domingo, 27 de junho de 2010

A TELEVISÃO NO BRASIL E SUAS EMOÇÕES



            Em época de Copa do Mundo de Futebol a tendência é juntar a família e os amigos para assistir os jogos da seleção brasileira na televisão. Ainda mais neste ano de 2010 que surgiu uma novidade: o sinal digital já disponível em nossa região. Parece até mais animador assistir a Copa do Mundo com a televisão digital, já que a imagem fica praticamente perfeita como se estivéssemos em pleno Estádio. Mas, com tamanha tecnologia invadindo nossas vidas, às vezes não nos damos conta de como isso era precário no passado e como foi a vinda da televisão para o Brasil. Este aparelho que hoje no Brasil é contado na casa dos 65 milhões, no fim de 1950 não chegava a mil.
            Segundo o livro Chatô – O Rei do Brasil do escritor Fernando Morais, a vinda e o desenvolvimento da televisão no Brasil se iniciaram como um grande empreendimento feito pelo jornalista e empresário Francisco de Assis Chateaubriand. Tudo começou em uma visita feita pelo empresário à RCA Victor, em Nova York, no ano de 1944, quando ele se deparou com a sala de novidades tecnológicas e avistou um aparelho totalmente diferente e inovador: a televisão. Quando indagou David Sarnoff, presidente da empresa, Chatô, como era apelidado, descobriu que somente a França, a Inglaterra e os EUA possuíam emissoras de televisão e isso lhe fez render a ideia de montar a primeira emissora de televisão da América Latina no Brasil.
            A biografia de Chateaubriand conta que, cinco anos depois, o empresário marcava com giz e trena, no chão da Rádio Difusora de São Paulo, o espaço reservado ao estúdio da primeira emissora de televisão brasileira: a TV Tupi, que levou este nome em homenagem aos indígenas brasileiros. A inauguração da TV estava marcada para o dia 18/12/1950, mas um fato extraordinário e até “cômico” estava para acontecer. Poucas semanas antes da inauguração da Tupi, quando o diretor da rede americana NBC veio ao Brasil para ver o projeto da TV, ele perguntou à equipe quantos aparelhos televisivos a população brasileira tinha para assistir a inauguração, na qual a transmissão só podia alcançar 100 km a partir de São Paulo. Neste momento todos ficaram atônitos porque poucos brasileiros conheciam a televisão. Chatô, que já tinha investido cerca de 82,6 milhões de dólares atuais no projeto, mandou importar novos aparelhos ao Brasil, mas, como eles não iriam chegar a tempo da inauguração, o empresário recorreu ao contrabando para importar duzentas televisões.
            Depois de tantos impasses, a TV Tupi entrou ao ar em 1950 e suas atrações eram diárias no período das 20:00 às 23:00 hs, sendo que os artistas das novelas faziam tudo ao vivo, como em um teatro, já que o vídeo-tape ainda não existia no Brasil. Por tudo isso, percebemos o quão interessante foi a origem da televisão no Brasil, uma das tecnologias mais úteis já existentes que começou com tímidos aparelhos e que hoje desfruta até de sinal digital. Mas como tudo não é perfeito, o sinal digital ainda tem um tempo de retardo em relação ao sinal analógico e não deve ser nada legal escutar o “goool” do Brasil gritado pelo visinho e só poder ver o gol cinco segundos depois.

REFERÊNCIAS: Revista Aventuras na História, julho/2010, p. 52-55.

ARTIGO PUBLICADO NO JORNAL "O DIÁRIO" (BARRETOS/SP) EM 25 DE JUNHO DE 2010. 

CONFIANÇA NA TRADIÇÃO: O BRASIL NA COPA DO MUNDO



“Com o coração batendo a mil,
é taça na raça Brasil!

