domingo, 9 de dezembro de 2012

A “ÚLTIMA” VONTADE: TESTAMENTOS COMO FONTES


ARTIGO PUBLICADO PELA PROFª ESP. KARLA O. ARMANI, EM 9 DE DEZEMBRO DE 2012, NO JORNAL "O DIÁRIO DE BARRETOS"


            A História é mesmo uma ciência incrível, que “bebe” nas variadas fontes escritas (ou não) da trajetória da vida humana. Mas, não só a vida do homem tem a informar sobre o passado, a “morte”, ou melhor dizendo, simbologia e os registros sobre a morte, também pode trazer informações relevantes sobre uma dada sociedade e época. Dentro do estudo sobre a “morte”, dissertações a respeito de rituais, cemitérios e arte tumular têm ganhado força nos últimos tempos, mas, são os documentos a respeito dela que iremos tratar neste texto: os testamentos e os inventários post-mortem; mais especificamente sobre os primeiros.
            O direito do indivíduo em impor sua vontade na partilha de seus bens é o significado sintetizado do conceito de “testamento”, que existe no Brasil desde o Período Colonial. Nesta época, as leis a esse respeito eram estabelecidas pelos ditames da metrópole portuguesa segundo as “Ordenações Filipinas”; e assim vigorou no Brasil até o Império. Somente em 1916, com a aprovação do “Código Civil Brasileiro” que tal ordenamento foi substituído.
            Dada a extensão dos períodos da Colônia, do Império e da República do Brasil, sabe-se que existe uma ampla documentação de testamentos e registros civis guardados nos cartórios, órgãos do judiciários e outros arquivos no território nacional. Os estudos sobre os testamentos, por exemplo, podem gerar importantes pesquisas a respeito da religiosidade, da cultura material (bens materiais e valores de certa época), da escravidão (escravizados forros ou doação aos mesmos), dos excluídos (filhos ilegítimos, escravos, hereges, religiosos professos, mudos-surdos, “loucos”, etc) das famílias (relação de filhos, pais, casamentos, incestos), dentre outros.
            Um dos temas mais interessantes a respeito dos estudos testamentários é a religiosidade, afinal muitos testadores destinavam suas heranças a santos de devoção, cerimônias funebres, missas e instituições de caridade – na intenção de “salvarem” a alma. Nos testamentos analisados em séries, vêem-se expressões que remetem a possíveis mudanças nos ritos religiosos, nas crenças e concepções em torno da morte.
            Em Barretos, um testamento me chamou a atenção pelo perfil do testador e o destino de parte de sua herança. O testador era João Machado de Barros, falecido em 1924, porém tendo registrado seu testamento em cartório em 1918. Sua herança foi destinada as suas duas filhas adotivas, mas um terço dela era para ser revertido à Santa Casa de Misericórdia de Barretos – que na época estava começando a ser construída. Essa quantia, equivalente a aproximadamente 50 contos de réis, era chamada de “terça”, e era muito comum naquela época de mentalidade religiosa. Outros detalhes do testamento chamam a atenção para o caráter religioso, como o fato do mesmo iniciar com os dizeres “...dizem no ano do nascimento no nosso senhor Jesus Christo de mil novecentos...”, e também citar os nomes dos padrinhos de batismo do testador.
            Muitos detalhes sobre a mentalidade e a vida material das pessoas que viveram na cidade nos séculos XIX e XX podem ser devendados a partir da análise histórica dos testamentos. Para isso, é necessário que tais documentos continuem sendo preservados pelos órgãos responsáveis. “Que assim seja”!

Fonte: Texto de Junia F. Furtado: “A morte como testemunho da vida” /
Arquivo do 2º Tabelionato de Barretos, Escrituras nº 92, f. 42-43.   

O EXÉRCITO, A HISTÓRIA E A MÍDIA


ARTIGO PUBLICADO PELA PROFª ESP. KARLA O. ARMANI, EM 2 DE DEZEMBRO DE 2012, NO JORNAL "O DIÁRIO DE BARRETOS"


