domingo, 19 de janeiro de 2020

1920: LITERATURA E EDUCAÇÃO (PARTE I)


ARTIGO PUBLICADO NO JORNAL "O DIÁRIO DE BARRETOS" EM 14 DE JANEIRO DE 2020 (página 2) PELA PROFª KARLA ARMANI MEDEIROS 
           
Barraca Portuguesa durante a quermesse
realizada na Praça Francisco Barreto, em maio
de 2020, em prol da Santa Casa de Barretos.
(Fonte: Jornal "Barretos Memórias", Barretos/SP,
ed. 7, julho de 1988, p. 5.

(Arquivo do Museu "Ruy Menezes").
            Em 1920, no mês de maio, ocorria em Barretos uma quermesse na Praça Francisco Barreto em benefício da Santa Casa de Misericórdia de Barretos, que viria ser inaugurada no ano seguinte. Durante a quermesse, foi organizado um espetáculo pela Barraca Portuguesa e pelo Ginásio Sírio-Brasileiro para contribuir ao hospital. Tratava-se de uma conferência produzida e lida pela educadora Brasília de Siqueira.
            Esta, havia se instalado em Barretos em 1919, onde chegou a abrir um externato. No ano anterior, havia ficado viúva - seu marido Joaquim Cesar de Siqueira, falecido em Bebedouro, a deixava com cinco filhos. Antes, ela tinha residido em Jaboticabal, cidade em que foi diretora do “Collegio S. Paulo”. Fixada em Barretos e tida como uma professora cuja intelectualidade era visível, foi convidada a palestrar a suas “companheiras de sexo e de estado e aos chefes de família”.
            O título da conferência era “A influência da literatura didática sobre o destino dos povos”, expressão que prenunciava assuntos paralelos e necessários. Acontece que, um mês depois, essa mesma conferência era publicada na “Revista Feminina”, na edição nº 73, de junho de 1920. Nesta publicação, a revista designa a Profª Brasília de Siqueira como “distinta educadora paulista”, e, a respeito de sua conferência em Barretos, a descreve como “uma notável oração, que faz honra às nossas letras”.
            A “Revista Feminina” havia sido criada em 1915 pela jornalista Virgilina de Souza Salles, com sede na capital paulista. Surgiu na intenção de oferecer ao público feminino o acesso à instrução e à literatura, porém, era também produzida à apreciação do sexo masculino, contendo publicações literárias de poetas brasileiros. Por outro lado, era um espaço de diálogo entre as mulheres do país, com oportunidade para dúvidas, comentários e transcrições literárias. Em Barretos, a “Revista Feminina” era distribuída pela Sra. Sebastiana M. Junqueira em 1917, que já tinha conseguido assinaturas anuais da mesma a alguns barretenses e ao jornal “Correio de Barretos”.

Fontes:
- Jornal "Correio Paulistano" (São Paulo/SP) edições 15.961 (19/01/1918, p.1); 19.878 (16/11/1918, p.2) - Arquivo da Biblioteca Nacional.
- "Revista Feminina" (São Paulo/SP), 1920, ed. 73, p. 30-1 - Arquivo da Biblioteca Nacional. 
- Jornal "Barretos Memórias", Barretos/SP, ed. 7, julho de 1988, p. 5 - Arquivo do Museu "Ruy Menezes".
- ROCHA, Osório. Barretos de Outrora. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 1954, p. 296 e 325. 