            Corações em sobressalto, gritos alvoroçados e ansiedade ao extremo, foram estes os sentimentos que nós, brasileiros, vivenciamos na última terça-feira com a estréia da seleção brasileira de futebol na Copa do Mundo da África do Sul. Com o resultado de 2x1, o Brasil venceu a cautelosa Coréia do Norte, no entanto, muito “sofrimento” esteve presente nos olhares atentos dos torcedores brasileiros durante o primeiro tempo, afinal, nada de gol! Sem ao menos tentar entender as estratégias da comissão técnica brasileira, o que queríamos mesmo era ver aquela rede balançar mais vezes e o Brasil demonstrar a famosa “raça” que desde os anos dourados tornou-se tradição em nosso país.
Somos o único país a participar de todas as edições da Copa do Mundo e também a seleção de futebol que conquistou o maior número de títulos mundiais; somos penta campões! A Copa do Mundo surgiu em 1930 e o primeiro campeonato foi disputado no Uruguai, com a participação de 16 seleções mundiais sem disputas de eliminatórias. A idéia de realizar um evento mundial de futebol surgiu em 1928 quando Jules Rimet, ao assumir o comando da FIFA, junto com sua equipe começou a organizar os campeonatos e idealizar a taça oficial. Conhecida por “Taça Jules Rimet”, em homenagem ao idealizador, a taça do mundo foi criada em 1929 por um ourives francês e passou a ser o prêmio conquistado pelas seleções vencedoras a cada quatro anos.
A primeira Copa em 1930 foi vencida pelos “donos da casa”, os uruguaios, mas, durante o período de 1938 a 1946 a Copa do Mundo foi suspensa devido à eclosão da Segunda Guerra Mundial. Já em 1950, uma grande ansiedade rondava o Brasil, pois neste momento nós éramos o país sede da Copa. A vitória era certa entre os brasileiros, ainda mais porque chegamos à final contra os uruguaios, mas... o Uruguai venceu o Brasil por tristes 2x1. Entretanto, em 1958, uma nova luz se ascendia ao futebol brasileiro: o Pelé, um revolucionário do futebol de sua época. Nesta Copa da Suécia o Brasil foi campeão mundial pela primeira vez e na próxima, em 1962, conquistamos o bi-campeonato na Copa do Chile, desta vez com outra célebre personalidade, o Garrincha. A conquista do tri-campeonato em 1970 talvez tenha sido a mais famosa, já que o Brasil passou a ter a posse definitiva da Taça Jules Rimet. Imaginem a honra aos brasileiros! Honra esta que foi apagada com o roubo da taça em 1983 no Rio de Janeiro, infelizmente o Brasil perdeu o maior patrimônio histórico do futebol brasileiro.  
Em seguida, o tetra veio em 1994 nos EUA, o penta em 2002 na Coréia do Sul e caminhamos ao hexa agora em 2010. Por fim, o futebol passou a ser “cultura” na vida dos brasileiros que tanto sofrem, gritam e se emocionam em um coletivismo bonito na época da Copa do Mundo. É lindo imaginar que grande parte do Brasil grita “goool” e vibra todos ao mesmo tempo. Para os próximos jogos desejamos aos jogadores “garra” e aos torcedores paciência e confiança na comissão técnica, afinal tradição nós já temos!

ARTIGO PUBLICADO NO JORNAL "O DIÁRIO" (BARRETOS/SP) EM 18 DE JUNHO DE 2010.

UMA PROMESSA PARA ANTÔNIO


            “A fé move montanhas...”, já dizia o ditado popular. É com este pensamento que o famoso casal desta coluna, (já que assim o tornaram depois de tantas aventuras) meus avós Antônio e Joanita, vivem uma intensa caminhada de religiosidade, promessas e graças. Sabemos que é típico, cultura e historicamente falando, o ato de fazer promessas ao santo devoto para conquistar uma graça tão almejada, entretanto, fazer a promessa e cumpri-la ao resto da vida é algo raro, raríssimo eu diria. Pois bem, e foi assim que tudo começou...
            Antônio, aos trezes anos machucou-se em uma máquina de picar cana-de-açúcar, e o resultado foi um acidente com a sua mão direita. Sua mãe, Geralda, ao ver seu filho acidentado, rezou a Santo Antônio de Pádua pedindo que o menino se recuperasse e que o acidente jamais o impedisse de trabalhar para construir uma vida digna. Em troca do pedido, Geralda prometeu ao santo que faria uma festa todo dia 13 de junho para rezar um terço em sua homenagem. E assim, desde o ano de 1954, em Barretos, Geralda cumpriu fielmente sua promessa. A partir de 1960, um ano após o casamento de Antônio, a promessa passou a ser responsabilidade da esposa do agraciado, e, desde então, Joanita cumpre seu dever com muita dedicação, pois no próximo dia 12 de junho completam cinqüenta anos que ela administra a festa.
            “No início era complicado porque a gente morava na fazenda e lá não tinha forno, então... o jeito era assar o bolo e os biscoitos dentro da panela de ferro com um prato de brasa em cima, e dava certo viu?!”, disse Joanita com muito entusiasmo. Como tradição, a fogueira e os fogos de artifício não poderiam faltar, e Antônio até hoje relembra: “alguns de meus amigos caminhavam por cima da brasa da fogueira!”. Mas, antes dos comes e bebes, é claro que o objetivo era a reza do terço e os cantos a Santo Antônio, sempre relembrando a promessa que D. Geralda havia feito há tanto tempo. Outro ato comum em todos os anos é a passagem debaixo da bandeira, confeccionada pela própria Joanita, e o asteamento da mesma que só é retirada no dia de São Pedro, 29 de junho. Muitos destes costumes perduram até hoje e a casa do casal fica transbordada de amigos, familiares e devotos, inclusive as moçoilas que acreditam no poder de Santo Antônio em ajudar a conquistar o sonho do casamento.
            Enfim, a festividade religiosa realizada por Antônio e Joanita é tão rica em símbolos e significados que só os olhos de quem acompanha há tantos anos consegue descrever a emoção. O ato de prometer não significa receber, pois, somente a fé e o merecimento são capazes de tamanho feito. E assim aconteceu com o menino Antonio, que, hoje, aposentado, com quase setenta anos, ainda trabalha e sustenta sua família com a dignidade que sua mãe sempre valorizava. Viva Santo Antônio!         