            No último dia 26 de novembro um fato inédito aconteceu no Exército do Brasil: uma mulher conquistou um cargo de oficial general das Forças Armadas. Dalva Maria Carvalho Mendes recebeu a patente de “Contra-Almirante” da Marinha depois de muitos anos de serviços prestados ao exército. Formada em medicina, Dalva fez parte da primeira turma do corpo auxiliar feminino de oficiais da Marinha do Brasil de 1981.
            Este fato atraiu muito a atenção da mídia brasileira pelo “brilho” da patente da contra-almirante e também pelo fato de tal cargo ser destinado a uma mulher. Esta notícia causa tanto entusiasmo pelo fato do Exército ser historicamente associado a figuras masculinas. Deste modo, o recebimento de tal patente numa instituição que até então era predominantemente masculina, representa a evolução e as conquistas da mulher não só no lado profissional, bem como no aspecto social e cultural da comunidade brasileira.
            Tal novidade na Marinha desperta-nos a lembrança de outro episódio ocorrido há mais de cem anos atrás no Rio de Janeiro; a Revolta da Chibata. Ao contrário da relevância dada a primeira mulher “contra-almirante” da Marinha na atualidade, a Revolta da Chibata parece não ser reconhecida pela instituição. Especula-se que, esta posição do exército assim se deu por conta deste conflito ter sido iniciado pelos marinheiros; então componentes de cargos rasos da Marinha.
            Era 22 de novembro de 1910, no Rio de Janeiro, quando os marinheiros tomaram alguns “couraçados” da Marinha e ameaçaram bombadear a capital do Brasil; que na época contava com estimados 900 mil habitantes. Sob a liderança de João Cândido, o “Almirante Negro”, os marinheiros protestavam diante às punições da “chibata” que recebiam, a péssima alimentação e os maus-tratos. Mais de 2.300 marinheiros participaram desta revolta, que contava com a tomada de pelo menos quatro grandes navios da Marinha brasileira. Depois de alguns dias de tensão por parte dos revoltosos e dos civis cariocas, o governo brasileiro aprovou as reivindicações dos marinheiros e a lei de anistia. No entanto, pouco tempo depois, a lei foi revogada e novos confrontos começaram; o que resultou em massacre, prisões e exílio de marinheiros.
            Segundo algumas fontes, este episódio não é reconhecido pela Marinha do Brasil, porém, os livros didáticos de História já o tomaram como parte importantíssima do contexto histórico da Primeira República no Brasil. As vozes dos marinheiros, última instância na Marinha do Brasil, estão sendo estudadas e disseminadas na história do povo brasileiro. Inclusive, a mídia televisiva está apresentando este episódio como “pano de fundo” da atual novela das seis da Rede Globo; “Lado a Lado”.
            Que a relevância que foi dada a primeira mulher general oficial das Forças Armadas do Brasil também seja estendida ao levante dos marinheiros de 1910. Afinal, independente de gênero e “altura” das patentes, todos os configurados do exército, em especial àqueles que lutaram por melhorias e conquistas, são de fato importantes à instituição e à história do Brasil! 

CARTOLA: O POETA DO SAMBA


ARTIGO PUBLICADO PELA PROFª ESP. KARLA O. ARMANI, EM 25 DE NOVEMBRO DE 2012, NO JORNAL "O DIÁRIO DE BARRETOS"


“Queixo-me às rosas / Mas que bobagem, as rosas não falam / Simplesmente as rosas exalam... o perfume que roubam de ti” (Cartola).
           
As palavras acima são parte de uma das mais belas canções brasileiras, “As rosas não falam”, de autoria do “Mestre” Cartola; um verdadeiro “trovador” brasileiro. Assim podemos dizer, por causa da intensidade das letras de suas canções, que quando tocadas, revelam mensagens de amor e de inspirações para a vida. Cartola, mesmo nascendo no início do século XX, continua a ser sempre citado no que diz respeito à música popular brasileira e, principalmente, ao samba; já que ele foi um dos primeiros sambistas do Rio de Janeiro.
Como o samba também suas raízes nos batuques africanos e seus primeiros representantes eram negros, Cartola não podia ser diferente. E, como tal, na última semana, quando se comemorou o dia da Consciência Negra, Cartola foi por diversas vezes citado na mídia, tanto por suas canções encantadoras, quanto por sua história de vida. Falemos, então, um pouco sobre a biografia do “mestre do samba”, que mesmo entre “pedras no caminho” fez de sua música uma inspiração à vida.
Chamava-se Angenor de Oliveira, nascido no Rio de Janeiro, então capital do Brasil, em 1908. Aos 11 anos mudou-se para o Morro da Mangueira, local que evidenciaria seu sucesso, pois desde muito cedo já tocava cavaquinho. Parou de estudar aos 15 anos, quando sua mãe faleceu, completando somente o ensino primário. Depois disso, trabalhou em tipografias e como pedreiro; quando adquiriu o apelido de “Cartola” em razão de usar um chapéu (a cartola) para não deixar que o cimento o sujasse.
Em 1925, ao lado de amigos, como Carlos Cachaça, fundou um bloco de samba, que, três anos depois, se fundiu com outros e formou a “Estação Primeira de Mangueira”; uma das mais tradicionais escolas de samba cariocas. Como suas canções de samba faziam sucesso na “Mangueira”, na década de 30, Cartola se destacou como compositor e teve suas canções gravadas por artistas de renome na época, como Carmem Miranda, Mário Reis, Francisco Alves, Noel Rosa, Silvio Caldas e Araci de Almeida. Na década de 40, por conta de problemas pessoais (há quem diga que foi de saúde), ele desapareceu do cenário musical; somente em fins dos anos 50, voltou a cantar. Na década de 60, abriu um restaurante com sua esposa, o “Zicartola”, que era ponto de encontro dos sambistas do morro. Em 1974, gravou seu primeiro LP aos 66 anos; sendo dois anos depois o lançamento de seu segundo LP e de seu primeiro show individual. A partir de então, gravou mais discos, fez apresentações e shows, até sua morte em 1980.
Desde então, o “mestre” Cartola nunca parou de ser citado na mída, no samba e até na poesia. Talvez, mais do que a brasilidade do ritmo de suas canções, seja a poesia das letras de Cartola que o tenham eternizado no tempo. As letras de suas canções são tão belas que chegam a dar mais brilho à língua portuguesa, afinal usar tão bem os verbos, as rimas e as expressões brasileiras só é possível para um original “poeta do samba”.