domingo, 12 de janeiro de 2020

OS LOUCOS ANOS 20

ARTIGO PUBLICADO NO JORNAL "O DIÁRIO DE BARRETOS" EM 7 DE JANEIRO DE 2020 (página 2) PELA PROFª KARLA ARMANI MEDEIROS 
           
"Estrada de Ferro Central do Brasil"
autoria de Tarsila do Amaral, 1924
Coleção do Museu de Arte Contemporânea
da Universidade de São Paulo.
            Eis que o ano de 2020 se anunciou, e com ele se finaliza mais uma década. O ano 20 do século XXI é a transição para o início da nova década, que apenas se anunciará em 2021 e se findará em 2030. É uma passagem para os que se acostumaram em contabilizar o tempo em décadas e gerações. É também o marco para relembrar a experiência do “roaring twenties”, dos “loucos anos 20” – do século passado.
     A expressão “loucos anos 20” é historicamente conhecida por demarcar a efervescência cultural vivenciada nos país europeus, nos EUA e outros países, como o Brasil. Quebra de padrões, vanguardas artísticas, novos hábitos e “modus vivendi” que revolucionaram a literatura, música, teatro, cinema, arquitetura e a moda. O Charleston, o jazz, os programas de rádio, os discos de vinil, as melindrosas de cabelos curtos e as pinturas abstratas apresentavam o que vida queria da arte; e esta da vida.
Um novo tempo se lançou. Um tempo que se firmava como “inédito” pelo fim da 1ª Guerra Mundial e, com ele, o advento de outros modelos políticos, econômicos e diplomáticos. Por outro lado, discursos nacionalistas, disputas ideológicas, modelos sociais e debates entre economia liberal e centralizada também pontuavam aquela década. Um mosaico de povos e pensamentos. O prenúncio de novos conflitos.
No Brasil, no aspecto da cultura, o movimento do Modernismo promovia as vanguardas artísticas, predizendo uma cultura genuinamente brasileira. Porém, na política e economia, ainda se via um continuísmo da velha política do coronelismo, com ares liberais no mercado e intervencionismo no giro do café, além do conservadorismo de praxe à cidadania. Mulheres ainda não votavam e a industrialização caminhava a passos curtos. Porém, foram os anos 20 o período de manifestação, conflitos e lutas pelo que haveria de chegar nos anos 30. Uma anunciação das camadas médias.
Diante disso, impossível não pensar em tudo que mudou e, mais ainda, em como serão os mesmos anos 20, mas agora do nosso século XXI. Também “loucos”?


quarta-feira, 1 de janeiro de 2020

A CULTURA EM EXERCÍCIO (PARTE II)

ARTIGO PUBLICADO NO JORNAL "O DIÁRIO DE BARRETOS" EM 31 DE DEZEMBRO DE 2019 (página 2) PELA PROFª KARLA ARMANI MEDEIROS 


Muito se reclama da tecnologia de hoje, do maniqueísmo de opiniões e exposições desnecessárias nas redes sociais. Existe uma tendência de se elogiar os “bons tempos” do passado, como um momento em que as pessoas se olhavam mais nos olhos e conversavam. Em parte, pode até ser, mas é fato que os smartfones vieram para ficar, e até quem deles reclama, vive a tatear, por eles, o universo da internet. Talvez, por um motivo simples: o fácil acesso à informação (seja verídica, inútil ou perigosa).
Pelas plataformas de canais, aplicativos, vídeos, fotografias e textos, as pessoas se agrupam e fica fácil o alcance da notícia. A vida ali é filtrada. O algoritmo nos leva para terras que queremos, sem nem mesmo saber que queremos. A priori, isso tudo pode parecer loucura, porém, loucura maior é imaginar como será este acesso no futuro.
Transpondo essa situação à nossa realidade, podemos entrecruzar os tempos atuais com o passado; onde um dos assuntos principais em jornais era a cultura e a arte. As fontes históricas da nossa cidade revelam que o acesso à cultura se dava inicialmente pela leitura. O jornal “O Sertanejo”, pioneiro, era o veículo de informação mais rápida para aquela pouca elite letrada que aqui vivia. Anunciavam-se notícias sobre outros países e a política nacional, assim como folhetins literários, assuntos da ciência e eventos recreativos. Somente após a vinda da ferrovia, em 1909, com a melhor possibilidade das visitas de personagens da literatura, artes, política, indústria e ciência, que o acesso à informação se ampliou. Naquele tempo, os agrupamentos de pessoas com assuntos em comum se davam, também, pela união delas em associações e clubes. As instituições eram o ponto material de convívio e reflexão entre as pessoas.
Hoje, as plataformas de acesso e convívio mudaram, e, o acesso literalmente está em um piscar de olhos. Os visitantes não necessitam vir aqui, basta segui-los em seus perfis e curtir seus ‘stories’. A velocidade dessa mudança é o que nos causa estranheza. Mas, se equilibrados formos, saberemos extrair dali o que realmente importa: o conhecimento, o exercício do pensar, a cultura. (É maravilhoso ver o Louvre ao vivo).