sábado, 29 de setembro de 2012

“OSSOS DO BARÃO”: UMA AULA DE HISTÓRIA!

ARTIGO PUBLICADO NO JORNAL "O DIÁRIO DE BARRETOS" EM 3 DE JUNHO DE 2012 PELA PROFª KARLA O. ARMANI


            No último dia 26, o Centro Cultural “Osório Faleiros da Rocha” foi honrado com a encenação da peça teatral “Ossos do Barão” de autoria do barretense Jorge Andrade. A peça, que na verdade finalizou a semana em comemoração dos 90 anos de Jorge, foi encenada pela Companhia “...” de São Paulo. Tratava-se de uma comédia muito interessante, que, aos olhos de uma professora, tornou-se uma bela aula de história, bem dinâmica por sinal. Deste modo, vou comentar sobre a peça de acordo com o que ficou na minha memória, diante aquilo que soou como mais relevante.
            “Ossos do Barão” sintetiza a situação da capital paulista em meados do século XX, quando alguns fazendeiros faliram por conta da crise de 1929 (dentre outras coisas), e, outros, porém, enriqueceram-se com o advento da indústria. O que a peça narra, brilhantemente, é a perpetuação dos títulos e dos nomes e sobrenomes das famílias dos tradicionais barões da época do café. Na ocasião do 4º Centenário de São Paulo, estes indivíduos “tradicionais” ficaram conhecidos como “quatrocentões” em alusão à continuação das mesmas famílias que desde a época da fundação de São Paulo ainda permaneciam na cidade, talvez não com o mesmo prestígio financeiro, mas com a tradição consanguínea ainda corrente. Ao menos, era assim que pensavam.
            A peça tem um cenário maravilhoso de uma casa antiga, da época de um barão de café (o barão de Jaraguá), que foi comprada por um italiano industrial que enriquecera como colono na fazenda deste barão, o sr. Egisto Giotto (o personagem mais cômico). Esta situação mostra muito claramente a falência de muitos antigos fazendeiros e a ascensão de colonos imigrantes que vieram para “ganhar a América”. Tanto que, mesmo com móveis luxuosos e antiquíssimos, o aparato principal da sala da casa do italiano, eram dois rastelos e duas peneiras de café. Este italiano, que comprara quase tudo do antigo barão, tinha a intenção de unir as famílias. Tanto que, por meio de cômicas cenas, tenta unir seu filho, Martino, com a bisneta do barão, Isabel Pompeu. Estes dois jovens, porém, representavam o pensamento mais moderno, uma vez que não ligavam para o tradicionalismo dos nomes das famílias.
            Passam-se dois anos e Martino e Isabel se casam, e tornam-se pais de um menino. O fim do teatro é o batizado deste menino, onde são convidados o tio e as tias “quatrocentonas” de Isabel, que demonstram vêemente a decepção do menino ganhar o nome italiano do avô e não aderir ao sobrenome “tradicionalíssimo” da família (que estava ali em São Paulo desde os tempos da caravela). É muito interessante ver o desenrolar desta história, onde sempre é tocada esta questão da “tradição do nome” dos antigos fazendeiros (mesmo que falidos) e o enriquecimento de alguns colonos. Sendo válido notar que, esta questão da tradição também pode ser encarada como uma crítica à propriedade de terra que sempre foi concentrada no Brasil, afim de expor que uma mesma família era dona das terras por séculos e séculos. Afinal, mesmo com o advento da industrialização e da modernidade, propriedade e família eram questões de “honra”.
            Enfim, a peça de Jorge Andrade é muito mais do que estas poucas linhas. Mesmo assim é possível perceber como o dramaturgo conseguiu utilizar da história como um veículo de informação e pano de fundo para o teatro. E o melhor, para uma comédia! Uma bela aula de história. Jorge Andrade, se não fosse dramaturgo, poderia ser historiador.

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