CONSCIÊNCIA NEGRA: REFLEXÕES


ARTIGO PUBLICADO PELA PROFª ESP. KARLA O. ARMANI, EM 18 DE NOVEMBRO DE 2012 NO JORNAL "O DIÁRIO DE BARRETOS"


            Na semana da “Consciência Negra” é comum refletirmos sobre o passado da comunidade negra e, principalmente, sobre suas conquistas na sociedade. Assim, falar a respeito da inserção dos negros no atual mercado de trabalho, bem como seu acesso à saúde, educação e moradia são assuntos discutidos neste período. Mas, e na escola? Como trabalhar a semana da Consciência Negra? O que a sala de aula pode trazer de reflexão aos alunos a respeito disso?
            As aulas de História, assim como as outras áreas das ciências humanas, têm muito a oferecer sobre este assunto; afinal não há nada melhor que estudar o passado, a cultura e a memória para se refletir sobre as problemáticas atuais. Deste modo, discutir a respeito não só da escravidão, das fugas e das punições são questões importantes sobre a consciência negra; mas, principalmente, pensar sobre as africanidades, as heranças culturais e as contribuições dos negros.
            Além do mais, tratar destas questões é algo definido por lei federal no Brasil (lei 10.693/03), onde o ensino de História insere em seu currículo a “história e cultura afro-brasileira e africana” como parte integrante da disciplina de História. Neste sentido, o professor de História deve trabalhar com os alunos a trajetória da cultura africana e sua relação com a afro-brasileira. Na prática, estes conceitos podem ser desenvolvidos com os alunos dos 6º, 7º, 8º e 9º anos, haja vista que são nestes períodos que são trabalhados respectivamente os conteúdos referentes à África na Antiguidade, Islamismo, Grandes Navegações, Colonialismo, Tráfico, Escravidão no Brasil, Resistência e Quilombos, Revoltas, Leis Abolicionistas, Abolição, heranças culturais, Imperialismo, Descolonização e Movimentos de Libertação Nacional.
Em todos os ciclos escolares, mesmo com o “tempo apertado”, é possível que o professor de História sempre trabalhe os conteúdos da história africana e afro-brasileira, para que o aluno construa em sua mentalidade a importância da contribuição africana na história do nosso país e a presença do elemento africano em nossa cultura. Sendo assim, fica visível, e até “natural”, pensar que não há Brasil sem África, visto que foi do continente africano que saiu grande parte daquilo que chamamos de cultura brasileira.
É por essas e outras, que o 1º artigo da lei 10.639/03 declara a importância do estudo da História da África e dos Africanos, a luta dos negros no Brasil, a cultura negra brasileira e o negro na formação da sociedade nacional, resgatando a contribuição do povo negro nas áreas social, econômica e política pertinentes à História do Brasil”. Logo, através do estudo da cultura africana e afro-brasileira, que a História pode contribuir como reflexão na semana da “Consciência Negra”.

“LIBERDADE, LIBERDADE, ABRE AS ASAS SOBRE NÓS!”


