sábado, 27 de dezembro de 2008

A NATUREZA DA PAZ



Há muito tempo, dizem que esta época de transição entre um ano e outro é tempo de reflexões. Algumas pessoas se unem para festejar os ritos da tão esperada festa cristã, outras, porém, preferem dedicar-se ao isolamento para refletirem sozinhas sobre a passagem do ano e outras, ainda, sequer ligam para tais acontecimentos. Mesmo assim, é perceptível que algo diferente acontece conosco, desde súbitas vontades a mudar o corte de cabelo até prometer aos santos que o futuro ano será diferente.
Bem, mesmo sendo um ser humano, isto é, passível de qualidades e defeitos, penso que seja importante refletir sobre duas virtudes, que, historicamente estiveram presentes (ou tentaram estar) na vida humana. Falo sobre o “respeito” e a “paciência”.
De acordo com a mentalidade de cada época, os significados das palavras são estudados e revistos para se adequarem às culturas. Logo, em um dicionário de latim, do ano de 1913, o significado da palavra “respeito” era vinculado moralmente ao “resguardar do homem para com o homem”. É claro que isso é muito importante, contudo, acredito que uma das virtudes que nos faltam é o respeito do homem à natureza, onde se inclui o próprio homem, o meio ambiente, os animais e a flora. Penso, ainda mais, que o maior ato de respeitar que se pode haver na humanidade é aceitar as “diferenças”; sejam físicas, psicológicas e culturais, entre nós mesmos ou entre a natureza. Ora, não é porque somos racionais que somos melhores ou piores que os outros seres vivos.
Sobre a outra virtude, certa vez li que dividindo a palavra “paciência” tem-se como resultado: “ciência da paz”. Por “ciência”, nota-se o sentido de “sabedoria” em tal expressão, posto que, para se alcançar a paz é preciso saber pensar, esperar, agir. Na história, tivemos grandes exemplos em que o homem falhou com ele mesmo e com a natureza por falta de sabedoria em esperar o momento certo e agir precipitadamente.
Neste ano de 2009, o meu maior desejo a todos é que consigamos aceitar as nossas diferenças, com respeito e sabedoria. Afinal, para alcançarmos a tão desejada “paz” talvez devêssemos valorizar as nossas diferenças, pois elas que nos mantêm vivos e nos completam dentro da nossa única natureza: Deus.

ARTIGO PUBLICADO NO JORNAL ''O DIÁRIO'' (BARRETOS/SP), EM 27 DE DEZEMBRO DE 2008.

segunda-feira, 22 de dezembro de 2008

AS HISTÓRIAS DOS VELHOS


Por muito tempo as três fases da vida humana, infância, vida adulta e velhice, foram vistas com base somente no homem adulto. Ou seja, a criança era enxergada como um “mini-adulto” e a velhice era meramente a fase final da vida adulta. Não eram consideradas como fases distintas e muito menos tinham suas peculiaridades reconhecidas. Com o passar dos tempos, este quadro se modificou e as diferenças foram aceitas, entretanto, algumas vezes a mentalidade do passado nos impede de realizar muitas coisas.
Tratando-se da velhice, percebe-se que o Brasil está se tornando um país “maduro”. Posto que, com a diminuição da quantidade de filho por casal e o aumento da expectativa de vida, o número de idosos cresce constantemente. Tanto que, estima-se para o ano de 2.025 que 15,4% da população brasileira terá 60 anos ou mais de idade.
Em outra perspectiva, o mais curioso nos idosos é a questão da memória. Qual família não tem sempre um vovô para relembrar os velhos tempos? Isso é muito importante no sentido de aproximar a família às histórias das diferentes épocas. Por exemplo, um vovô que participou da 2ª Guerra Mundial ou aquele que se lembra dos passeios dos trens da Cia. Paulista de Estrada de Ferro.
Segundo os dados do IBGE, a parcela da população barretense maior de 60 anos é do total de 7.988 mil habitantes. Estes idosos são como a história, isto é, eles auxiliam-nos a entender o presente através dos recursos do passado. Pois, o que seria da memória de Barretos se não fosse os escritos de José Vicente Dias Leme? Os primórdios do futebol barretense com os irmãos Antônio e Alberto de Barros? A amizade do Prof. Nazim Chubaci? O jornalismo de Monteiro Filho? As histórias contadas por Luiz Brandão sobre seu pai (o primeiro prefeito da cidade)? A infância mineira da Aidê que trabalha no Museu? As lembranças da escravidão dos avós da Dona Lourdes? As recordações teatrais do pai da Dona Albília Thereza e do irmão da Dona Therezinha Marques? E ainda os contos que meu avô Antônio adora falar sobre os prefeitos?
Entre muitos outros que aqui não cabem nestas linhas, estas pessoas fazem parte de uma população viva, demasiadamente sábia e que jamais deverão ser consideradas como obsoletas. Portanto, devemos nos espelhar no pensamento da fabulosa escritora Ecléa Bosi: “O velho não tem armas. Nós é que devemos lutar por ele”.