ARTIGO PUBLICADO NO JORNAL "O DIÁRIO" (BARRETOS/SP) EM 11 DE JUNHO DE 2010.

sexta-feira, 4 de junho de 2010

OS TIMBIRAS E A CIVILIZAÇÃO


            Existe sempre um meio de fantasias para explicar a realidade a nossa volta. Se hoje ainda persistimos nisso, imagine no Brasil antes de quinhentos anos atrás? Sem contato com a cultura européia, as explicações dos nativos brasileiros eram obtidas através dos mitos de origem baseados em elementos da natureza, dos animais, forças divinas e mágicas. Sabemos, pois, que a crença em tais mitos só era possível por conta da tradição oral, assim, as forças dos mitos de origem jamais se afrouxavam, já que o respeito à tradição era a base das sociedades indígenas. Um destes mitos de origem, contado pela etnia Jê-timbira do Maranhão, explica o surgimento do homem branco e da civilização. Como a melhor forma de se contar um mito sempre foi a tradição oral, conforme fica na memória, é assim que me esforço a fazer...
            Uma moça timbira chamada Amcukwéi estava grávida e, certo dia, começou a ouvir o grito de um preá, logo percebeu que o grito vinha de seu interior e era seu filho querendo vir ao mundo. Neste momento, a moça prometeu: “se fores menina eu te criarei, se fores menino eu te matarei”. Amcukwéi foi sozinha para a floresta e lá nasceu um menino, em seguida, a moça timbira cumpriu sua palavra e enterrou o filho vivo. A avó da criança, desesperada, pediu a filha que lhe contasse onde enterrou o menino porque ela o criaria, e assim o fez. O menino, de nome Aukê, cresceu rapidamente e era portador de poderes especiais, tinha o dom de se transformar em qualquer coisa. Por causa disso, ele virou alvo de desdenha e seu tio também queria matá-lo, no entanto, o menino sempre conseguia se salvar já que tinha o poder de transformação. Acreditando na morte do menino, a família de Aukê abandonou a aldeia e foi morar bem longe. Tempos depois, quando os chefes da aldeia foram buscar as cinzas do menino, descobriram que ele tinha se transformado em um homem branco e construído uma fazenda de criação de animais, chamando sua família para voltar a morar com ele.
            O desfecho deste mito é contado de várias maneiras. Em alguns livros, Aukê oferece aos índios o “arco” ou a “espingarda”, e estes continuam com o arco não aceitando tornaram-se “civilizados”. Isto é, na tentativa de explicar o aparecimento repentino dos brancos, para os timbiras, o homem branco surgiu do seu próprio povo e a civilização oferecida a eles foi negada por muitos. Já para a historiadora Lilia Schwarcz, o mito dos timbiras aponta Aukê como a figura do Imperador Dom Pedro II, ou seja, o “Pai dos Brancos”, aquele que trouxe a civilização à terra brasileira.
            Nesse sentido, são várias as interpretações que se pode retirar deste mito de origem, sempre identificando os símbolos mágicos, naturais e divinos que representam a principal característica dos mitos indígenas: a fantasia. Qual seria a sua interpretação, caro leitor? Se prestarmos mais atenção nestes contos dos nativos brasileiros, que aqui habitavam antes dos portugueses, certamente a História do Brasil será melhor reconstruída com fontes históricas próprias que só os indígenas poderiam nos oferecer.
             
ARTIGO PUBLICADO NO JORNAL "O DIÁRIO" (BARRETOS/SP), EM 03 DE JUNHO DE 2010.