ARTIGO PUBLICADO PELA PROFª ESP. KARLA O. ARMANI, EM 11 DE NOVEMBRO DE 2012 NO JORNAL "O DIÁRIO DE BARRETOS"


Liberdade, liberdade!
Abra as asas sobre nós
E que a voz da igualdade
Seja sempre a nossa voz.
            Leitor amigo, você já ouviu este refrão de música? Ele está muito conhecido ultimamente pois é parte da abertura da novela “Lado a Lado”, da Rede Globo. A novela trata do Rio de Janeiro durante os primeiros anos da República do Brasil e tal música faz referência exatamente sobre esta época. Esta canção foi samba-enredo da escola de samba “Imperatriz Leopoldinense” no carnaval de 1989; ano em que a República brasileira completaria 100 anos de proclamação. A mesma República que, na próxima quinta-feira, dia 15 de novembro, completará 123 anos.
Na canção “Liberdade, Liberdade, Abre as asas sobre nós”, o tema da “República” é retratado como resultado de uma série de acontecimentos que o antecederam. Como, por exemplo, o fato do Império no Brasil ser uma instituição anacrônica (“O Império decadente, muito rico, incoerente”); a Guerra do Paraguai e o Duque de Caxias (“Da guerra nunca mais, esqueceremos o patrono, o duque imortal”); os imigrantes europeus que trabalharam nas lavouras de café e mais tarde nas indústrias (“A imigração floriu de cultura o Brasil”); a Princesa Isabel e a Lei Áurea (“Pra Isabel, a heroína, que assinou a lei divina”); a Abolição (“Negro, dançou, comemorou o fim da sina”); e o Marechal Deodoro ter proclamado a República em 15 de novembro de 1889 (“Na noite quinze reluzunte; com a bravura finalmente; o marechal que proclamou, foi presidente”).
O mais interessante deste “samba-enredo”, porém, é o próprio refrão que, na verdade, é uma “nova” versão do Hino da República do Brasil. Assim, que a República foi proclamada, já em janeiro de 1890, o governo republicano, interessado em criar novos símbolos que despertassem o povo para aquele recente regime político, quis criar um hino da República brasileira. Depois de vencer o concurso para a composição de tal hino, o político e escritor José Joaquim de Campos da Costa de Medeiros e Albuquerque compôs a letra e o músico Leopoldo Miguez fez a melodia.
O original “Hino da República do Brasil” então passou a ter o seguinte refrão: “Liberdade, Liberdade, Abre as asas sobre nós! / Das lutas na tempestade / Dá que ouçamos tua voz”. E foi exatamente esta parte que a escola Imperatriz, cem anos depois, parafresou em uma versão nova na Sapucaí. O hino original fazia menção também aos fatos passados como a escravidão (“Nós nem cremos que escravos outrora / Tenha havido em tão nobre país”), as novidades republicanas como o sufrágio universal masculino (“Somos todos iguais”) e aos novos símbolos como o “herói nacional” Tiradentes (“Sangue vivo do herói Tiradentes”).
Com a criação do Hino Nacional, em 1909, o Hino da República foi perdendo espaço e apreciação. Fato que foi retomado um século depois com a escola de samba “Imperatriz Leopoldinense” e agora está, novamente, sendo revivido na novela; mesmo sendo esta uma história fictícia. Mas, o Hino da República ainda pode ser resgatado nos dias de hoje pelas escolas, onde as aulas de História podem utilizá-lo como fonte para o aprendizado a respeito dos anos inciais da República brasileira. Uma República centenária e rica em símbolos e memórias! 

OS CORONÉIS DA GUARDA NACIONAL


ARTIGO PUBLICADO PELA PROFª ESP. KARLA O. ARMANI, EM 4 DE NOVEMBRO DE 2012 NO JORNAL "O DIÁRIO DE BARRETOS"