REFERÊNCIA:
BOSI, Ecléa. Memória e Sociedade: Lembranças de Velhos. São Paulo: Companhia das Letras, 1994.
Revista “A Terceira Idade: Estudos sobre Envelhecimento”. Publicação do SESC-SP, Volume 19 – nº 43 – outubro de 2008.


ARTIGO PUBLICADO NO JORNAL ''O DIÁRIO'' (BARRETOS / SP), EM 19 E DEZEMBRO DE 2008.

A ARTE DAS CARTAS


Historicamente, os homens mantiveram relações de comunicação social por diferentes métodos e épocas. Deste muito tempo até dez anos atrás, o método mais utilizado para a comunicação escrita eram as cartas, por maiores que fossem as distâncias permitiam os contatos familiares, profissionais, amorosos, acordos políticos e podiam até servir como documentos oficiais. Além disso, o ato de escrever possibilitou a aproximação do homem com sua própria língua, desenvolvendo e aprimorando as técnicas da escrita.
Pode-se ainda traçar um paralelo entre as cartas e a arte, resultando no que se denominou de “arte postal”. No auge dos anos 60 e 70, os “artepostalistas” ao utilizar da ousadia e abstração das cartas produziam uma técnica de arte diferente da convencional. Através dos correios, a arte postal era produzida com as trocas das cartas entre os artistas, onde tanto o conteúdo da carta quanto o envelope apresentavam fotografias, pinturas, gravuras, poemas, colagens, dentre outros. A intenção era provocar a espontaneidade da fusão da arte com a comunicação, algo que fugisse do padrão das cartas comerciais e despertasse uma nova forma de arte.
Nos tempos atuais, as cartas manuais entre as pessoas estão deixando de existir por conta da “revolução tecnológica” trazida pela internet. As mensagens on-line são transmitidas instantaneamente por emails, onde são arquivados ou apagados da caixa de entrada. A maior vantagem dos emails é o curto prazo de tempo em que são enviados e respondidos, entretanto, se acontecer algum problema com os computadores que armazenam estas informações, estas podem ser extintas.
É claro que a tecnologia da internet é muito bem-vinda em nossa sociedade, já que facilitou a vida de muitas pessoas, nas quais o pouco tempo do cotidiano pode ser um grande inimigo. Mas, isso não quer dizer que as cartas manuscritas devem ser descartadas. Se assim for, o que acontecerá com a grafologia? Este estudo analisa o comportamento psicológico dos indivíduos através de suas próprias escritas e é muito recomendado em pesquisas históricas e de outros teores.
Aproveitando, pois, do espírito natalino, que tal retomarmos a arte postal dos anos 60 e enviar cartas artísticas uns aos outros? Afinal receber cartas somente de cobranças comerciais e bancárias não é nada agradável. O que vale neste momento é a expressão dos sentimentos humanos inscritos em sábias palavras neste natal. Abusem da criatividade!


REFERÊNCIA: SESC SP, Revista E: Dezembro de 2008, nº 6, ano 15.


ARTIGO PUBLICADO NO JORNAL ''O DIÁRIO'' (BARRETOS / SP), EM 12 DE DEZEMBRO DE 2008.

