segunda-feira, 31 de maio de 2021

A tal mentalidade

ARTIGO PUBLICADO NO JORNAL "O DIÁRIO DE BARRETOS" EM 27 DE ABRIL DE 2021 (página 2) PELA PROFª KARLA ARMANI MEDEIROS  

            Os jornais e livros antigos sobre Barretos revelam muito mais do que aparentam; deixam escapar desabafos e indignações. Neles, uma característica sempre me chamou a atenção: o uso das expressões “mentalidade bovina”, “bovinismo” e “mentalidade de cimento armado”. A última foi grafada, em tom de desabafo, pelo escritor Osório Rocha em seu “Barretos de Outrora”, e a primeira encontra-se em algumas edições da imprensa, especialmente o “Correio de Barretos”.

A tal “mentalidade bovina” é uma inteligente metáfora usada para descrever o conservadorismo de certas classes barretenses – em principal, parte de uma poderosa elite – que, avessas às mudanças, engessavam processos que poderiam trazer novidades, modernidade e abalar a ordem social. A intenção dos adeptos ao bovinismo, portanto, era não apoiar iniciativas “ousadas” em nome de moralismo (ou de nada).

            Como exemplo, dois episódios interessantes denunciam a tal mentalidade bovina, ambos envolvendo a Educação em Barretos. O primeiro, em 1931, a partir da criação do Ginásio Municipal de Barretos, cuja instalação foi encabeçada por Osório Rocha com a “Sociedade Escolas de Barretos”. Na época, existiram figurões que foram contrários à criação da primeira escola secundária de Barretos; para eles, quem quisesse estudar depois do 4º ano, a opção seria Bebedouro. Em situação parecida, pulando para 1964, a origem da Fundação Educacional de Barretos, a primeira instituição de ensino superior na cidade, também passou intemperes do bovinismo (somado a rivalidades políticas), que achava desnecessária e impossível a vinda de professores de “tão longe”.

            Tratando-se de Barretos, a tal mentalidade foi denominada “bovina” em alusão à pecuária e ao gado tangido, imortalizando uma característica da nossa própria origem. O problema foi a perpetuação dessa mentalidade ao longo das décadas e, pior, na contramão das ações intelectuais modernas e de projetos tão sólidos como a Educação. E não é de se espantar que ela ainda apareça por aqui. Habemus.



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