            Leitor amigo, já reparou que boa parte das escolas, ruas e praças de Barretos tem nomes de coronéis? Sem querer, nomes como “Cel. Almeida Pinto”, “Cel. Raphael Brandão”, “Cel. Silvestre de Lima”, entre outros, passam por nosso cotidiano e acabam sendo retidos por nossas memórias. Mas, quem foram estas pessoas? O que de fato era ser um coronel? Especulemos então.
            A designação “coronel” nada mais era do que uma patente da Guarda Nacional. Esta instituição, inspirada nos modelos franceses, surgiu durante o período das Regências no Brasil, em 18 de agosto de 1831. Nesta época, a nação brasileira passava por crises políticas, em razão da abdicação de Pedro I, e sociais, por conta das revoltas provinciais. Em pelo menos quatro províncias do Brasil, cinco revoltas abalaram a estrutura governamental e ameaçaram a unidade territorial. Por isso, o governo regencial criou a Guarda Nacional – extinguindo os corpos de milícias e a Guarda Municipal, para garantir a “ordem” e agir quando necessário interna e externamente no território nacional.
            Como de praxe na época, para fazer parte da lista dos membros da Guarda Nacional, era necessário ter as mesmas condições para ser eleitor e votante, isto é, homem, maior de idade, com renda mínima anual, além do alistamento ser obrigatório dos 18 aos 60 anos. Somente os mais abastados ocupavam as patentes mais altas da Guarda Nacional, como “coronel”, “major”, “capitão” e “tenente”; títulos disputados entre os mais ricos de cada localidade. Sendo assim, por muito tempo, os membros das mais altas patentes da Guarda Nacional eram aqueles pertencentes à elite agrária brasileira, os fazendeiros, e por isso a designação “coronel” acabou por virar sinônimo de latifundiário. Além disso, sabe-se que tais coronéis utilizavam de meios violentos e da “troca de favores” para fazer seus trabalhadores votarem nos candidatos de seus interesses, depois da Proclamação da República.
Ao longo do século XIX, a Guarda Nacional contribuiu para a “segurança nacional”, já que o exército brasileiro só foi remodelado a partir da Guerra do Paraguai (1864). Mas, a principal atuação desta instituição foi na “ordem” pública dos munícipios, essencialmente àqueles que se emanciparam após o regime republicano de 1889. E assim foi com Barretos, que teve a Guarda Nacional criada no final do século XIX e reorganizada em 1902, quando o dr. Antonio Olympio era o chefe do diretório republicano na cidade. Em 1918, ocasião em que a Guarda Nacional começou a ser extinta e absorvida pelo Exército, Barretos já possuía seis brigadas – cinco infantarias e uma cavalaria.
            Os coronéis da Guarda Nacional, alguns mais atuantes na área rural e outros na cidade, continuam gravados de alguma forma na nossa cidade, mesmo passado tanto tempo desde sua extinção. Então, seria interessante que tivessemos conhecimento sobre a ação deles em Barretos e porque seus nomes continuam por aí... quem sabe até na sua própria rua, leitor amigo. Pensemos. 

“BRASIL NAÇÃO”: HISTÓRIA E IDENTIDADE


ARTIGO PUBLICADO PELA PROFª ESP. KARLA O. ARMANI, EM 28 DE OUTUBRO DE 2012 NO JORNAL "O DIÁRIO DE BARRETOS"

            A História é uma ciência discutida desde os tempos da Grécia Antiga, afinal o “pai” da história foi o grego Heródoto (século V a.C). Durante os períodos da Antiguidade, do Medievo, da Era Moderna e da Contemporaneidade, a História se manifestou nas sociedades como uma ciência que não estuda só o passado, mas utiliza-o como um elemento comum ao povo de um mesmo território, aliás de uma “nação”. A História era a base para a construção da ideia de “nação”.
            Com o Brasil, não foi diferente.
            Nos tempos coloniais, o Brasil era preso ao Sistema Colonial e se comportava como uma imitação estendida da metrópole portuguesa. A partir da Independência (1822), para assegurar a unidade nacional, o governo buscava construir a imagem do Brasil como uma “nação independente”. Para isso, passou a utilizar-se daquilo que criaria um carater “identitário” ao povo: a sua história; algo que ainda não tinha sido construído naquela recente “ex” colônia.
            Essa busca pela “História do Brasil” se tornou mais vigente durante a década de 1830, no Período Regencial. Nesta época, o Brasil era governado por regentes (trinos e unos), porque o imperador Pedro I havia abdicado seu trono em 1831 e o príncipe regente tinha somente cinco anos de idade. A situação estava “tensa” para o governo, uma vez que o Brasil era a única “nação” regida pelo sistema monárquico na América naqueles anos oitocentos. Ainda mais, nesta mesma década, pelo menos cinco revoltas sociais estouraram nas províncias do Grão Pará, Bahia, Maranhão e Rio Grande do Sul. A Cabanagem, Sabinada, Revolta dos Malês, Balaiada e Farroupilha demonstraram a insatisfação popular diante o governo regencial e ameaçavam a unidade da nação.
            A “História do Brasil”, mais do que nunca, começou a ser criada com a fundação do IHGB (Instituto Histórico e Geográfico Brasileiro) em 1838. O estudioso europeu Karl Von Martius foi o responsável pela primeira escrita da história do Brasil. Sua pesquisa ficou muito conhecida, afinal ele procurou demonstrar a miscigenação e a contribuição de cada uma das raças do povo brasileiro, tais como os portugueses e os africanos. Mas, foi no “indígena” que Von Martius destacou a particularidade dos brasileiros, como descendentes destes nativos. A partir de então, iniciou-se uma valorização e romantização perante a figura do “índio” que era vista em pinturas (como as de Vitor Meirelles), na literatura (José de Alencar) e até na música (“O Guarany” de Carlos Gomes).
            E foi assim que nasceu a “História do Brasil”, intencionalmente, para dar uma cara de “nação” a uma terra que havia sido colônia por mais de trezentos anos, mas que agora queria ter a sua própria história. Uma história geral do Brasil.