ALÉM DO ENTRELAÇAR


Saberes que se entrelaçam,
Mãos e pés num vai-e-vem,
Vidas que escondem muitos segredos...
(Maria Stela da Costa Gondim)

O homem em toda sua existência possuiu e ainda possui diversos saberes ligados a própria vida social e ao trabalho. Por isso, ainda temos a chance de buscar no passado a origem destes saberes para desta forma associá-los ao presente e valorizarmos a cultura de nossa própria família. Em tempos atrás, o trabalho era substancialmente dividido entre os vários membros de uma mesma família, sendo o trabalho doméstico das mulheres de suma importância para o desenvolvimento da própria comunidade.
É neste contexto que podemos inserir o trabalho de tecelagem manual, praticado por muitas mulheres da região, transmitido de mãe para filha e possuidor de curiosos saberes. Trata-se de um processo milenar de origem no Oriente Médio, no qual utilizavam-se as fibras e corantes naturais para a produção e tingimento dos tecidos. Com a tradição portuguesa de tecelagem manual, tal atividade difundiu-se no Brasil nas regiões de Minas Gerais (sul e Triângulo Mineiro), Goiás e norte de São Paulo.
As produções têxteis eram utilizadas para a fabricação de artefatos de cama, mesa, banho e vestimentas, com a finalidade do uso da própria família, da vizinhança ou a comercialização. O processo de tecelagem é iniciado com o corte da lã do carneiro (tosquia) ou a partir da colheita e limpeza manual do algodão. Em seguida, é necessário retirar a semente do algodão utilizando o “descaroçador de algodão”. Como o algodão vem sujo da colheita, para limpá-lo usa-se o “batedor de algodão” e o “par de cardas”, assim as fibras ficam paralelas e forma-se uma fita ou pasta homogênea de lã que logo é depositada no balaio. Com a “roca de fiar” a pasta é alongada, retorcida e sua espessura é moldada para aumentar seu tamanho, e o fio é feito conforme a força no pedal da fiandeira. Por último, é iniciado o processo de tingimento e depois o entrelaçamento cruzado dos fios até se formar o tecido.
De fato, o trabalho manual de tecelagem das mulheres foi substituído pelo avanço tecnológico e científico da industrialização rápida. Por este motivo, não é mais comum encontrar aquelas senhoras que se juntavam com suas “rocas de fiar” na comunidade para tecer e cantar o dia todo. O que restou foram as lembranças resgatadas pelas peças dos museus, o próprio Museu Histórico, Artístico e Folclórico “Ruy Menezes” expõe deste conjunto de tecelagem manual em seu acervo, dentre eles uma colcha confeccionada neste processo por uma ex-escravizada. A todas as artesãs dos teares fica o pedido de resgatarem e transmitirem seus ofícios, assim como lhe foram feitos. E àqueles que não conhecem tais ofícios: Visitem o Museu!

REFERÊNCIA:

Projeto “Tecendo Saberes” de Maria Stela da Costa Gondim e Gerson de Souza Mól.


ARTIGO PUBLICADO NO JORNAL ''O DIÁRIO'' (BARRETOS / SP), EM 05 DE DEZEMBRO DE 2008.

