a ideia de que o passado é o lugar do outro, sendo indispensável o julgamento de uma época com os olhos da época. Por um lado, o historiador, hoje, não se limita somente à academia, é necessário divulgar suas publicações à sociedade de modo a levar alguma aprendizagem; assim como o professor não se aparta mais da designação “professor pesquisador”, já que não há como ensinar história sem desvencilhá-la da pesquisa e do olhar do historiador. Apesar da temível distância, academia e escola, juntas e traduzidas, constituem o caminho para a disseminação de um passado que se mostra cada vez mais não tão distante.

(Artigo dedicado aos discentes de História da Faculdade Barretos)

AS SERESTAS DOS NAMORADOS



ARTIGO PUBLICADO POR KARLA O. ARMANI NO JORNAL "O DIÁRIO DE BARRETOS" EM 1O DE JUNHO DE 2011

“Amar é ver o sol por entre a noite escura,
É sofrer na alegria de gozar na tortura...
É sofrer num verso do infinito desejo:
- viver por um sorriso e morrer por um beijo...”
             O verso acima está registrado no jornal “A Semana” de 11 de junho de 1953. É um belo poemeto que compunha a propaganda do Dia dos Namorados da Loja Imperial. A imprensa nos anos 50 era carregada de propagandas das lojas da cidade, sendo estes anúncios compostos pelos mais variados temas: lâmina de barbear, cigarros, elixir de todos os tipos e roupas. Escrever um poema parecia ser a maneira mais utilizada de se fazer uma propaganda na época, principalmente em datas especiais como o Dia dos Namorados.
            No domingo próximo, dia 12, comemora-se o dia dos namorados. Trata-se de uma tradição que remonta ao Império Romano, quando jovens militares foram proibidos de se casar, pois o imperador Claudius II acreditava que os solteiros combatiam melhor do que aqueles que compunham laços familiares. Assim, os clérigos cristãos foram proibidos de realizar matrimônio. Porém, conta-se que bispo Valentim celebrava as cerimônias de casamento às escondidas e por agir desta maneira foi preso e condenado à morte. Quando estava preso recebia secretamente bilhetes e cartas dos apaixonados que juntara em matrimônio. Em um 14 de fevereiro, no século terceiro, Valentim foi decapitado. Tempos depois, quando tornou-se santo, o dia de sua morte passou a ser considerado o dia dos apaixonados, dos enamorados.  No Brasil, a comemoração do dia dos namorados tomou outro caminho, uma vez que 12 de junho é a véspera do dia de Santo Antônio, conhecido como Santo Casamenteiro.
            Desde que a data do dia dos namorados foi estabelecida tornou-se hábito entre os casais a troca de presentes. Nos tempos atuais, o comércio passou a utilizar esta data como um atrativo aos enamorados. As propagadas televisivas começam a se manifestar quase um mês antes da data, de modo que os casais antes mesmo de pensarem na comemoração em si, pensem primeiro nos preços mais cômodos no momento de presentear um ao outro.
            Se pensarmos em tempos mais antigos, na época de nossos avós e bisavós, o presente também era o hábito de se comemorar o dia dos namorados. Mas, que tipo de presente era trocado entre um casal? As serenatas aparecem em primeiro lugar na maioria das mentes das pessoas. Num passado não muito distante, a serenata era a forma mais carinhosa de se expressar o amor pela namorada ou pelo menos àquela moça que se pretendia namorar. Caracterizadas pela tradição portuguesa, as cantorias populares tocadas em violas à beira das janelas eram feitas pelos apaixonados e exprimiam versinhos rimados que muitas vezes acertavam em cheio os corações das mulheres.
            Nos dias de hoje estas práticas caíram em desuso e os jovens comemoram o dia dos namorados focados na troca de presentes. Na realidade dos “novos tempos” pouco se vê versos poéticos trocados entre os namorados e quiçá serenatas. Versos como os de “Ranchinho e Alvarenga” ainda podiam fazer parte do Dia dos Namorados: “Meu violão em seresta à luz de um luar / a natureza em festa, tudo parece cantar / só eu tristonho na rua, sozinho, sem ninguém / vivo cantando pra lua a canção que é só tua meu querido bem”.

quinta-feira, 9 de junho de 2011

AS LETRAS DE UM CORONEL



ARTIGO PUBLICADO POR KARLA O. ARMANI NO JORNAL "O DIÁRIO DE BARRETOS" EM 3 DE JUNHO DE 2011

“Deus disse à imprensa: vai e a justiça propaga.
E a imprensa, erguendo à boca a sonora tuba,
ora pomba a arrulhar, ora leão, a juba
em desalinho, foi e rolou como a vaga...”

