terça-feira, 19 de outubro de 2010

UMA CASA DE CARIDADE (II)


            Na semana passada falamos neste espaço sobre a fundação e os trabalhos assistencialistas da Sociedade Espírita “25 de dezembro”. Estes trabalhos faziam parte da formação da própria doutrina e destinavam-se, sobretudo, ao auxílio da comunidade. Como exemplo, a Sociedade Espírita criou o primeiro “hospital” da cidade em 1911, a Casa de Caridade, na qual atendia os doentes necessitados. Para especificar os trabalhos desenvolvidos pelos médicos e funcionários da Casa de Caridade, utilizaremos o Livro de Registros dos Pacientes de 1919, acervo da própria instituição.
            Neste documento consta o atendimento de aproximadamente duzentos e quarenta pessoas no período de um ano e meio, e os registros dos pacientes eram classificados em: nome, filiação, naturalidade, estado civil, cor, profissão, residência, nome do médico, diagnóstico e datas de entrada e saída. Assim sendo, o livro dos pacientes pode nos demonstrar as estatísticas em relação à imigração, o atendimento a população negra e a pessoas de outras regiões, os tipos de profissões e doenças da época.
            Os resultados são os seguintes: os motivos ou doenças que mais afetavam a população na época eram impaludismo (malária), ferimento por bala de fogo, sífilis, reumatismo, bronquite, gripe, pneumonia, tuberculose e, até mesmo, parto natural. Sobre a população atendida verificamos que 56% era de cor “branca”, 20% era “preta”, 19% era “parda”, e pouco mais de 4% era “morena”, “acobreada” e “mulata”. Além disso, a maioria dos pacientes residia em Barretos, mas, doentes de vinte e duas cidades da região, entre o norte de São Paulo e sul de Minas Gerais, também foram atendidos. Dentre o total de pacientes, existiam trinta imigrantes, sendo a maioria italianos, espanhóis, portugueses e turcos, além destes, encontramos também um ou outro imigrante da França, Japão, Alemanha, Ilha da Madeira, Áustria e Argentina. As profissões eram de fato interessantes, uma vez que mostram as necessidades de trabalhadores específicos no momento de transição de uma vida rural à urbana, as principais foram: lavrador, jornaleiro (termo da Idade Média, referente àquele que trabalha por jornada de trabalho), doméstica, comerciantes e empregados, cozinheiro e demais como choffeur, pedreiro, escriturário e peão de boiadeiro.
            Depois de extinta a Casa de Caridade, quando se inaugurou a Santa Casa de Misericórdia de Barretos em 1921, a Sociedade Espírita fundou em suas dependências, no dia 01º de abril de 1922, a “Escola Mixta 25 de Dezembro”, que na ocasião contava com 50 alunos de ambos os sexos, aos quais, desfavorecidos socialmente, recebiam a educação primária. A escola funcionou até meados da década de 30, quando contava já com 83 alunos, e procurava-se um novo professor voluntário que se comprometesse com a educação a par da instrução do Estado e a moral cristã espírita.
            Quantos trabalhos! Quantas histórias! É assim que finalizamos estas poucas linhas com o reconhecimento do trabalho de mais uma instituição que, além de assistir a comunidade, construiu também a nossa história. Á Sociedade Espírita 25 de dezembro!

ARTIGO PUBLICADO NO JORNAL "O DIÁRIO" (BARRETOS/SP), EM 15 DE OUTUBRO DE 2010.

domingo, 10 de outubro de 2010

UMA CASA DE CARIDADE (I)