UM ROMANCE DOLOROSO


Por muito tempo, a história foi escrita exaltando somente os heróis das grandes guerras, políticos importantes e os fatos marcantes, por isso a história era construída com base no machismo. Entretanto, a tendência historiográfica contemporânea é realizar pesquisas estruturadas nos mais diversos elementos de toda a sociedade, tais como as mulheres, as crianças, os operários, os índios e a família. Destaquemos então a presença das mulheres do século XX que muito lutaram em meio aos preconceitos que sofriam.
Pois bem, entre alguns documentos, o acervo do Museu “Ruy Menezes” ostenta uma curiosa carta datada de 15 de maio de 1922. Escrita por Olyvia, em Goyaninha, distrito a seis léguas da cidade de Missão Velha, a carta apresenta pela própria autora a seguinte definição: “Tenha paciência, descanse para então terminar a leitura. Desculpe-me. É um romance doloroso!”. Olyvia era mãe de quatro filhos: César, Irineu, Maria Stella e Maria Julieta e ficou viúva em 1915.
Com esta situação, a forte mulher escrevia a seu irmão para buscar soluções aos problemas que enfrentava em sua viuvez. Olyvia trabalhava na Agência do Correio e para conseguir este emprego teve até mesmo que vender o gabinete dentário de seu marido como fiança. Além do mais, sofria grandes dificuldades, violência e amargos preconceitos das outras mulheres da cidade e dos familiares. Com a consistente fé religiosa, a viúva indagava ao irmão: “Qual pharol luminoso poderá guiar-me na senda escabrosa da viuvez?”.
Ainda não sabemos o final desta história, contudo, é notável nesta sofrível vida a religiosidade presente, a saudade do amado marido, a luta em vencer os preconceitos e cuidar dos filhos. As pesquisas atuais da internet apontam que a cidade de “Goyaninha” era pertencente ao Estado do Ceará, hoje denominada “Jamacaru” (CE) distante 21,1 km de Missão Velha.
A carta de Olyvia, carregada de emoções e dissabores, informa como as mulheres da época passavam pelas dificuldades da vida e ainda conseguiam manter-se na fé e ser mães, esposas e trabalhadoras. Com a postura patriarcal, o trabalho doméstico das mulheres foi inferiorizado conforme o tempo e a sociedade. Logo, não sejamos preconceituosos e anacrônicos em pensar que Olyvia foi uma mulher que levava tal vida por vontade própria, ela foi uma das muitas viúvas que enfrentaram e revolucionaram seus tempos, pois, como consta em suas próprias palavras: “...reconhecendo na humanidade que minha capacidade não merece tais infâmias.”


REFERÊNCIAS:
Documentos do Museu “Ruy Menezes”.
www.citybrazil.com.br


ARTIGO PUBLICADO NO JORNAL ''O DIÁRIO'' (BARRETOS / SP), EM 28 DE NOVEMBRO DE 2008.

AVANTE COM INDIANA JONES!


Ao assistir o filme “Indiana Jones e o Reino da Caveira de Cristal” percebi o quanto se produz conhecimento com a união das teorias aprendidas nos livros e a prática de visitar os locais históricos, muitas vezes vistos somente em simples ilustrações de livros didáticos. A área de conhecimento se expande conforme maiores informações podem ser absorvidas e produtivas dúvidas podem ser semeadas e sanadas.
De acordo com os PCNs (Parâmetros Curriculares Nacionais), produzidos pela Secretária de Educação do governo federal, os professores devem praticar estudos do meio com seus alunos a partir de visitas a museus, exposições e sítios arqueológicos. Tais atividades são oportunidades especiais altamente instrutivas, na medida em que possibilitam momentos lúdicos aos jovens, causando dinamismo às teorias que antes eram taxadas como “complexas e cansativas”.
Essa dinâmica é também considerada um recurso didático favorável ao envolvimento do aluno em situações de estudo, pois, incentiva-o a construir suas próprias especulações. Além do mais, em uma visita a localidades culturais os alunos em conjunto criam interação entre suas idéias e dúvidas, permitindo o surgimento de férteis debates e diálogos entre as épocas passadas e a época presente.
Quando se faz a visita é necessário destacar aos alunos a importância das peças, textos, documentos, obras de artes e fotografias guardadas nos museus, em exposições ou objetos antigos encontrados em sítios arqueológicos. Posto que, se as lembranças do passado não estivessem ameaçadas, não existiria a necessidade de criar tais espaços, com a finalidade de deslocar de situações isoladas todos os objetos dignos de recordações, para devolvê-los à sociedade com novas significações.
Inspiremo-nos então na célebre frase de Indiana Jones: “Se você quer ser um bom arqueólogo, tem que sair da biblioteca!”. Em outras palavras, se existe a real intenção em “aprender”, é necessário fundir as idéias teóricas com as experiências vividas para demonstrar o sentido crítico, vivo e dinâmico do processo de aprendizagem, porque somente observando o ambiente estudado que se conhece verdadeiramente sua história.

REFERÊNCIA:
BRASIL. Secretaria de Educação Fundamental. Parâmetros Curriculares Nacionais: História. Ensino de 5ª a 8ª série. Brasília: 1998.


ARTIGO PUBLICADO NO JORNAL ''O DIÁRIO'' (BARRETOS / SP), EM 21 DE NOVEMBRO DE 2008.