segunda-feira, 8 de março de 2010

TROTES: UMA PRÁTICA MEDIEVAL NO SÉCULO XXI


            Em tempos de volta às aulas, o que deveria ser motivo de muita alegria e conquista, pode se transformar em momentos de tristes lembranças e traumas psicológicos. Sim, estamos falando dos tradicionais trotes universitários, que tanto foram temas nesta semana em redes televisivas e jornalísticas nacionais, inclusive em nossa cidade. Como em um “ritual de passagem”, os momentos que deveriam fazer parte da integração entre calouros e veteranos muitas vezes são exemplos de humilhações e violência. Este realmente é um problema sério na sociedade atual, que surgiu há muito tempo, e pelo peso de sua tradição é justificado por uma continuidade histórica.
            O estudioso filósofo do assunto, Paulo Fraga, em entrevista para a Revista Época, relatou que a origem e o ápice dos trotes universitários datam do período medieval europeu, aproximadamente a partir de 1200d.C. Naquela época, quando grande parte da população vivia em feudos, os calouros que vinham do meio rural eram batizados pelos veteranos da área urbana. Já no Brasil, com a intensificação da construção de universidades, o primeiro calouro a pagar com sua própria vida em um trote foi um estudante de Direito chamado Francisco Cunha e Menezes, que em 1831 morreu a facadas na Universidade do Recife.
            Com muitos exemplos na História, porque ainda continuar com a prática violenta dos trotes? E porque, por parte dos alunos veteranos, não adotar o trote solidário ou o trote com palestras pedagógicas aos calouros? Sabemos que isso ainda acontece por conta do sentimento de vingança, como se os novos alunos da faculdade tivessem culpa da humilhação que os veteranos sofreram quando eram calouros. O trote é justificável pelo momento de interação entre os novos e antigos alunos que conviverão no mesmo espaço educacional e futuramente profissional, então porque a primeira impressão deve ser tão negativa?
            Portanto, os trotes universitários ao longo da História se adaptaram à realidade de cada época, tanto que nos anos 60 os calouros eram convidados a participar de manifestações sociais contra a ditadura do país. Depois disto, o trote novamente tornou-se degenerativo à violência, mas sabemos que a prática violenta dos trotes não faz parte da realidade do século XXI. Sabendo que isso existe há mais de três séculos no Brasil, será que esta mentalidade já não está na hora de mudar? Um processo histórico de violência não pode demorar tanto tempo assim para se adaptar a novas realidades. Aos veteranos fica a dica de que a vingança não leva ninguém a lugar algum, e aos calouros esperamos que cessem de vez com esta prática que nada combina com a nossa história.

ARTIGO PUBLICADO NO JORNAL "O DIÁRIO" (BARRETOS/SP), EM 05 DE MARÇO DE 2010. 

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