DOS CURANDEIROS AOS MÉDICOS


ARTIGO PUBLICADO PELA PROFª ESP. KARLA O. ARMANI, EM 21 DE OUTUBRO DE 2012 NO JORNAL "O DIÁRIO DE BARRETOS"


            No dia 18 de outubro, que já se passou, foi comemorado o “dia do médico”. Por isso, seria interessante falarmos a respeito dos primeiros médicos que se instalaram em Barretos e suas dificuldades diante uma população que só conhecia os curandeiros. Hoje, com todos os avanços na área da medicina e o acesso à saúde (mesmo com tantos problemas), talvez seja difícil imaginar a vida sem os médicos, os hospitais, os remédios. Mas, assim era Barretos há mais de um século atrás...
            No século XIX, quando Barretos ainda era uma vila e a vida da população se pautava num ambiente ruralizante, quase não se via médicos por essas bandas. Quando alguém ficava doente, logo se recorria a um curandeiro para que através de “benzeções”, simpatias e poções se estabelecesse a cura. O interessante é que muitos destes curandeiros também eram coronéis, que além de exercer o poder político, acumulavam várias funções como advogados, professores e até curandeiros! Para se ter ideia da raridade de um médico, conta-nos Osório Rocha que, por volta de 1890 existia na cidade o então “médico” “Dr.” João Batista Soares. Mas, depois descobriu-se que este título não lhe pertencia de fato, porque, na ocasião da Guerra do Paraguai, ele serviu como soldado ao lado de seu primo João Batista Soares, que era estudante de medicina. Como o mesmo faleceu durante a guerra, ele assumiu a identidade do primo e sua função de médico.
            Os médicos licenciados começaram a aparecer em Barretos após a instalação da República em fins do século XIX e início do XX. Podemos ver alguns nomes deles em propagandas do jornal “O Sertanejo”, onde se percebe que muitos deles moravam em hotéis, atendiam a domícilio e de graças aos pobres! Um deles, por exemplo, era o dr. Mathias Lex, que em 1901 foi o responsável pela campanha de vacinação contra a varíola na cidade.
            A partir da década de 1910, com a instalação da Casa de Caridade (1911, na Sociedade Espírita 25 de Dezembro) e da Santa Casa de Barretos (1921), começaram a se instalar mais médicos na cidade de Barretos. Sendo válido notar, que a maioria destes doutores formava-se nas grandes universidades das capitais e depois vinha atuar na cidade. Dentre eles, podemos destacar o dr. Raymundo Mariano Dias formado pela Faculdade de Medicina do Rio de Janeiro e também o dr. Henrique Pamplona de Menezes, formado pela mesma universidade no ano de 1884! Médicos como estes atuaram em vários setores da cidade, e por isso fazem parte da nossa história.
            Uma história longa, que adentrou o século XX e XXI, onde passaram médicos e “causos” interessantes como o dr. Francolino Galvão de Souza, que fez a primeira cesariana em Barretos no ano de 1934; a dra. Nilda Bernardi, primeira médica mulher da Santa Casa e o dr. Paulo Prata, que junto com uma equipe e sua esposa, fundou o Hospital de Câncer de Barretos. São essas e outras histórias que nos fazem perceber a importância dos médicos, dos hospitais e da saúde na nossa cidade de Barretos.