            O verso acima está registrado nas folhas amareladas do jornal “O Correio de Barretos” do dia 14 de abril de 1957. Segundo a reportagem de onde foi retirado, trata-se de um verso de autoria do conhecido Coronel Silvestre de Lima datado aproximadamente nas últimas décadas do século XIX. Às vistas de Silvestre, tal verso fala do nascimento da imprensa e de sua função na sociedade, como se a mesma fosse disseminar a justiça social por entre os homens. Talvez, neste momento, se encontrava o despertar da veia literária e jornalística de um coronel bacharel que até os dias de hoje é citado na imprensa da cidade.
             Com mais de um século e uma década de fundação da imprensa criada pelo Cel. Silvestre de Lima em Barretos, seu nome ainda perpetua na imprensa talvez por ser a sua biografia um tanto distinta para a época. Tratava-se de um coronel letrado. A expressão “coronel letrado” pode parecer um tanto contraditória se tivermos a única visão de que os coronéis eram homens ligados somente às atividades agrícolas, proprietários de terras e também donos do poder político. Isso em boa parte do Brasil era verdade, mas exceções também fazem parte da história. E, em sua minoria, existiam coronéis que tinham suas atividades concentradas na intelectualidade, talvez como uma maneira de consolidar ou transformar princípios políticos. Como é o caso de Silvestre de Lima, bacharel e poeta.
            Por intermédios de leituras da época e de biografias recriadas na imprensa barretense, conta-se que Silvestre fez parte do movimento abolicionista no Rio de Janeiro, escrevendo textos em jornais e lutando ao lado de José do Patrocínio. Nesta mesma época, intelectuais organizavam-se em um movimento literário conhecido como “Parnasianismo”, isto é, uma onda de poetas em oposição à subjetividade e o sentimentalismo do Romantismo. Os parnasianos valorizavam a métrica poética, as referências aos elementos greco-romanos e a objetividade dos versos. Por conta disso, foram muito criticados pelos modernos da década de 20.
No jornal “O Sertanejo”, fundado por Silvestre, exibiam-se poesias de sua autoria e de famosos poetas da capital federal. Poesias parnasianas escritas por Alberto de Oliveira, Raimundo Correia, Olavo Bilac e Silva Jardim, estampavam as páginas do jornal de Barretos como elementos essências à leitura. Caracterizadas pela norma culta, sua leitura nem sempre é de fácil compreensão, ainda mais, porque por utilizarem nomes conhecidos no mundo da Antiguidade.
Os registros que restaram ao presente indicam que a poética de Silvestre de Lima era parnasiana. Entretanto, sua linguagem poética parece também apresentar peculiaridades, como o fato de fazer referências as suas filhas em suas poesias. Os lados da política, da economia, da cultura e da intelectualidade de coronéis como Silvestre de Lima ainda merecem ser estudados, pois suas particularidades devem ser registradas. Afinal, a história não deve generalizar as personalidades, deve buscá-las no quão íntimo for possível para não se tornar senhora de uma verdade só.

quarta-feira, 1 de junho de 2011

DE MAIS E DE MENOS




ARTIGO PUBLICADO POR KARLA O. ARMANI NO JORNAL "O DIÁRIO DE BARRETOS" EM 27 DE MAIO DE 2011
           
            Esquecimentos, dores físicas, stress e outros destes atribuídos fazem parte da rotina de muitas pessoas nos dias de hoje. Rotina, literalmente. A gama de informações que envolve o nosso cotidiano e as exigências sociais, que, por vezes, nos são impostas de maneira indesejável, podem ser nocivas à saúde. Na condição de “civilizados”, às vezes somos escravos do “demais” e do “de menos”, trabalhamos demais, preocupamo-nos demais, falamos demais, ouvimos menos, exercitamo-nos menos e dormimos menos.
            Para o sociólogo polonês Zygmunt Bauman, o tempo que vivemos hoje é caracterizado por um ritmo muito inconstante, onde o presente se renova a todo momento. Por exemplo, neste tempo as informações transmitidas de uma pessoa a outra, independente da distância entre as mesmas, são quase instantâneas. O tsunami no Japão foi notícia no mundo todo em apenas alguns minutos do início da tragédia. As pessoas buscam por novidades o tempo todo, seja na moda ou até mesmo em seus objetos pessoais. Somos movidos por uma insaciabilidade do novo, sendo que, segundos depois, aquilo não é mais novo, pois outro já tomou o seu lugar. Á esse tempo, Bauman estabeleceu a seguinte denominação: “tempo pontilhado”, ou seja, um tempo marcado por rupturas e descontinuidades, fragmentado em meio a múltiplos instantes.
            Pois bem, o mundo visto por esta ótica parece até mesmo pessimista. Mas, a realidade em que vivemos é pautada nisso, num tempo inconstante, em que as coisas se renovam com muita facilidade e rápido demais. Por conta disso, criamos um estilo de vida também baseado na produção rápida e na exigência, principalmente no lado profissional, onde cada vez mais competência é sinônimo de concorrência. E às pessoas que não conseguem se equilibrar mediante a este estilo de vida, podem ter a saúde afetada.
            Stress, dores em várias partes do corpo, enxaquecas e cefaléias podem ser desenvolvidas em pessoas que se tencionam com situações inconstantes do dia-a-dia. Mesmo a enxaqueca sendo uma doença acometida por pessoas que possuem pré-disposição genética, ela pode se agravar conforme fases difíceis da vida. No caso da cefaléia tensional, causada pela tensão ou por ansiedade dos indivíduos, as dores também podem ser muito constantes e intensas. Casos como estes são resolvidos à base de tratamentos médicos, que, na maioria das vezes, além de remédios, orientam também a prática de exercícios físicos e uma alimentação saudável.
            Quer dizer, tudo aquilo que perdemos com esta vida do tempo pontilhado e das cobranças, isto é, os atributos mínimos de sobrevivência, como a prática de exercícios na luta contra o sedentarismo mórbido e a alimentação saudável, acabam sendo os remédios que mais necessitamos quando nos desequilibramos. A pergunta é: será que compensa viver nestes extremos do “de mais” e do “de menos”? A busca pelo equilíbrio certamente não é fácil, mas, do que vale a vida sem o sentimento de viver? Afinal, com ou sem preocupação, tudo sempre dará certo!