             No início do século XX em Barretos surgiram algumas instituições que desenharam um novo cenário para o antigo arraial, que, então, passou a ter “forma” de cidade. Estas instituições, desde o início, transformaram o cotidiano de parte da população barretense, que, aos poucos, se adaptava a uma vida mais... “urbana”. De uma sociedade que até então, no século XIX, tinha sua administração regida pela Igreja, os barretenses passaram a ter acesso ao cartório, ao paço municipal, ao cemitério, ao Grêmio Literário, enfim, cada associação com sua respectiva função.
Dentre estas, nota-se também o alvorecer da Sociedade Espírita “25 de dezembro”, que, com a liberdade de culto garantida pela Constituição de 1891, foi fundada em 1906 por membros ligados as outras associações culturais surgidas na mesma época. A doutrina espírita que surgiu na França ainda no século XIX, ganhava novos adeptos no Brasil a partir de estudos filosóficos, científicos e experimentais discutidos por intelectuais da época, e em Barretos sua adesão também era expressiva. Havia, portanto, a necessidade de abrigar uma instituição comprometida com sérios estudos das causas sobrenaturais, e que tinha por finalidade a pregação da caridade e a divulgação das obras da doutrina.
Foi então que, em 25 de dezembro de 1906 foi fundada a primeira Sociedade Espírita de Barretos, hoje uma das mais antigas casas espíritas em funcionamento do Brasil, e sempre atuante em trabalhos assistencialistas que mantiveram compromisso com a comunidade. A começar pela criação do primeiro hospital de Barretos, a Casa de Caridade, fundada em 1911 e extinta em 1920, quando em 1921 houve a fundação da Santa Casa de Misericórdia de Barretos. Durante o período de seu funcionamento, o diretor-clínico da Casa de Caridade foi o médico maranhense Raymundo Mariano Dias e, segundo o livro de registro dos pacientes, atuavam como médicos sete homens: Dr. Henrique de Menezes Pamplona, Dr. Marcos Candido Martins, Dr. José Gurjão, Dr. José Caldas, Dr. Guilherme Gonçalves, Dr. Alves Martins e Dr. Frederico Toledo. Dentre os quais, pelo menos três estavam presentes no primeiro corpo clínico da Santa Casa.  
            O livro de registro dos pacientes, acervo particular da instituição, é datado de 1919 a 1920 e nele constam informações preciosas da época. Quer saber mais sobre alguns detalhes da Casa de Caridade e outras atividades da Sociedade Espírita “25 de dezembro” no passado? Então... aguarde até a próxima semana! Estaremos aqui neste mesmo espaço.

REFERÊNCIAS: Acervo particular da Sociedade Espírita “25 de Dezembro”.

      ARTIGO PUBLICADO NO JORNAL "O DIÁRIO" (BARRETOS/SP), EM 08 DE OUTUBRO DE 2010.

AS FONTES DA NOSSA HISTÓRIA


            É hábito entre alguns barretenses guardar os antigos pertences de família como se fossem peças raras de valor simbólico, preciosas aos olhos da memória da cidade. Outros, porém, não se atém a tamanho cuidado, uma vez que nem passa pela mente a ideia de que certos objetos poderiam ser uteis sê somados a contextos históricos. Em poucas palavras, guardar peças ou documentos dos antepassados é significativamente positivo do ponto de vista da história local, ainda mais se ter como conseqüência a “divisão” destes pertences com a comunidade, seja através de doações ou empréstimos para trabalhos acadêmicos sérios e comprometidos com a verdade histórica.
            Fotografias, documentos, jornais, cartas, objetos, gravações, ilustrações, mapas, projetos arquitetônicos e demais registros são fontes de estudos para historiadores que intentam resgatar a integridade de determinados períodos históricos. Assim sendo, os pertences antigos de uma família guardados cuidadosamente ao longo de muitos anos podem se transformar em instrumentos de trabalho a um historiador, que os utiliza com o maior cuidado possível, sempre respeitando o material e o comprometimento com a família. Deste modo, o historiador se torna uma espécie de “detetive” tentando juntar o máximo de peças possíveis para formar o quebra-cabeça do recorte histórico que ele escolheu. Além dos documentos e objetos em si, o historiador utiliza como ferramentas as luvas - para proteger a si mesmo e o próprio material que deve ser manuseado com zelo; máscaras - caso o material seja muito antigo e um tanto tóxico; lupas - para decifrar as antigas caligrafias escritas à caneta de pena, dentre outros. É necessário ainda, a total concentração na leitura e análise dos documentos, as anotações de detalhes, a memorização de dados relevantes no trabalho e o entendimento do contexto histórico da época estudada, pois os documentos isolados não falam por si só.
            As fotografias podem revelar detalhes que vão além do que está explicito, por exemplo, podem mostrar os modos de vestir e comportamento das pessoas, as diferenças sociais, os tipos de comemorações festivas, as crenças religiosas e culturais, os hábitos alimentares e muito mais. Já os registros escritos são fontes mais precisas, onde o historiador necessita encontrar “perguntas” que serviriam como referências para as possíveis respostas dadas por estes documentos.
            É, portanto, exemplo de um trabalho sério o projeto da história da Santa Casa de Misericórdia de Barretos que completa 90 anos de acolhimento em 2011. Por isso, as famílias barretenses que dispuserem de materiais históricos, como os já citados, e aceitarem emprestá-los para serem usados como fontes de estudos, estão convidadas a procurar a instituição para colaborarem com o projeto. Pois, a história de uma instituição tradicional como a Santa Casa, comprometida com o trabalho de historiadores, só poderá ser resgatada se estiver conjunta à história das famílias barretenses, para que assim mais um passo da história de Barretos possa ser dado.

ARTIGO PUBLICADO NO JORNAL "O DIÁRIO" (BARRETOS/SP) EM 01 DE OUTUBRO DE 2010.