quarta-feira, 12 de janeiro de 2011

PROVEDORES: DOS ANOS 20 AOS 2000

ARTIGO PUBLICADO POR KARLA O. ARMANI NA REVISTA "AÇÃO E VIDA" DA SANTA CASA DE MISERICÓRDIA DE BARRETOS - 9/1/2011

                Pensar em noventa anos de fundação de um hospital naturalmente implica na ideia de complexidade, passagens de crises, endividamentos, epidemias, construções prediais, auxílios financeiros, campanhas, enfim, uma série de acontecimentos que atravessaram uma vasta linha do tempo constituída de divergentes épocas da história do Brasil. Assim, em sua trajetória histórica, a Santa Casa de Misericórdia de Barretos caminhou em sobressaltos durante estes noventa anos e pode-se dizer que o motor de todas estas trilhas foi o conjunto de pessoas que fizeram parte da vida do hospital. Cada um a sua representatividade, funcionários, enfermeiros, médicos, pacientes, mesários, associados, imprensa, moradores e o provedor, juntos, construíram a Santa Casa dos anos 20 aos anos 2000.
Do século XX ao XXI, a figura do provedor sempre foi o destaque das reportagens de jornais, campanhas e homenagens, isso acontece pela sua representatividade diante à sociedade, já que é nele que se concentra a tomada de decisões do hospital. Em trabalho acadêmico da historiadora Laima Mesgravis sobre a Santa Casa de São Paulo, ela ressalta um artigo do Estatuto do hospital ainda no século XIX, que destacava como deveria ser a personalidade de um provedor: “Sempre uma pessoa de prudência, virtude e reputação para que os outros irmãos o possam reconhecer por cabeça e lhe obedeçam com mais facilidade”. As palavras, mesmo vindas do século XIX e refletirem certa preeminência da época, se encaixam no momento de fundação do nosso hospital e até mesmo nos dias de hoje. É certo que a figura do provedor deve ser prudente e popular perante a comunidade que o cerca e o regimento que lhe será atribuído. A própria terminologia “provedor” reflete a seriedade de seu cargo, é aquele que “provê” pelo hospital e toma as devidas providências.
A Santa Casa de Misericórdia de Barretos foi sede do trabalho de vinte e seis Provedores oficiais que regeram o nosocômio apoiados por uma significativa comunidade de funcionários e habitantes da cidade. Estes provedores possuíram diferentes profissões e certamente o brilho destas garantiram-lhes a aprovação da sociedade na Ordem da Santa Casa. Predominantemente eram políticos, advogados, médicos, jornalistas, proprietários de tradicionais casas comerciais, industriais, pecuaristas e contabilistas.  São profissões liberais que, em sua maioria, são acompanhadas de experiências na administração de gestões, investimentos, geração de recursos e apoios políticos.  Sendo que, deste total de vinte e seis provedores, três foram prefeitos em Barretos, dois deles simultaneamente no hospital e na Prefeitura.
                O primeiro provedor da Santa Casa de Barretos foi o bacharel em Direito, Pedro Paulo de Souza Nogueira, que em fins do século XIX saiu do Estado do Rio de Janeiro e veio para Barretos, onde, pouco tempo mais tarde, tornou-se o terceiro Intendente Municipal de Barretos. Tratava-se de uma figura interessante às vistas da política barretense, deixou onze filhos e parte de seus descendentes ainda perpetua pela cidade. Como provedor, nenhuma atividade de sua gestão ainda foi revelada por falta de documentos, porém, sabe-se que os provedores dos anos 20 tinham muito costume de realizar campanhas, de cunho simplório, que fornecessem fundos para contemplar serviços implantados no prédio novo da Santa Casa. Um hospital recente que ainda não tinha sua construção finalizada e já se encontrava em funcionamento, apresentando também dificuldades financeiras.
                Nos anos 30, um provedor se destacou por trazer significativos benefícios ao hospital e ser o primeiro a repetir o mandato por quatro anos seguidos; trata-se do sr. José Pereira Soares, proprietário de casa comercial, provedor de 1929 a 1932. Em 1931, quando a Santa Casa de Barretos vivia seus dez anos de fundação, fatos inéditos aconteceram, tais como: a construção de uma farmácia, a doação feita por Francisco Conde da escadaria de mármore que enfeitava a entrada do hospital, o portão monumental doado pelo sr. Augusto Sasdelli Cardoso, novos móveis de madeira em doação do sr. Eugênio Scannavino e o serviço de arborização completo fornecido pelo Serviço Florestal do Estado de São Paulo.
Além disso, em 1932, especificamente no dia 1º de maio, a ideia de começar a construir uma Capela no hospital se realizou com a cerimônia de colocação da primeira pedra da Capela de Santa Izabel. Foi uma grande festa e um marco na administração do provedor José Pereira Soares. Os anos que se seguiram à década de 30 também tiveram provedores preocupados com novas instalações do hospital, como bem mostra o projeto de construir o pavilhão “Titinha Franco” na gestão do provedor João Baroni. Esta ideia atravessou as administrações dos demais gestores vindo a se concretizar tempos depois.