AO DIA DO PROFESSOR



ARTIGO PUBLICADO PELA PROFª ESP. KARLA O. ARMANI, EM 14 DE OUTUBRO DE 2012 NO JORNAL "O DIÁRIO DE BARRETOS"



            15 de outubro, o dia do professor. Uma profissão que no passado ocupava mais nobre titulação e respeito por parte da sociedade. Sabe-se que as condições da profissão do “professor” atualmente são mais delicadas, principalmente no que diz respeito à jornada de trabalho, salários, titulações e tarefas complementares. Mas, o objetivo deste artigo não é falar destes problemas (que são demasiados graves), e sim homenagear uma das mais antigas e importantes profissões do mundo: a do educador.
            Nos últimos tempos, as redes sociais cada vez mais circulam imagens e textos fazendo menção à profissão do professor como algo negativo e decadente, por conta dos problemas da educação no Brasil. Estas críticas, na visão do senso comum, em vez de levar à reflexão sobre a situação do professor, acabam por somente desvalorizá-lo. Porém, muitos se esquecem que sem o professor não há a formação de nenhum profissional, pois desde o ensino fundamental ao superior, é necessário a atuação deste. E essa necessidade não é algo que vale somente para o fim profissional, mas principalmente à formação do cidadão.
            Todo indivíduo formado em alguma “licenciatura” promete, no dia da formatura, “formar cidadãos”, independente da área de atuação. E este é o principal papel do professor, é com ele que o aluno aprende seus direitos e deveres, a transformar a sociedade de acordo com suas pequenas ações, a viver em comunidade, a conhecer seu espaço, a preservar os bens públicos, a se reconhecer como pertencente a uma certa identidade coletiva, dentre outras coisas. Além, é claro, de ser o professor também o responsável pela aprendizagem nas diversas áreas do conhecimento: ciências humanas, exatas e biológicas. Sendo importante lembrar que, a cidadania passada pelo professor não é sinônimo de educação moral, esta é responsabilidade da família.
            Desta forma, a presença do professor em sala de aula é de suma importância para a aprendizagem do aluno afim de que sempre haja uma “troca” entre os dois, de experiência por parte do professor e de curiosidade por parte do aluno. Assim, a curiosidade e a vontade de aprender do aluno é o que move a atividade do professor, que, através de sua experiência, consegue construir o conhecimento. Às vezes, algumas críticas sobre o futuro acreditam que um dia a profissão do professor irá acabar, em decorrência da desvalorização de sua figura perante à sociedade. Mas, se isso acontecesse, como seriam formados os cidadãos? Como aconteceria a transmissão e a troca de conhecimentos para com o aluno? Quem iria intermediar esta relação?
            O “humanismo” talvez seja a característica mais presente na profissão do professor, afinal não há maneira de ensinar e aprender sem o contato com o aluno, a amizade, o companheirismo, o respeito e a cordialidade. Ensinar, aprender, trocar, formar e construir, são as ações que o professor mais realiza dentro da sua profissão. Tudo isso, regado de muito humanismo, ousadia, coragem e determinação, que, incansavelmente, o professor desperta em si mesmo a cada dia, desde as 6 horas da manhã. Feliz dia dos professores a todos aqueles, que como eu, se orgulham de ter a profissão que forma as demais! Congratulações àqueles que acreditam na educação!

REPÚBLICA: O POVO E A POLÍTICA


ARTIGO PUBLICADO PELA PROFª ESP. KARLA O. ARMANI, EM 7 DE OUTUBRO DE 2012 NO JORNAL "O DIÁRIO DE BARRETOS"


“Cada povo tem o governo que merece, e o nosso, por enquanto, ainda não se mostrou digno de o ter melhor. Quem o afirma, é um republicano” (O Sertanejo, 15/9/1901)
A citação acima é parte de uma reportagem do jornal “O Sertanejo” de Barretos, escrita nos primeiros anos da República brasileira. A reportagem inteira remete ao pensamento de “desilusão” que os “republicanos históricos” (aqueles que lutaram pela República no Brasil desde a época do Império) estavam sentindo em relação ao que tinha se tornado aquele que era para ser o “governo do povo”. Sabemos que a República brasileira foi proclamada pela soberana vontade da elite agrária e dos militares, muito distante do povo. Por isso, a falta de participação popular, as fraudes e a corrupção vigentes naquele período desiludiam aqueles republicanos que, de fato, acreditavam na força da República. E, segundo a reportagem, se o povo não lutava para mudar esta situação, era então merecedor daquele governo corrompido e “degolador”.
Esta reflexão nos permite alcançar os dias atuais. Diferente dos outros países latinos, o povo brasileiro não participou e nem lutou em episódios importantes de sua história, como a Independência do Brasil e a sua Proclamação da República. E isso talvez tenha repercutido nos dias de hoje, principalmente no momento em que o eleitor se depara com as urnas. Afinal, alguns cidadãos brasileiros simplesmente ignoram o processo eleitoral, não refletem sobre as propostas e a trajetória dos candidatos e insistem em dizer que são “apolíticos”.
Apolíticos? Se o próprio cidadão, que é o maior beneficiário (ou, sob outro ponto de vista, o prejudicado) pela representação de sua vontade na política, não se interessar por isso, quem irá se interessar?
Quando a República foi instalada no Brasil, houve a ampliação do conceito de “cidadão” (ainda excluindo os analfabetos, mulheres, etc), mas o voto ainda continuou indireto. Pelo menos até o final da década de 1940, os cidadãos brasileiros votavam primeiro nos vereadores e depois os mesmos elegiam um deles como prefeito. Isso se tornou mais complexo na Era Vargas, onde os interventores do estado nomeavam os prefeitos, já que as Câmaras Municipais tinham sido dissolvidas. Simplesmente, não havia eleições. Barretos foi um exemplo disso, já que na década de 30 foram nomeados onze prefeitos!
Logo, mesmo o povo não tendo tanta participação nas lutas pelas mudanças políticas do Brasil (Independência e República), a história republicana demonstra que a cidadania no Brasil galgou longos passos até chegar nas urnas de hoje. Por isso, o brasileiro deve refletir muito bem antes de “descartar” seu voto, que tanto demorou a ser conquistado. Brasileiro não tem que ser “apolítico”, deve antes colocar a política como uma ferramenta de transformação e representação. Refletemos.

