ARTIGO PUBLICADO NO JORNAL "O DIÁRIO DE BARRETOS" EM 18 DE MAIO DE 2021 (página 2) PELA PROFª KARLA ARMANI MEDEIROS
Apesar de ser um processo histórico
nacional, a escravidão no Brasil foi tratada de forma distante e genérica, onde
os escravizados eram sumariamente classificados como “africanos” (ignorando
suas tribos), e seus costumes, valores e crenças, assim como a sua história
violenta, foram traduzidos a relatos superficiais. As áreas rurais e urbanas
brasileiras se constituem nos verdadeiros locais de memória da escravidão,
remendando histórias que, mesmo com o contar dos anos, tornam este processo
mais íntimo, próximo e real. Assim é com Barretos, arraial que se formou oficialmente
em 1854, vivendo pelo menos 34 anos de escravidão institucional.
Osório Rocha, em seu “Barretos de
Outrora”, é quem melhor registrou depoimentos sobre os escravizados na cidade.
Mesmo com poucos relatos, por ali é possível identificar que grande parte deles
vinha de Minas Gerais, apesar de nascidos na África. Sobre isso, ele notou as
cicatrizes que alguns possuíam na face, as quais receberam desde criança em
suas tribos de origem. Osório identificou dois tipos delas: alguns com “verrugas
no queixo, na ponta do nariz e sobre este à testa formavam uma cruz”, e outros
da etnia “Monjolo” que “em vez dessas saliências, apresentavam cicatrizes nas
duas faces, da boca às orelhas, paralelas retas, feitas à faca”.
Dando vozes a Mãe Mina, Policarpo
Balbino, Venância, Júlia, Alexandre, Mãe Tória, Felipe, Antônio e Rita Bagagem,
Osório registrou histórias que transparecem a violência da imposição da fé
dogmática, do castigo, da vil separação de mães e filhos e de escravizadas que
passavam a vida procurando seus bebês. Mostrou mais, que após a Abolição muitos
ex-escravizados foram morar no bairro periférico de Barretos, o “Outro Mundo”,
levando a vida na informalidade e na pobreza.
É triste, mas é a nossa realidade.
Nossa. Somos a sucessão daquele passado, que é longe de ser um lugar bonito.
(Rita Bagagem, quando menina, entrou por curiosidade num navio negreiro e não
conseguiu mais sair. Dá para acreditar?).
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