Quando chegaram os anos 40, os nomes dos provedores eleitos são reflexos da atuação positiva que os mesmos tiveram nos anos 30. Por exemplo, o sr. João Rodrigues da Cunha que muito esteve presente na gestão do sr. José Pereira Soares e o sr. Severiano Rodrigues Borges que forneceu a quantia de vinte contos de réis para o término das obras do hospital e sua completa reforma em 1931. A partir de 1946, nas administrações dos senhores José Tedesco e o médico Astolfo Araujo, surgia o projeto de construção da Maternidade, uma necessidade que há tempos se discutia na Santa Casa.
A Maternidade se tornou o primeiro passo para a construção do “novo hospital”, expressão que tanto perpetuou na administração dos cinco provedores da década de 50. O nome que ainda é lembrado por muitos no hospital é o do industrial e provedor Teófilo Benabem do Valle, pois foi na gestão dele que se iniciou a construção da Maternidade em 1951 e sua inauguração em 1955. A administração desta obra foi um divisor de águas na história da Santa Casa de Barretos, uma vez que sua extensão alterou a forma do hospital, que teve a parte do prédio da Rua 30 derrubada para emergir um novo pavilhão. Para solidificar esta obra muitas campanhas foram realizadas, principalmente quermesses na Praça Francisco Barreto com sorteios de prêmios como geladeiras, carros e outros. Desta feita, o provedor Teófilo Benabem do Valle era destaque na imprensa da época.
Continuamente à obra da Maternidade, em função do projeto de construção do “novo hospital”, na administração do sr. Husseim Gemnha outro pavilhão também foi construído, agora do lado da Rua 28 para fazer união àquele da gestão do sr. Teófilo. A união destes dois pavilhões forma o que hoje os funcionários da Santa Casa chamam popularmente de “prédio velho”. Para arrecadar fundos que tornasse real a construção do novo pavilhão, os provedores dos anos 50 muito trabalharam e pediram apoio de governantes, que, como Jânio Quadros, governador do Estado de São Paulo em 1957, contribuiu com a causa doando três milhões de cruzeiros para a obra em questão.  A construção foi na mesma proporção grandiosa e gradual, como bem mostra a perpetuação do sr. Husseim Gemnha na Provedoria nos períodos de 1958 a 1965, quando em 06 de junho de 1965 ele falece.
Como de praxe, assumiu a Provedoria na Santa Casa o vice-provedor, que, na ocasião era prefeito de Barretos, o sr. João Batista da Rocha. Mais do que vice-provedor e provedor, João Rocha já era nome destacado na Mesa Administrativa da Santa Casa desde os anos 50, quando foi muito elogiado em atas por ir às próprias custas a São Paulo estudar preços melhores para compras de alto custo do hospital. Sua administração se revelou positiva, pois, iniciou o processo de instalação da lavanderia da Santa Casa, que é até hoje lembrada pelos funcionários mais antigos.
Os anos 70 foram administrados pelos senhores Pedro Falco, Lourival Ribeiro de Mendonça e Althair Rios, três provedores que remetem a muitas lembranças de instalações de novos serviços no hospital e que proporcionaram experiência ao futuro provedor dos anos 80, sr. Ibraim Martins da Silva. Este, por sua vez, também administrou uma grande obra que foi a construção do pavilhão chamado hoje pelos funcionários de “prédio novo”, custeado com os recursos próprios da Santa Casa e inaugurado em 1988.
A década de 90 atravessou um caminho relativamente obscurecido pelos problemas econômicos de cunho inflacionário, ainda mais com o número crescente de pessoas que procuravam a Santa Casa, não só de Barretos como de toda região. Sendo válido ressaltar, que esta procura da região pela Santa Casa é comum desde o ano de sua fundação, que já nesta época atendia mais de vinte cidades.
Os anos 2000 se iniciou com a volta do provedor Ibraim Martins da Silva e finaliza a primeira década com o contabilista Décio Maruco Júnior. Este, atual provedor, apresenta-se como uma figura que perpetua a tradição de alguns ex-provedores da Santa Casa de Barretos em aproximar as necessidades do hospital ao conhecimento da comunidade. A isto se aplica a série de campanhas populares que o atual provedor promove desde o início de suas atividades em 2007; como por exemplo, a campanha de pintura do prédio do hospital feita em 2008, onde a população doou as tintas. Também em 2008, a administração de Décio Maruco Júnior inaugurou o Complexo Materno-Infantil Santa Isabel e por intermédio de verbas parlamentares adquiriu novos equipamentos hospitalares para os serviços de Cardiologia e Litotripsia; sendo o Departamento de Litotripsia inaugurado em janeiro de 2009.
Há de se ressaltar também a renegociação da dívida da Santa Casa com a Receita Federal para a obtenção da CND (Certidão Negativa de Débito), pois somente com a expedição deste documento que o hospital pode receber maior fluxo de verbas parlamentares. Nestes últimos anos, a Santa Casa de Barretos se destacou entre os hospitais do Estado de São Paulo pois foi a pioneira em implantar a área psiquiátrica nas dependências da instituição hospitalar.
Enfim, o que pensar destes noventa anos de Santa Casa?
Que noventa anos ininterruptos de saúde pública é o resultado do trabalho vinte e seis gestões e de toda uma comunidade abrigada por um mesmo ideal: o crescimento estrutural e social do hospital. Que venha mais noventa anos, pois os barretenses estarão prontos a trabalhar junto com os futuros provedores pelo hospital da vida.   
                

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