100 ANOS DO GRUPO ESCOLAR



ARTIGO PUBLICADO PELA PROFª ESP. KARLA O. ARMANI, EM 30 DE SETEMBRO DE 2012 NO JORNAL "O DIÁRIO DE BARRETOS"   

           Neste 30 de setembro, mais um centenário a cidade de Barretos tem a comemorar. Os cem anos da Escola Estadual “Dr. Antonio Olympio”, antigo “1º Grupo Escolar de Barretos”, rememora a passagem da escola mais antiga da cidade que ainda está em atividade. De 1912 a 2012, certamente, muitos barretenses têm histórias a contar sobre a escola em sua longa trajetória que perpassou o século XX. Desde o tempo em que o Grupo Escolar possuia aquele belo prédio e até os dias de hoje, os barretenses guardam em sua memória experiências vividas ali, naquele histórico universo escolar.
            O “Grupo Escolar de Barretos” foi inaugurado em 30 de setembro de 1912, com o prédio exatamente no mesmo quarteirão onde ainda se situa. Aquele patrimônio foi doado pela Igreja para se construir o prédio do Grupo Escolar, um edifício de arquitetura neoclássica, que saltava os olhos de quem subia à rua 16. O prédio do Grupo Escolar foi construído pelo artista Pagani Fioravanti, que, ao longo de sua jornada por Barretos no início do século XX, foi o responsável pela edificação de nobres prédios da cidade. Sua arquitetura, de traços ornamentais e arcos nas belas janelas, era a prova da “modernidade republicana” que a instrução pública queria levar àquele recente lugararejo, que desde os anos 1900 fazia campanhas para o governo estadual inaugurar uma escola pública na cidade.
O belo prédio possuía uma arquitetura de forma achatada e baixa que, por isso, lhe rendeu o apelido de “Carrapatão”. Ali, a escola cresceu em número de alunos e classes, e até mesmo mudou de nome, em 1950, para Grupo Escolar “Dr. Antonio Olympio”. Mas, na década de 70, em nome de uma mentalidade “progressista” e “moderna” da época, o prédio do Grupo Escolar foi demolido. Sendo em 1974, inaugurado o novo prédio, com uma distinta proposta arquitetônica, que ainda hoje existe. Com a demolição, que recebeu críticas de uns e aprovações de outros, Barretos perdia um de seus primeiros patrimônios históricos.
Em 1912, quando foi inaugurado o 1º Grupo Escolar, este contava com sete a dez salas instaladas, sob a direção do sr. Sebastião Dias e depois do sr. Oscar de Mello Britto. Ao longo dos séculos XX e XXI, muitos professores e diretores passaram pela escola, além dos alunos que até hoje se orgulham em dizer: “Eu estudei no Grupo Escolar quando ele ainda possuia aquele belíssimo prédio”. Atualmente, a escola é dirigida pela sra. Amália Maria dos Santos Folgosi e possui 16 salas totais do Ensino Fundamental e Médio, além das salas do CEL (Centro de Estudos de Línguas) que também funciona na escola.
É uma felicidade para qualquer barretense dizer que sua cidade tem uma escola centenária e histórica! E que, mesmo não possuindo seu prédio antigo (o que é uma pena), ainda continua em atividade no mesmo local e formando alunos cidadãos através da rede pública. Á todos aqueles que passaram pela escola e ainda fazem parte da mesma, as nossas congratulações pelo centenário. Cem longos anos que Barretos tem a comemorar!